Acervo do Leitor 14/03/2018
Uma Guerra Americana de Omar El Akkad | Resenha | Acervo do Leitor
Algumas coisas são momentâneas e transitórias. Proporcionam certas emoções efêmeras e nada mais. Já alguns acontecimentos deixam marcas permanentes. Possuem a capacidade de mexer com seus sentimentos ou pensamentos mudando a forma como você observa e avalia a vida. Mais raro ainda quando um livro é o gerador disso tudo. Esse é o caso desta distopia que apresenta o começo, meio e fim da Segunda Guerra de Secessão Americana. Mas esta obra não é sobre os Estados Unidos, balas, batalhas e mortes, sim sobre vida e o que nos torna quem somos.
“Você luta na guerra com armas, você luta na paz com histórias.”
Petróleo. Quantas vidas já foram derramadas por este combustível fóssil? Parece que o “ouro negro” promovido pela terra é gerado pelo absorção do sangue derramado em seu nome. Sempre foi assim e sempre será. Não há apenas a destruição de vidas através de guerras, mas do meio ambiente. Sucessivas catástrofes ambientais fizeram a América dizer não a sua exploração… ou uma parte da nação. O Sul se recusou a encerrar sua exploração, e os EUA se dividiu novamente. O poderoso Norte “Azul” impondo a proibição, e o diminuto Sul “Vermelho” que se recusa a deixar a exploração e abaixar a sua cabeça. No meio de uma nação fragmentada ninguém está imune ou impune. Tiros podem ser direcionados, mas fragmentos se espalham por todos. E poucas famílias conheceram tamanha dor quanto os Chestnut.
“Olhou os corpos. A maioria estava caída para frente ou de lado, dando as costas para ela. Mas os que ela conseguia ver tinham rostos grotescos, irreconhecíveis, rachados na testa, contorcidos em agonia muda.”
Era uma vez os Chestnut, uma família negra e humilde de Louisiana no Sul dos EUA. Composta por Sarat, sua irmã gêmea, seu irmão mais velho e seus pais eles levam uma vida pobre mas feliz a beira do rio Mississippi. Porem a escassez fez seu pai se arriscar subindo ao Norte em busca de emprego. Acabou encontrando a morte através de um atentado terrorista promovido por Sulistas rebeldes. Sarat ainda cedo viu sua família se despedaçar e foi morar em um campo de refugiados de americanos na própria América. Lá encontrou miséria nunca antes imaginada e ódio. Ódio pela sua história e por “nortistas” que nunca conheceu. Uma raiva que rapidamente foi canalizada quando ela foi aliciada por um senhor, contando com a ajuda de um representante de um recém erguido Império Árabe renascido após sucessivas “primaveras”, que via na destemida jovem rebelde a arma perfeita para mudar os rumos da guerra. Uma jovem pobre, negra, homossexual que irá mudar para sempre a face da nação mais poderosa do Globo.
“Depois que ela morreu, em vez de enterrar ela no chão, eu a enterrei no rio.
– Por quê? – eu perguntei.
– Eu queria que ela não parasse nunca.”
SENTENÇA
Essa obra escrita pelo egípcio Omar El Akkad é uma obra-prima. Omar que é repórter e cobriu a guerras do Afeganistão, julgamentos de Guantánamo e alguns movimentos de direitos dos negros nos EUA traz um “insight” descomunal do que é uma guerra e seus desdobramentos. Criando um mundo distópico, mas extremamente verossímil, ele usa a vida da jovem Sarat Chestnut para ilustrar como somos produto do meio em que vivemos, e que o ódio é muito mais fácil de ser perpetuado do que qualquer sentimento. Livro extremamente violento e perturbador, não apenas por apresentar uma história de vida tão triste e miserável, mas porque nos faz questionar se faríamos diferente no lugar da mesma (protagonista). O livro serve como um espelho, mas provavelmente não gostaremos de ver seu reflexo.
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