spoiler visualizarmrsnone 24/09/2020
Entre o sensível e o suprassensível.
Antes de começar essa resenha, gostaria de deixar claro que o único impedimento durante tantos anos que me fez demorar pra começar essa obra foi a quantidade de páginas. Sim, esse foi o único impedimento. Muitos reclamam da quantidade de personagens e que isso acaba confundindo. Não tive problemas em relação a isso porque eu já conhecia a história de guerra e paz através das adaptações no audiovisual. Diante disso tudo, posso dizer que essa obra merece todos os elogios que ganha. Vale a pena ler tantas páginas assim. Bom, agora seguindo para a obra em si.
Existem personagens fictícios e não fictícios nessa obra. Uma obra que intercala ficção e fatos históricos. Através dos personagens, Tolstói demonstra o mundo sensível e espiritual em movimento transmitido pelos personagens em suas personalidades e ações. Conhecemos os personagens que eu diria serem os mais importantes e que expressam perfeitamente esse movimento conjunto. Diria que são eles: Andrei, Natacha, Nikolai Rostov, Mária Bolkonskaya, Pierre Bezukhov e por fim, mas não menos importante pra mim, Sônia.
Pierre e Natacha são o espírito. O suprassensível e que juntos se entendem sem precisar do auxílio da razão. Como se alma dela e a dele fossem uma só. Enquanto Mária é a espiritualidade, Nikolai, seu marido, é a razão. Eles se amam muito, mesmo um não compreendendo o outro. Andrei está entre os dois mundos. Mas Sônia, quem é ela? O que mais me intrigou nessa obra é a personagem da Sônia. Não nego que me incomodou o fato dela não ter tido nenhum desenvolvimento durante a obra. Uma personagem estática. Vive subordinada a tudo e todos. Não tem vontade própria. O que define ela é sua bondade e amor pelo seu primo, o Nikolai. Todos a tratam como algo a parte. Foi proposital da parte de Tolstói? Isso eu não sei responder. Mas Sônia parece ser uma personagem que merecia ter tido mais participação na história.
Um personagem histórico, a parte desses citados por mim, que também é muito importante na obra é Kutúzov. O comandante geral, velho e conhecido por não ter estratégia nenhuma. Foi a mais importante autoridade da guerra entre França e Rússia. Mas, não obstante, um personagem incompreendido. Evitava batalhas pois as considerava "inúteis". E isso irritava seus superiores e subordinados. Tolstói o entendeu. O homem é guiado por algo muito maior que as estratégias de guerra que não dão certo. Não dão certo porque as coisas no mundo não acontecem conforme algo planejado. E Kutúzov sabia disso. Kutúzov sabia que o exército francês estava em desvantagem e que travar uma batalha seria inútil. O povo russo reagiu da forma que tinham que reagir diante da invasão de Napoleão sobre Moscou. Queimou a cidade, mataram uns aos outros, etc. Deixando o exército francês sem meios de fortalecer. Mas não apenas por isso que Kutúzov não quis travar batalha, mas também porque o próprio exercito russo estava debilitado. Ele sabia que uma batalha seria em vão e que sozinho os franceses iriam perecer. E pereceram. Kutúzov é o maior exemplo que Tolstói nós traz da espiritualidade acima da razão. Nem tudo é estratégia. Os acontecimentos humanos não acontecem porque tal e tal pessoa fez isso ou aquilo. Acontece porque tem que acontecer. E acontece porque as ações de todos fazem com que os acontecimentos sejam assim. Tolstói não exclui o raciocínio lógico. Mas nega que ele seja o único jeito de explicar acontecimentos históricos. Kutúzov sabia disso. Por isso foi zombado por quem escreve história. Mas não pela história em si.
Há muitas coisas pra falar sobre essa grandiosa obra, mas me limito aqui.