Daniel Rocha 01/05/2012Somos eternos enquanto estamos narrandoA gente pode ser Peter Pan o resto da vida, desde que produza com isso, desde que escreva, porque temos que justificar a nossa existência para a sociedade e o por quê de carregarmos essa agridoce esquizofrenia de estar sempre inventando coisas, lugares, pessoas, acontecimentos, mudando o real, seja lá o que for o real.
Para ser, temos que nos narrar, e nessa conserva sobre nós mesmos há muitíssima conversa fiada, nós nos mentimos, nos inventamos, nos enganamos. Nós inventamos nossas lembranças, que é o mesmo que dizer que inventamos a nós mesmos. Nossa identidade reside na nossa memória, no relato de nossas autobiografias. Os seres humanos são, acima de tudo, romancistas, autores de uma escrita que dura a vida toda e assumem o papel de protagonistas. Não se pode falar da invenção narrativa, sem se dar conta que a primeira mentira é o real.
E cita Stephen Vizinczey, que diz : “o autor jovem sempre fala de si mesmo, até quando fala dos outros; ao passo que o autor maduro sempre fala dos outros, até quando fala de si mesmo.”
Terminei agora A Louca da Casa, da escritora madrilena Rosa Montero, mistura de romance, ensaio e autobiografia. Fazia tempo que eu não ficava triste quando terminava um livro, com aquele gosto ruim de ter que dizer adeus. Mas pelo menos ficamos um pouco mais juntinhos, ao escrever estas palavras, e, como ela disse, somos eternos enquanto estamos narrando.