PH 04/07/2018
Interessante, mas em certa medida descartável
Por estudar psicanálise fui tomado por uma animação muito grande quando descobri que a Blucher iria trazer um manuscrito inédito do velho Freud. Bom, terminei de lê-lo agora e me arriscaria a dizer que não há nada de realmente novo ou inédito nas 120 páginas do livro, excetuando-se cerca de duas páginas que tratam da figura de Cristo.
Para Freud, a identificação com Cristo que é operada no seio da religião cristã seria uma espécie de síntese de elementos passivos e ativos, uma das saídas possíveis para o complexo de édipo que daria livre expressão para a masculinidade e para a feminilidade presentes no ser humano. No caso, esse tipo de identificação promove um assujeitamento, ao mesmo tempo que permite que o sujeito acesse uma potência que diga respeito ao campo divino. A fé na figura de Cristo, para Freud, também é a fé de que através de uma passividade extrema é possível concretizar as atividades mais audaciosas. Logo, essa identificação nada mais seria do que a ideia de que só ao se submeter ao Deus-Pai é possível tornar-se a si próprio Deus. Nesse sentido, a identificação com a figura de Cristo seria uma espécie de expressão socialmente aceita da homossexualidade.
No resto do livro Freud esclarece conceitos fundamentais de seu edifício teórico, tais como sublimação, supereu, narcisismo, etc. Nada que não tenha sido largamente exposto, por exemplo, nas tão famosas conferências introdutórias, já tão conhecidas por todos aqueles que estudam psicanálise.
Para finalizar, o prefácio e o pósfacio tem o seu valor por tentarem de alguma forma darem uma contextualização histórica para o manuscrito, posto que ele é fruto de uma colaboração de Freud com Bullitt, que na época tinham a intenção de escrever um livro sobre Thomas Woodrow Wilson, presidente dos Estados Unidos que desempenhou papel importante no tratado de paz de Versalhes. Enquanto características principais Wilson sustentava uma soberba exacerbada, ao ponto de muitas vezes fazer declarações de caráter messiânico acerca de si próprio. Ao terminar o texto fiquei com vontade de ler o livro completo sobre Wilson (o que temos em mãos é apenas uma introdução assinada pelo Freud), e fico me perguntando se não teria sido melhor para Blucher lançá-lo em vez de concentrarem-se apenas nessa pequena introdução freudiana, embora o resto do livro tenha sofrido sérias críticas, pois segundo alguns psicanalistas Bullitt teria alterado as passagens freudianas ao longo dos outros capítulos (Freud havia morrido quando o livro foi enfim publicado).