Carla.Parreira 07/11/2024
Vidas secas (Graciliano Ramos). Fabiano e sua família vivem em uma região árida do nordeste do Brasil, enfrentando a seca e a fome. Eles se abrigam em uma fazenda abandonada, onde Fabiano encontra água, alimentando a esperança de dias melhores. No entanto, a felicidade é breve, pois são expulsos pelo dono da fazenda. Fabiano, lutando para sustentar sua família, reflete sobre sua condição e a vida difícil que leva. Durante uma ida à feira, ele se irrita com a qualidade dos produtos e acaba preso após uma discussão com um soldado. Na cadeia, ele questiona se ter uma família é um peso ou uma bênção. Enquanto isso, Siná Vitória expressa sua insatisfação com as condições em que vivem e anseia por uma cama confortável. Ela também se sente sobrecarregada pelas responsabilidades, enquanto Fabiano se mostra insensível às suas queixas. Os filhos, por sua vez, vivenciam suas próprias desventuras; o filho mais novo tenta imitar o pai em atividades de vaqueiro, mas acaba se machucando, enquanto o filho mais velho é intrigado pela palavra "inferno" e busca respostas para suas curiosidades, enfrentando o desprezo dos adultos. A família se reúne em torno de uma fogueira para se aquecer, compartilhando histórias heroicas criadas por Fabiano. O ambiente se torna uma mistura de esperança e desespero, enquanto a chuva traz um alívio temporário, assumindo a forma de um momento de tranquilidade que contrasta com os temores da seca que pode retornar a qualquer momento. Fabiano tem medo que a chuva cause uma inundação na casa onde estão. Ele continua contando suas histórias heroicas inventadas, mas quando um dos filhos questiona a veracidade de uma delas, ele muda os detalhes, instigando desconfiança no filho mais velho, Baleia, que já demonstrava desinteresse. Na festa de Natal na cidade, a família se veste com suas melhores roupas, mas a caminhada longa torna-se sufocante, levando Fabiano a retirar os sapatos, seguido por todos os outros. Ao chegarem, lavam os pés no rio e, enquanto as crianças se amedrontam com a multidão, Fabiano tenta se manter próximo à família, mas sente-se incomodado. Fabiano recorda a humilhação que sofreu do soldado Amarelo e, ao se afastar para beber pinga, perde a sobriedade, tornando-se mais ousado e pensamento em se vingar do soldado. Ele acaba dormindo no chão, enquanto Siná Vitória, preocupada com Fabiano e as crianças, busca um momento para si. O estado de Baleia, a cachorra da família, deteriora, levando Fabiano a decidir sacrificá-la. Apesar da resistência dos meninos, a decisão é tomada, e após um tiro, Baleia se arrasta em agonia, despertando tristeza na família. Fabiano enfrenta constantes dificuldades financeiras, recebendo pouco pelo que cria e acumulando dívidas com seu patrão. Ele tenta vender alguns porcos, mas logo se vê cobrando impostos. Sente-se enganado e impotente, resignando-se ao ciclo de exploração que perpassa sua família há gerações. As lembranças de Baleia marcam sua reflexão sobre a vida e sua condição de retirante, levando-o a desejar uma mudança. A seca se torna mais severa, trazendo aves que ameaçam o gado. Fabiano tenta proteger o que resta com sua espingarda, mas cada tiro o faz lembrar da dor pela morte de Baleia. A falta de nuvens e a escassez o fazem querer deixar aquele lugar. Quando chega o momento de fugir, Fabiano sacrifica o último bezerro que poderia servir de alimento durante a viagem. A partida é marcada pela lembrança de Baleia, fazendo Siná Vitória chorar ao relembrar a cachorra. Enquanto viajavam, Falando sobre um futuro melhor na cidade, ambos ponderam sobre a vida que poderiam ter longe da seca, sonhando com um destino que proporcionasse oportunidades para seus filhos. A incerteza os anima a seguir em frente, em busca de um novo lar. A obra explora a realidade cruel de sua existência, revelando as injustiças sociais e as misérias enfrentadas por retirantes, evidenciando uma narrativa marcada pelo regionalismo modernista que se concentra nos desejos e sofrimentos de seus personagens. A obra estabelece uma conexão profunda entre a experiência de Baleia, a cadela, e a vida da família de Fabiano, apresentando uma crítica social incisiva. A narrativa revela como os pensamentos de Baleia são descritos de maneira semelhante aos dos humanos, destacando que o sofrimento é tão intenso que muitos preferem não refletir sobre sua realidade dura. Os capítulos são fragmentados, resultando em uma temporalidade não linear que reflete um ciclo interminável de adversidades enfrentadas pelo povo. Essa estrutura revela um clima de tensão constante, que nunca se desfaz, ressaltando uma abordagem seca e direta que caracteriza a realidade daquela comunidade. A repetição de dificuldades cotidianas expõe a instabilidade da vida no sertão, onde a esperança é continuamente testada. As descrições vívidas dos personagens e de suas interações com o ambiente criam um retrato contundente da luta pela sobrevivência. A forma como os personagens lidam com suas limitações e aspirações ilustra uma crítica atemporal às condições sociais e econômicas que perpetuam o sofrimento. Fabiano, por mais que tente se afirmar e proteger sua família, é constantemente arrastado por um sistema que o oprime e desumaniza. O sentimento de impotência se torna ainda mais evidente na relação com seu entorno e na forma como ele e a família são tratados pelos mais poderosos. Esse ciclo de opressão, representado por doenças, seca e exploração, se reflete na saúde física e mental da família, mostrando como a luta diária molda suas identidades e relações. As experiências vividas em conjunto revelam um senso de coletividade entre aqueles que compartilham o mesmo destino, numa busca constante por dignidade e um futuro melhor. Essa luta pela sobrevivência e a esperança por mudanças, apesar das circunstâncias adversas, mantém viva uma luz de resistência. A obra se transforma assim em um manifesto sobre a resiliência e os desafios enfrentados por milhões de pessoas, tornando-se um eco da realidade vivida por muitos até hoje.