spoiler visualizarDiogo518 15/02/2024
O livro propõe uma análise da política econômica brasileira desde o primeiro governo Lula até o governo Temer (2003-2016), e tenta compreender os motivos que levaram o esplendor econômico que vigorou até mais ou menos 2010 para a crise sem precedentes que se abateu a partir de então e que permanece até hoje.
Capítulo 1
O esplendor econômico é atribuído ao que Laura chama de "milagrinho", receita econômica que combinou três pilares fundamentais para o crescimento que o Brasil experimentou naquelas décadas: Distribuição de renda (valorização do salário mínimo, diminuição da disparidade salarial e da desigualdade social, inclusão dos mais pobres no mercado de consumo e de serviços), Acesso ao crédito (via bancos públicos, com taxas de juros relativamente baixas, famílias passam a se endividar de maneira sustentável, já que acompanhado do aumento da renda, o que reforçou o dinamismo da economia) e Investimentos públicos (em obras de infraestrutura, o ajudou a gerar empregos e a dinamizaram o mercado, estimulando a iniciativa privada. esses investimentos foram possíveis em parte porque o governo tirou as despesas com o PAC da meta fiscal, o que trouxe certa flexibilidade). Esses pilares, aliados à alta no preço das commodities no mercado externo, fez o país passar relativamente bem pela crise mundial de 2008, já que dinamizou a economia e o mercado interno, segurou o preço do dólar, ajudou a controlar a inflação e fez aumentar a arrecadação.
A inflação de serviços gerada pelos três pilares, embora tenha beneficiado todas as classes, gerou insatisfação na classe média porque a aproximou dos pobres. Além disso, houve mais concentração de renda no topo da pirâmide, graças aos desajustes do sistema tributário brasileiro.
Capítulo 2
Influenciada pelo lobby industrialista (Fiesp) no Congresso e no executivo, Dilma muda a agenda econômica, e foca agora na redução de juros e na desvalorização do real, e muda também a política fiscal, com cortes de gastos e investimentos públicos e desonerações tributárias a setores industriais que, segundo o argumento, aumentaria o emprego e estimularia novos investimentos por parte das indústrias, o que garantiria a retomada do crescimento. Trata-se de uma mudança de foco do estímulo ao mercado interno (serviços, importações, crédito etc.) para o mercado externo e para os investimentos. Os resultados foram desastrosos, o que levou ao abandono dos pilares do milagrinho. Além de tirar os investimentos públicos do protagonismo (o que torna complicado chamar o governo Dilma de "desenvolvimentista", o dinamismo da indústria não veio, de modo que a política fiscal e as desonerações oferecidas pelo governo apenas aumentaram a dívida pública ajudaram a indústria a manter suas margens de lucro. Um governo de esquerda acabou caindo na armadilha do incentivo a grandes corporações: "De fato, a maior parte das desonerações fiscais concedidas parece ter servido como política de transferência de renda para os mais ricos, contribuindo também para deteriorar sobremaneira as contas públicas".
A defesa de um ajuste fiscal passou a corresponder à defesa de um Estado menor, mote que concentrou o empresariado quando ele abandonou o barco do governo Dilma e passou a defender o impeachment.
Capítulo 3
Os investimentos públicos e o tamanho do Estado tornaram-se o principal alvo dos defensores do ajuste fiscal em 2015. A previdência tornou-se a maior preocupação. A popularidade de Dilma despencou, abrindo margem para o uso político das pedaladas fiscais como mote para o impeachment: "enquanto a parte legal do processo de impeachment concentrava-se em supostos crimes orçamentários, os discursos políticos ignoravam o ajuste de 2015 e atribuíam à irresponsabilidade fiscal da presidente um papel central na crise vivida pela população". Atacaram-se os direitos adquiridos pela sociedade brasileira (que não caberiam no orçamento público) em vez de imaginar estratégias para estimular o crescimento econômico. O mote da Fiesp era o combate ao aumento de impostos. Na verdade, os setores econômicos esperavam que a saída de Dilma e a entrada de Temer criassem bases para a resolução das crises política e econômica, o que não se concretizou. Não esquecer o estímulo que a lava jato deu para o congresso desejar a saída de Dilma. Temer assumiria para encampar as reformas estruturais e estancar a sangria das investigações.
O plano A de Meirelles, ministro da economia de Temer, era controlar as despesas do Estado, o plano B era privatizações e o plano C era aumento de impostos. Mas não havia ajuste fiscal possível sem o crescimento de receitas. Impôs-se, ainda, a PEC do teto de gastos, que congelou os investimentos públicos em saúde e educação, o que vai sucatear os serviços público e a redução da taxa básica de juros, que foram vendidos pelo governo como sinais de sucesso. A crise econômica ajudou a barrar o crescimento de agendas democráticas, já que o neoliberalismo de Temer não tinha pudores em passar medidas impopulares. A troca da presidência não trouxe estabilidade à economia. O corte de gastos públicos não é solução para crise econômica, porque por si só ele não é capaz de gerar confiança e estimular investimentos. "O que presenciamos foi o abandono das metas de superavit primário em nome da redução do tamanho do Estado, que passou a ser um fim em si mesmo". Laura atribui à própria austeridade parte da culpa pelo desempenho pífio das receitas entre 2011 e 2016: "Uma recuperação capaz de reduzir de uma vez por todas a capacidade ociosa das empresas e dar início a um novo ciclo de expansão dos investimentos privados depende de aumentos mais substantivos da renda e do nível de emprego. Mas, se uma recuperação substantiva do consumo das famílias e dos investimentos privados requer uma retomada da própria economia, seria necessário algum outro motor - mais autônomo - para nos tirar da estagnação.
Capítulo 4.
Medidas de austeridade não estimulam o crescimento. Elas tendem, na verdade, a serem contracionistas e a estimularem a desigualdade. Tendem, ainda, a funcionar como mecanismo de distribuição de renda para o andar de cima, via subsídios, desonerações e desequilíbrios fiscais. No Brasil, a diminuição dos investimentos públicos e a ausência de motores de crescimento em nome de subsídios levou a mais desequilíbrios, que custaram caro às contas públicas e ao Estado de bem-estar social e à infraestrutura.
Há desequilíbrios evidentes em querer pagar poucos impostos (especialmente considerando os já evidentes desequilíbrios tributários do Brasil) e querer um Estado de bem-estar social provedor. No Brasil, o Estado de bem estar social fraco contribui para o aumento da desigualdade e de índices de violência, encarceramento, etc.
Uma agenda econômica, defende a autora, deve levar a economia a uma trajetória de crescimento sustentável, que gere empregos e melhore as condições de vida da população. A democracia não é um entrave ao desenvolvimento econômico. Essa reconstrução precisa ser por meio da ampliação de direitos e de acesso à saúde e educação, e não o contrário, através de concessões a pressões de setores empresariais fortes. É preciso uma reforma tributária mais justa, que taxe lucros e dividendos de pessoas físicas, e diminua os impostos proporcionalmente aos mais pobres - já que o Brasil taxa muito o consumo e a produção. Aumentar também os investimentos públicos em infraestrutura enquanto pilar da política econômica. Por fim, é preciso controlar em patamares aceitáveis a taxa de juros. Reduções drásticas geram efeitos inflacionários. Além do retorno dos pilares da distribuição de renda, investimento em tecnologia e em infraestrutura física, ambiental e social também é fundamental para diminuir a dependência de produtos agroindustriais e commodities. para isso, a presença do Estado é fundamental. Não é possível esperar a iniciativa privada.
Capítulo 5
Períodos de recessão tendem a fomentar violências e ditaduras, enquanto períodos de crescimento tendem a estimular a liberdade e a tolerância. É, segundo Laura, o que vem acontecendo desde 2011. É preciso dialogar com demandas concreta dos que ainda sofrem com a crise e a desigualdade.