José Martino Escritor 09/07/2010A Respeito do romance Ressurreição de Machado de Assis Em 1872, Machado de Assis finalmente publica seu primeiro romance, Ressurreição. Até este momento de sua vida, ele era conhecido, sobretudo, como poeta, um poeta elegante e urbano, que sabia trabalhar de modo exímio a forma de seus versos. Talvez por isso tenha surpreendido tanta gente, quando apareceu um novo romance nas livrarias levando o seu nome.
Por essa época, o romance no Brasil buscava novas formas de expressão e o caminho encontrado foi retratar os costumes locais, na esteira de O Gaúcho, publicado por Alencar em 1870. Em 1872, Taunay, Bernardo Guimarães e o próprio José de Alencar deram ao público romances como Inocência, O Garimpeiro e Til, todos eles com forte cunho regionalista. Agora, a natureza passava a ser retratada de maneira ainda mais exuberante e, se os enredos continuavam melosos para agradar o gosto das mocinhas sonhadoras da época, havia uma grande novidade. O regionalismo levou para os livros a maneira de falar típica de cada região e um grande número de vocábulos e expressões regionais foi incorporado à literatura.
O romance de Machado de Assis fugia a esta tendência literária e ele próprio revelou isso na advertência que colocou em Ressurreição:
“Não quis fazer romance de costumes; tentei o esboço de uma situação e o contraste de dois caracteres; com esses simples elementos busquei o interesse do livro.”
Machado de Assis tinha trinta e três anos quando o romance foi colocado à venda em abril de 1872. Impresso no próprio Rio de Janeiro, na Tipografia Franco-Americana, situada na rua da Ajuda, o escritor deve ter acompanhado de perto a confecção dessa sua primeira aventura em prosa de maior fôlego. O livro levava o selo da editora Garnier, que era uma das principais casas editoriais do Brasil. Fraco é o enredo de Ressurreição e quase não há ações ou peripécias. Como o próprio Machado afirmou, o interesse da obra está na personalidade complexa dos protagonistas, tratando-se, pois, de uma tentativa de romance psicológico. Sob este aspecto, os demais livros românticos de Machado serão um retrocesso neste processo criativo. Em todos eles, abundam situações romanescas típicas das histórias escritas na segunda metade do século XIX. No que diz respeito à estrutura e organização, o romance Ressurreição pode ser considerado inferior aos livros românticos que lhe seguiram, mas nenhum deles possui esta fragrância diferente, caracterizada pelo gosto da análise e que faria a fortuna de Machado de Assis.
Diferente do romance romântico tradicional, Ressurreição não acaba em final feliz. O Dr. Félix, que está sempre a suspeitar das coisas, e Lívia, uma viúva de vinte e quatro anos, apaixonam-se após um baile na casa do Coronel Moraes, mas o rapaz age de maneira estranha com relação ao amor e, freqüentemente, acaba se separando da amada, quando poderia ficar com ela. A sua indecisão, os seus ciúmes infundados e uma carta anônima acabam por levá-lo a romper o casamento acertado com Lívia. Depois, arrepende-se e vai pedir perdão à amada, mas é tarde demais, pois ela não o perdoa. Joaquim Maria quis submeter à análise um pensamento de Shakespeare, que ele colocou como epígrafe do livro: “A dúvida é traidora; muitas vezes, faz-nos perder o bem, que alcançaríamos, pelo receio de não consegui-lo.”
Os outros personagens do livro são abúlicos e convencionais. Meneses, Raquel, Viana, Cecília, Moreirinha, Batista, Coronel Moraes e Matilde são personagens pouco marcantes. As figuras são típicas, como o parasita, a viuvinha desejada, etc. Muitos deles não possuem ocupação fixa, como grande parte dos personagens machadianos, que vivem de renda ou herança. Gostam de exibir-se durante o dia na rua do Ouvidor e, à noite, em teatros e bailes.
O livro teve uma excelente acolhida por parte dos críticos, sendo que a grande maioria elogiou muito Machado de Assis, incentivando o autor a continuar seguindo neste caminho. O jornal A Reforma foi o primeiro que deu a novidade, saindo o artigo em primeira página, muito provavelmente pelas mãos de Joaquim Serra. José Carlos Rodrigues escreveu uma crítica bastante elogiosa, publicada no jornal Novo Mundo, que circulava em Nova York. O resenhista do Jornal do Comércio também elogiou a obra, mas ressalvou que a idéia não era original, tendo sido desenvolvida anteriormente no romance Paule Méré, de Victor Cherbuliez. Já Luís Guimarães Júnior, no Diário do Rio de Janeiro, afirmou que poucas obras tinham um estilo tão puro quanto a Ressurreição. Era um reconhecimento que ele não tivera ao publicar seus livros de poesias.
*****
Do livro: MEMORIAL DO BRUXO - CONHECENDO MACHADO DE ASSIS
de José Antonio Martino
Mais informações sobre este livro aqui no Skoob
ou no blog: http://machadodeassis-memorialdobruxo.blogspot.com