Biblioteca Álvaro Guerra 10/05/2022
Muito diferente da imagem que a maior parte dos brasileiros tem da região, o Nordeste, de Gilberto Freyre, é uma terra de fartura, de águas abundantes, "onde nunca deixa de haver/ uma mancha d'água:/ um avanço de mar, um rio, um riacho,/ o esverdeado de uma lagoa", como no poema de Carlos Pena Filho. Classificado pelo autor como "tentativa de ensaio ecológico", o livro retrata aquela região agrária do Nordeste que, segundo Freyre, "foi, por algum tempo, o centro da civilização brasileira". O outro Nordeste, mais conhecido pelos brasileiros, foi estudado por um outro escritor, Djacir Menezes. O Nordeste de Gilberto Freyre é o da região da monocultura da cana, sustentada pelo braço escravo, dos grandes senhores de engenho, patriarcais, de voz áspera, cujos gritos faziam tremer crianças e mulheres, mandões, ligados à terra, aos bichos, à vegetação, "o tipo mais puro de aristocrata brasileiro". Uma aristocracia quase feudal, de hábitos requintados, que sabia recepcionar, lia livros e revistas, cultivava a música em pianos. Cada propriedade era um mundo à parte, autossuficiente, dirigido pelo pater familias, como um pequeno império. Ali, modelada pela cana-de-açúcar, surgiu uma civilização original, hábitos muito peculiares, uma cozinha riquíssima em doces e comidas açucaradas, que levavam ao delírio as sinhás e os meninos, luxo nos trajes, excesso de joias nas mulheres, uma atividade sexual desregrada, que os molecotes exibiam, escandalizando os moralistas. Quando de sua publicação, Nordeste foi considerado uma novidade na obra de Gilberto Freyre, um livro eminentemente geográfico, mais simples e despojado do que as obras anteriores. O estilo, de "sabor sensual, denso, oloroso" (Manuel Bandeira), continuava o mesmo, assim como a arte de narrar do autor, com alguma coisa de romancista.
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