Fernando Lafaiete 23/10/2024REPARAÇÃO - IAN MCEWAN: PERFEITO EM CONCEPÇÃO E EXECUÇÃO?******************************NÃO contém spoiler********************************
Concorrente do Booker Prize de 2021 e considerada uma das principais obras do século XXI pelo The New York Times, Reparação de Ian McEwan é uma experimentação de técnicas narrativas cognitivas, onde há a preocupação exacerbada da consciência humana e seus derivados comportamentais. Sendo uma obra de cunho psicológico e reflexivo sobre relações humanas e as consequências de comportamentos, percepções e reações do que é visto, revisto e imaginado.
Com profundas descrições, o autor nos mostra um domínio artístico quase que impecável, que nos fisga e nos imerge em um romance peculiar, onde personagens e cenários tomam vida transcendendo as camadas imaginativas do leitor, como se fôssemos quase que personagens secundários e não só meros observadores.
Mas qual o propósito explanativo de Reparação? Apresentando uma estranha reunião familiar repleta de desconexões emotivas, McEwan nos agracia com personagens complexas e tridimensionais; e é com as mesmas que conhecemos a tríade do romance – Briony Tallis, a irmã caçula, Cecília Tallis, a irmã mais velha e Robbie Turner, o irmão de criação – e será através deste trio que nos deparamos com um crime e as consequências de uma mentira que irá perpetuar ao longo dos anos e que deixará cicatrizes psicológicas quase que irreversíveis. Explicitando assim, o significado denominativo do título e o real significado da obra: a importância de expiarmos nossas emoções e sabermos nos reconciliarmos conosco, com os outros e com nosso passado.
“[...] ela aprendeu uma coisa simples e óbvia que sempre soubera, e que todos sabiam: uma pessoa é, acima de tudo, uma coisa material, fácil de danificar e difícil de consertar. [...]”
Reparação não trata-se de ser perfeito e imune a críticas. Trata-se de um romance espetacular que vai além da ficção e que deveria ser considerado uma leitura quase que obrigatória. Não me surpreende que seja considerado entre críticos especializados e renomados escritores, uma obra-prima. Sua excelência é gritante no que o tange como um clássico moderno e que o faz superar e se destacar até mesmo em suas imperfeições.
E o que sentimos ao terminá-lo? Ah caros leitores.... não consigo explicitar sentimentos e opiniões que nem mesmo eu entendo. Não consigo predizer o que você sentirá. Mas posso afirmar que o desfecho eleva ainda mais a genialidade de Ian McEwan, que consegue subverter até mesmo nossas percepções. Que consegue nos suscitar dúvidas. Que consegue nos deixar pensativos para além do que nos foi dito. No que acreditar e no que questionar? Obras como essa nos eleva como leitores e preenche nossos intelectos. Nos mostra que o poder de uma boa narrativa pode estar onde nós menos esperamos. Se o senso artístico se materializasse, Reparação poderia ser sua representação perfeita.