Victor Dantas 18/02/2021
Um homem solteiro e rico precisa de uma esposa. #39
Escrito em 1797 e publicado em 1813, “Orgulho e Preconceito” de Jane Austen (1775-1817), é considerado um dos mais importantes romances da literatura inglesa e mundial.
É evidente que tais feitos são indiscutíveis e inquestionáveis. É evidente também que literatura nunca é consenso. Portanto, aqui está o registro de um leitor que leu esse importante clássico, mas que a experiência de leitura não foi tão positiva como esperado.
Breve sinopse:
A trama gira em torno da família Bennet, que vive em Meryton, Hertfordshire (cidade fictícia) no interior da Inglaterra no início do século XIX. O senhor e a senhora Bennet vive com suas cinco filhas, Jane, Elizabeth, Lydia, Mary e Kitty.
A situação que inicia o enredo é a chegada de um novo vizinho na mansão que fica ao lado da casa dos Bennet. O novo vizinho é o senhor Bingley, um aristocrata londrino.
Logo, a senhora Bennet vê nessa situação uma vantagem e oportunidade para sua família, principalmente suas filhas, em especial sua filha mais velha Jane. O Casamento.
A partir daí a trama se desenrola, no entanto, as coisas vão tomando um rumo diferente. Conflitos, disputas e incertezas que irão colocar em xeque as expectativas e planos da senhora Bennet e os efeitos destes para com suas filhas.
Observações pessoais:
Ao finalizar a leitura e elaborar uma opinião sobre a obra, levei em consideração todos os méritos, contexto social em que foi escrita e publicada, de forma que minha crítica não ficasse presa apenas ao meu gosto literário ou algo do tipo.
1) A Escrita
O livro foi escrito quando a Jane Austen tinha apenas 22 anos, ou seja, sua maturidade na escrita ainda não estava tão bem definida. Pelo menos foi essa a minha percepção. A escrita da autora em certos trechos é arrastada, prolixa, os diálogos se repetem (o mesmo assunto é retomado em diferentes cenas e personagens), e isso tornou a leitura cansativa para mim.
No entanto, estamos falando do século XIX!! Uma mulher de 22 anos escrevendo um livro!
A palavra que define esse momento: revolução. Viva Jane Austen!
2) Os Personagens
A história é recheada de inúmeras personagens, alguns aparecem mais que os outros, alguns são mais aprofundados que outros, dito isso, senti dificuldade em me afeiçoar com as personagens, tantos os protagonistas quanto os secundários.
Nem mesmo a Elizabeth, nem mesmo o Sr. Darcy, conseguiram me cativar. A personagem que mais me pareceu ser interessante foi o pai do Elizabeth. Faltou algo a mais sabe...
Talvez isso se deva ao fato que a história é narrada em 3ª pessoa, e isso impede de certa forma que o leitor mergulhe no personagem, na sua mente, sentimentos, enfim.
3) O Enredo
Com exceção dos protagonistas, Elizabeth e Darcy, acredito que o enredo de Orgulho e Preconceito é o que mais agrada a seus fãs, pois discute temas pertinentes que naquela época eram considerados tabus. E realmente isso acontece, no entanto, durante a leitura, identifiquei alguns “pontos negativos”.
Até a metade do livro eu estava achando a história bem amarrada e coesa, no entanto, durante os capítulos finais do livro, senti que a história deu uma acelerada brusca, as personagens rapidamente mudaram de postura, valores e opiniões, para que o desfecho fosse introduzido.
4) Assuntos relevantes da Obra
Apesar de eu ter achado o enredo fraco em alguns momentos, é nele que se encontram os temas que mais levanta discussão e reflexão, e particularmente são eles que elevam a importância da obra.
Patriarcado e papel de gênero: são vários os diálogos entre as personagens que é possível identificar como a sociedade inglesa funcionava na época diante da estrutura patriarcal.
Vemos a todo instante a senhora mãe Bennet exigindo que suas filhas desenvolvam “habilidades femininas”: sejam delicadas, sejam boas ouvintes, aprendam a cantar, a dançar, a costurar etc.
“(...) Uma mulher , para merecer tal qualificação, deve ter um conhecimento profundo sobre música, canto, desenho, dança e línguas modernas; e, além de tudo isto, deve possuir ainda o seu jeito de se mover e estar, de tom da voz, trato e expressões, ou só merecerá a qualificação em parte” (pg. 30).
O Casamento: talvez esse seja o tema central da obra, a instituição do casamento, que naquela época era garantia de sobrevivência da mulher, já que a vida da mulher fora do casamento significava a miséria, fome, apagamento.
Desde o primeiro capítulo até o último acompanhamos a corrida da senhora Bennet para “salvar” suas filhas, ou seja, casar todas elas o mais rápido possível.
Afinal, “Um homem solteiro e rico precisa de uma esposa” (pg.7).
“Orgulho e Preconceito” expõe da melhor forma como a instituição casamento foi fundamentada em posse e acúmulo de riqueza, e isso nos leva ao próximo ponto.
Herança e propriedade privada: sempre existiu a herança, mas esse direito foi reservado durante séculos, apenas ao homem. Para a mulher, restava a opção do casamento, se quisesse ter uma vida minimamente tranquila.
Com a instituição da propriedade privada isso se tornou ainda mais complexo, afinal, a propriedade privada nada mais é do que acúmulo de riqueza, sendo assim, como uma mulher poderia acumular riqueza se ela não tinha direito a herança, e nem podia exercer o trabalho (apenas o trabalho doméstico não remunerado).
“A propriedade de seu pai está destinada, pela sucessão, a cair nas mãos do Sr. Collins. (...) não vejo por que privam da descendência feminina do direito de herdar propriedades (...)” (pg. 108).
E foram essas as reflexões que “Orgulho e Preconceito” provocou em mim durante a leitura. Apesar de não ter gostado tanto quanto eu esperava, tais reflexões já tornaram a experiência de leitura válida e agregadora.
Finalmente eu li Orgulho e Preconceito.
Nota: A versão que eu li foi da editora Pé de Letra, e durante a leitura encontrei inúmeros erros ortográficos e de concordância verbal. A tradução foi insuficiente, bem como a revisão.
E talvez isso tenha prejudicado minha experiência de leitura, de poder absorver as informações do texto com clareza. Portanto, não recomendo esta edição.