Ari Phanie 19/10/2020"...ela se foi para o Lago do Pântano Sombrio onde a noite inteira, à luz de um vaga-lume frio, vai remando sua canoa branca."Quando saiu Um Lugar Bem Longe Daqui no ano passado, ele foi um sucesso quase instantâneo, e apesar de ter curtido muito a sinopse, deixei ele na geladeira para ler quando eu não estivesse mais tão impressionada por seu sucesso. Quando o peguei para ler agora, eu realmente não estava mais esperando que ele fosse o fenômeno que era considerado por muitos, e comecei a leitura sem expectativas elevadas. Mas sinceramente o livro me conquistou nos primeiros capítulos.
O tom da história já é pintado pro leitor no início. Esse é um livro de muita melancolia. Pra mim, livros melancólicos são livros fatigantes de ler. Normalmente, eles esgotam minha energia e eu preciso de mais tempo do que o necessário pra leitura. Mas não com esse aqui. A história da novata (não tão novata assim) Delia Owens é mesmo muito desoladora, mas por outro lado, é de uma sensibilidade impressionante. E eu me senti tocada em cada uma de suas páginas; não me parecia só uma história contada, o brilhantismo da Owens está no fato de que ela mais pintou do que narrou o conto de Kya, pelo menos pra mim. Ela conseguiu me fazer desenhar perfeitamente na minha cabeça aquela área pantanosa povoada por um sem-fim de vida animal e vegetal onde aquela menina/mulher vivia isolada andando em meio à neblina e, pelas lagoas e praias. E por falar na menina/mulher do brejo, Kya é uma personagem inesquecível. Ela foi abandonada em uma cabana no meio de um brejo, e com apenas 06 anos precisa aprender a sobreviver sozinha. E sozinha Kya permanece por muito tempo; ela foi ensinada a não confiar em ninguém, e quase ninguém na cidade onde mora é digno de sua confiança. Na realidade, a história de vida da protagonista é marcada pelo preconceito. Ela é considerada uma selvagem, "lixo branco", e os únicos que lhe estendem a mão inicialmente são exatamente aqueles que também são excluídos pela sociedade: os negros. Mas por mais que Kya crie esses poucos laços de afeto (que não são os únicos porque ela conhece dois jovens que mudam sua vida), sua existência na maior parte do tempo é vivida em isolamento, e por um longo período, ela só tem os animais como companhia. Experimentar a solidão de Kya é doído e angustiante. A personagem vive uma linda e sombria realidade que oscila entre paraíso e limbo.
Kya não opta por viver sozinha quando criança, mas quando não tem mais ninguém por perto, ela acha melhor continuar assim. Só que ninguém consegue gostar da solidão por tanto tempo. E é aí que entram Tate e Chase. Dois personagens opostos pelos quais Kya se sente atraída. Eu não vou entrar em detalhes sobre nenhum dos dois, mas as decepções que ambos a fizeram passar me fez odiá-los. Isso só muda em relação a um deles lá pelos capítulos finais. Os outros personagens secundários tiveram o meu carinho permanente, como Pulinho e Mabel. Mesmo Jodie é um personagem acalentador.
Eu confesso que a reta final me cansou um pouco, achei algumas coisas repetitivas. No entanto, nada que tenha conseguido macular o carinho que essa história despertou em mim. A trama é, de fato, uma "ode à natureza", um poema sobre abandono e solicitude, uma linda pintura sobre força e superação. Toda a mística do cenário, toda a melancolia das palavras e versos, e a crueldade dos humanos em comparação com os animais, criou uma narrativa impossível de não impressionar. O livro vale toda a crítica positiva, e definitivamente entrou para os meus preferidos do ano. Já estou aguardando ansiosa pelo filme e por outras ficções da Delia Owens.