Carta a D.

Carta a D. André Gorz
André Gorz
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Resenhas - Carta a D.


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Flávia Menezes 29/07/2023

SERÁ QUE EU POSSO LHE FALAR UM POUQUINHO SOBRE O AMOR?
?Carta a D. ? Uma história de amor? é o último livro do filósofo e jornalista austríaco, e um dos mais importantes intelectuais da atualidade, André Gorz, publicado em 2006 e escrito em homenagem a sua esposa Dorine, com quem ele partilhou sua vida por quase setenta anos, antes da decisão trágica de deixarem o mundo juntos, evitando assim que não passassem pelo sofrimento de ver o grande amor de sua vida partir, deixando-o(a) para trás.
Assim como Sartre, com quem ele tinha uma proximidade, André foi um existencialista, e esse seu pensamento filosófico exala em cada uma das suas palavras, às vezes até se afastando um pouco do tema principal, apenas para satisfazer suas necessidades de escritor, discorrendo sobre outros temas, ou apenas se permitindo filosofar um pouco sobre o ser e o tempo.
Mas as suas escapadelas não estragaram em nada o seu intuito de evidenciar tudo o que havia de mais belo em Dorine, e de nos provar que o amor nunca será algo obsoleto nesse mundo, mas ao contrário, tudo o que há de mais importante e pelo qual devemos viver para encontrar.
Essa é uma obra de um homem agradecido pela vida ter lhe dado a maior dádiva que pode existir nessa terra: a do encontro de duas almas que precisavam estar juntas para passar por essa existência sendo o amparo e o sustento uma da outra.
E a verdade é que isso é algo tão raro!
Geralmente o que vemos (ou encontramos) são duas pessoas que se aproximam por uma atração física mútua, ou até por uma certa admiração, mas que quando chegam mais perto, sentem que algo continua a lhes faltar. E de fato, realmente falta.
Uma conexão verdadeira é algo raro e que não se pode explicar. Mas é fato que quando encontramos, sentimos o outro com tanta força que vai além das palavras, e nem sequer precisamos estar perto para poder saber como o outro está. É quando conseguimos até saber o que o outro pensa, porque é uma ligação não de corpo, mas de almas. E são nesses momentos, quando enfim encontramos alguém assim, que nos sentimos completos. E essa falta que eu disse acima para de existir, e só voltaremos a senti-la se por algum motivo (cruel e injusto!) a vida nos afastar. Daí será como viver com um pedaço do nosso coração arrancado do peito.
Para quem sabe do que eu estou falando, porque já se sentiu assim (ou está vivendo), sabe que isso não são palavras de uma romântica incurável, mas algo real. E muito real!
Eu disse no título dessa resenha que gostaria de lhe falar sobre o amor, mas preciso confessar que não o farei usando as minhas próprias palavras, mas vou pegar por empréstimo as do André, porque ele teve mais sucesso do que eu em amar e ter conseguido comunicar esse amor com tanta facilidade a ponto de ser amado de volta e ter podido viver uma vida toda sustentado por ele.
Então, se me permitir, podemos começar...
 
?Mas nada disso dá conta da ligação invisível pela qual nós nos sentimos unidos desde o início. Por mais que tivéssemos sido profundamente diferentes, mas eu não deixava de sentir que alguma coisa fundamental era comum a nós, um tipo de ferida original (...). Não importa: para ambos, ela significava que não tínhamos um lugar assegurado no mundo, e só teríamos aquele que fizéssemos para nós.?
?Você não tinha nenhum lugar que fosse seu no mundo dos adultos. Estava condenada a ser forte porque todo o seu universo era precário. Eu sempre senti, ao mesmo tempo, a sua força e a sua fragilidade subjacente. Eu gostava da sua fragilidade superada, admirava a sua força frágil. Nós éramos, eu e você, filhos da precariedade e do conflito. Fomos feitos para nos proteger mutuamente contra ambos, e precisávamos criar juntos, um pelo outro, o lugar no mundo que originalmente nos tinha sido negado. Por isso, no entanto, seria necessário que o nosso amor fosse também um pacto para a vida inteira.?
?Até aquele dia de verão em que você me disse calmamente que não queria mais esperar minha decisão. Você era capaz de compreender que eu não quisesse passar a vida ao seu lado. Nesse caso, preferia deixar-me antes que o nosso amor se desgastasse em brigas e traições. ?Os homens não sabem romper?, você dizia. ?As mulheres preferem que a ruptura seja clara?.?
?Eu soube naquele momento que não tinha necessidade de nenhum prazo para refletir; que teria saudades para sempre se a deixasse partir. Você foi a primeira mulher que eu consegui amar de corpo e alma, com quem eu me sentia em ressonância profunda; meu primeiro amor verdadeiro, para dizer tudo. Se eu fosse incapaz de amá-la de verdade, nunca poderia amar ninguém.?
?Você tinha uma autoridade natural, o senso do contato e da organização; tinha humor; ficava à vontade e deixava os outros à vontade em todas as situações; não demorava a se tornar confidente e conselheira das pessoas à sua volta. Você apreendia intuitivamente, com uma rapidez espantosa, os problemas dos outros, e os ajudava a enxergar mais claro dentro de si mesmos.?
?Eu estava consciente de precisar de você para encontrar o meu caminho, de só poder amar você.?
?Lembro de ter escrito a E. que no final das contas, só uma coisa me era realmente essencial: estar com você. Eu não posso me imaginar escrevendo se você não mais existir. Você é o essencial sem o qual todo o resto, importante apenas porque você existe, perderá o sentido e a importância.?
?Você acabou de fazer oitenta e dois anos. Continua bela, graciosa e desejável. Faz cinquenta e oito anos que vivemos juntos, e eu amo você mais do que nunca. Recentemente, eu me apaixonei por você mais uma vez, e sinto em mim, de novo, um vazio devorador, que só o seu corpo estreitado contra o meu pode preencher.?
 
Entendeu agora o que eu queria dizer? Eu não precisava escrever nada. Bastava colocar as palavras dele para explicar sobre o amor, porque não é sobre ser tudo perfeito, mas que mesmo com todas as dificuldades e nas diferenças entre eles, o André conseguia apreciar a mulher que tinha ao seu lado por quem ela era. Vendo e evidenciando tudo o que ela tinha de mais belo, amando sua aparência, apreciando o seu envelhecer tanto quanto a admirava no frescor de sua juventude.
E principalmente, sendo grato por todas as entregas que ela fez para estar ao seu lado, e o tê-lo apoiado, mesmo em momentos em que ela mesma se sentia um pouco sozinha. Porque amar também é se sacrificar em prol de um bem maior que os ligava.
Gostaria apenas de lhe dizer que apesar de trazer essas partes tão bonitas, existem muitas mais neste livro de apenas 40 páginas, e por isso, espero que não fique zangado(a) por eu ter me utilizado de partes dele, mas é que eu precisei do André para poder trazer algo que é tão importante, mas tão subestimado, banalizado, descartável e desprezado nesse mundo: o amor!
Amar não é sinônimo de romantismo. Amar é muito mais do que flores ou demonstrações de afeto. Amar é entrega, é sacrifício, é muitas vezes até se deixar de lado, de não se perder no orgulho, porque o amor não é sobre um, mas sobre dois.
Para saber se é amor, um teste que sempre eu faço, é de me imaginar estando nos braços da pessoa. Nesse momento, ouvindo o pulsar do coração do outro encontrando o meu, eu sei que é amor se eu me sentir completa. Porque eu sei que é amor se nos braços dele eu encontrar o meu lugar, o meu lar!
Ana Sá 30/07/2023minha estante
Eu não tenho estrutura emocional nem pra ler sua resenha, com esse livro eu morreria de chorar!! rs Muito bonito tudo que vc destacou!! ??


Flávia Menezes 01/08/2023minha estante
Amiga, mas eu acho que você amaria esse!!! Que narrativa incrível e ainda com um toque poético e filosófico! ? Sem contar que achei uma aula sobre amor. Muita gente fica por aí dizendo ?eu te amo??. Mas no final, ama nada. Mas já o André?. ??????!
Obs.: por mais homens no mundo assim ????




Bookster Pedro Pacifico 18/07/2023

Carta a D. – história de um amor, de André Gorz
É cada vez mais frequente escutarmos sobre o problema de idealizarmos o relacionamento perfeito, a busca pela alma gêmea e o viveram felizes para sempre, que costumamos assistir em filmes e de pessoas que acompanhamos nas redes sociais. Mas será que o relacionamento precisa ser perfeito para ser marcante e duradouro? Não estaria o amor também presente nos momentos difíceis e de imperfeições?

Em “Carta a D.”, o filósofo austro-francês nos convida a conhecer, por meio de uma belíssima declaração de amor, um pouco do seu relacionamento de quase seis décadas com sua companheira. Publicado em 2006, o Gorz escreve para Dorine, relembrando tantos momentos de companheirismo, quando sua esposa já sofre de uma doença degenerativa irreversível. E até diante dessa certa da não cura, o autor consegue demonstrar o cuidado e a admiração por quem viveu tanto tempo ao seu lado, como já encontramos no início do seu texto:

"Você está para fazer 82 anos. Encolheu seis centímetros, não pesa mais do que 45 quilos e continua bela, graciosa e desejável. Já faz 58 anos que vivemos juntos, e eu amo você mais do que nunca."

Mas, antes de ler, é importante você saber que a declaração não foi construída a partir de uma escrita poética ou que o texto se restringe à relação do casal. Talvez a própria formação de filósofo de Gorz explique o fato de o autor também mergulhar no contexto histórico dos momentos em que viveram, abordando ainda temas políticos e filosóficos, com um pano de fundo sobre a sua vida que extrapola a relação com Dorine.

E a história dos dois tem um final que não está na declaração, mas que certamente é digna de um livro: um anos depois da publicação de “Carta a D.”, Gorz e Dorina triaram a própria vida juntos. O bilhete deixado pelo filósofo está ao final da edição.

Um livro curtinho, mas que nos faz refletir e, porque não, acreditar no amor.

Nota 8,5/10

Para mais resenhas, siga o @book.ster no instagram.

site: https://www.instagram.com/p/CuQNUGfrcY7/
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Livrogram 21/10/2012

Esse livro merece um comentário fresco, acabei de ler e não paro de pensar nele.



Hannah Arendt diria que o amor é a-político, que o mundo se incendeia quando duas pessoas se encontram.



Eu sou uma pessoa apaixonada, sou apaixonada pelo mundo, depois de ter lido o que Arendt diz comecei a questionar o meu amor pelo outro e pelo mundo.



Esse livro me provou uma única coisa, o amor entre duas pessoas pode construir sim o amor pelo mundo, e o amor pelo mundo pode sim construir o amor entre duas pessoas.



Dorine e André tinham seus respectivos mundos, se encontraram e construiram um único mundo, e esse mundo que eles construiram era o mundo real, de todos, comum a todos.



Dorine acreditou até o final na tarefa de André Gorz, e trouxe a realidade até ele. É lindo pensar que o nosso mundo não pode existir sem fé, sem história e sem amor. Não pode existir só na teoria.



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Thamiris.Treigher 01/08/2022

Simples e lindo
Uma carta de amor verdadeira. "Carta a D." é apenas isso e é tudo isso.

André Gorz, considerado um dos principais filósofos do pós-guerra, mostra nessa Carta o que todos nós somos verdadeiramente, apesar de todos os nossos títulos, nossas conquistas e nossos fracassos. Somos seres que amam e que desejam ser amados.

Nesta Carta que virou esse precioso livro, Gorz relembra toda a sua história de amor com Dorine, a mulher com quem passou a vida e que sofria de uma doença incurável.

Uma carta verdadeira, simples como o amor é. Sem exageros de novelas, de filmes com amores impossíveis de existir. O amor nu e cru, com suas singelezas, detalhes, simplicidade e dificuldades.

Um livro que tocou meu coração. Lindo e triste. Simples e sincero. O que aconteceu em 2007, um ano após a publicação do livro, é de partir o coração, ao estilo Romeu e Julieta (com suas devidas divergências).

Um livro sobre o companheirismo de duas pessoas eternamente - e verdadeiramente - apaixonadas.
Michele Boroh 01/08/2022minha estante
Se a resenha já ficou linda assim, só resta ler o livro!


Alê | @alexandrejjr 02/08/2022minha estante
Livros sobre amor verdadeiro, sobre paixão real, sempre são boas pedidas! Parabéns pela resenha, Thamiris!


Thamiris.Treigher 02/08/2022minha estante
Owm Michele, obrigada mesmo!! ?


Thamiris.Treigher 02/08/2022minha estante
Sempre, né? Eu me surpreendi com esse livro. Obrigada, Alexandre?


Carolina.Gomes 03/08/2022minha estante
Ahhh!! Livros sobre o amor?. ??


Thamiris.Treigher 04/08/2022minha estante
Carol ???




Lorayne.Stinguel 13/04/2021

Uma declaração de amor meio científica, rs. Só ficou chato no momento que ficou falando de si mesmo, mas deu para perceber que apesar dos erros que cometeu, ele derrama todo seu amor diante dela.
Karina.Agra 26/04/2021minha estante
O problema é que a maior parte ele passa falando dele. Pra mim foi decepcionante.


Lorayne.Stinguel 26/04/2021minha estante
Percebi isso também!




Luciane 08/04/2021

Carta a D. História de um amor
Foi o último livro escrito pelo filósofo francês Andre Gorz. Trata-se de uma carta de amor àquela que foi sua companheira por 58 anos. Difícil não se emocionar com essa linda história de amor, real, entre duas pessoas cultas e inteligentes, que se escolheram e se amaram até o final de seus dias. O casal se suicidou em 22 de setembro de 2007, numa clara recusa a viverem um sem o outro.
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Leticia 20/03/2021

Carta a D. História de um amor. O próprio título já diz do que se trata o livro, a historia de amor entre André Gorz e sua esposa Dorine. Delicado e tocante, André rememora a sua trajetória de vida entrelaçada com a de Dorine, e como ela foi essencial em sua vida, os aprendizados, a forma como encaravam a vida e sobretudo o companheirismo, até mesmo na morte.

"Você está para fazer oitenta e dois anos. Encolheu seis centímetros, não pesa mais do que quarenta e cinco quilos e continua bela, graciosa e desejável. Já faz cinquenta e oito anos que vivemos juntos e eu amo você mais que nunca. De novo, carrego no fundo do meu peito um vazio devorador que somente o calor do seu corpo contra o meu é capaz de preencher"

Se você acha que ler um livro que basicamente é uma carta de amor é algo ridículo, você está certo, todas as cartas de amor são ridículas, já disse Fernando Pessoa. "Mas afinal, só as criaturas que nunca escreveram Cartas de amor é que são ridículas".
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gabs pina 28/12/2022

belíssimo! da história à escrita, do início ao fim, esse livro tem a capacidade de emocionar. apaixonada e emocionada.
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spoiler visualizar
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Laura 24/01/2023

Foi acima de tudo um grande amor, não aquele descrito em livros de romance ou em grandes tragédias, mas ainda sim, um grande amor do cotidiano comum
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Déa Paulino 09/07/2009

Para encantar e refletir
Carta a D. não é só uma carta de amor, é também o retrato das bases sólidas em que se funda uma relação duradoura – que, no caso deles, foi “eterna” - e de parte da vida de um respeitado intelectual.
É um livro lindo, sim. E romântico. Mas talvez sirva também (e principalmente) para traçarmos, a partir dele, um paralelo com a realidade dos relacionamentos que construímos em um tempo tão carente de valores humanos.
Se é bonito ler André Gorz declarando-se apaixonado, é ainda melhor vê-lo enumerando as qualidades da esposa ou reconhecendo, ainda que tardiamente, os erros cometidos ao longo da vida em comum. Tão encantadoras quanto as linhas em que descreve o afeto são aquelas em Dorine torna-se o centro de toda a sua admiração e de sua gratidão.
Tanto pelo encantamento quanto pela reflexão a que, inevitavelmente, nos conduz, é um livro que merece ser lido.

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Julliana 15/06/2022

Primeiro livro do ano.
Li esta maravilha em janeiro, e me fez chorar uns 5L no mínimo, muito emocionante, além do romance tbm há um retrato histórico de Praga. O final é extremamente triste e não há spoiler nisso pois logo na parte de trás do livro é exposto a morte do casal, muito muito triste.
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Paula 04/11/2013

História de um amor
“Você está para fazer oitenta e dois anos. Encolheu seis centímetros, não pesa mais do que quarenta e cinco quilos e continua bela, graciosa e desejável. Já faz cinquenta e oito anos que vivemos juntos, e eu amo você mais do que nunca. De novo, carrego no fundo do meu peito um vazio devorador que somente o calor do seu corpo contra o meu é capaz de preencher”.

Assim começa essa história de amor, quase um Romeu e Julieta, com a diferença de que aqui o tempo e a saúde foram os vilões. Relendo esse livro me dei conta de duas coisas: que há mesmo um tempo certo para cada livro, porque não tinha gostado tanto dele quanto gostei agora; e que ainda há amores que duram para sempre, mesmo nos tempos de hoje.

André Gorz é um dos mais importantes intelectuais da atualidade, foi filósofo e jornalista, publicou dezenas de livros, centenas de artigos e ensaios. Nasceu em Viena, na Áustria, em 1923. Foi levado para a Suíça pela mãe em 1938, que temia o exército nazista. O pai havia sido preso pelas tropas nazistas e ela não queria que o mesmo ocorresse com o filho por conta de sua ascendência judaica. André Gorz, que na verdade é um pseudônimo, com o qual ficou mundialmente famoso (seu nome verdadeiro é Gerhard Horst), permaneceu na Suíça até o final da guerra, estudou engenharia química, e se tornou um dos principais conhecedores da obra de Jean-Paul Sartre. Paralelamente à atividade de jornalista, desenvolveu uma intensa atividade teórica e política.

Carta a D. foi seu último livro, escrito em homenagem a sua esposa Dorine, com quem viveu por quase sessenta anos. Acho que podemos considerá-lo uma carta de amor e também uma carta de despedida. Nele, André Gorz faz uma análise de toda sua vida, relembrando os momentos mais difíceis e importantes de sua carreira apenas para constatar que nada do que fez ou produziu teria sido possível sem sua esposa, e que talvez ele não tenha dito isso com todas as letras em seus trabalhos. Ficamos sabendo como os dois se conheceram, de como ele se sentia em relação ao mundo e à sua família (“Minha família se tornara tão estrangeira para mim quanto meu próprio país” pág. 13) ressaltando essa relação de amor e de companheirismo que se estabeleceu entre os dois no decorrer de suas vidas. E ficamos sabendo também que Dorine teve um papel fundamental em toda a produção teórica/ filosófica/ política desse autor, tendo o encorajado durante toda sua vida:

“Você dizia que tinha se unido a alguém que não podia viver sem escrever, e sabia que quem quer ser escritor precisa se isolar, tomar notas a qualquer hora do dia ou da noite; que seu trabalho com a linguagem continua mesmo depois de largar o lápis, e pode inesperadamente se apossar dele por completo, bem no meio de uma refeição ou uma conversa. “Se eu pelo menos soubesse o que se passa na sua cabeça”, você dizia ás vezes, diante de meus longos devaneios em silêncio. Mas você também sabia disso porque você mesma já tinha passado por isso: um fluxo de palavras procurando o arranjo mais cristalino; fiapos de frases continuamente remanejados; começos de ideias que ameaçavam desvanecer se uma senha ou símbolo não conseguisse fixá-las na memória. Amar um escritor é amar que ele escreva, dizia você. “Então escreva!”. (página 21)

Chamou minha atenção que Dorine quis aprender alemão e Gorz lhe disse “Não quero que você aprenda nenhuma palavra dessa língua, nunca mais vou falar alemão”, demonstrando o peso de um passado que transformou o alemão numa língua relacionada à morte, ao ódio, à tristeza, ao que não se quer lembrar. No entanto, as últimas palavras da carta são em alemão, como se diante da ideia da morte de sua amada, uma dor tão grande de suportar, só mesmo a língua materna (ou a tristeza a ela relacionada) pudesse descrever: Die Welt is leer, Ich will nicht leben mehr (O mundo está vazio, não quero mais viver).

“Eu não posso me imaginar escrevendo se você não mais existir. Você é o essencial sem o qual todo o resto, importante apenas porque você existe, perderá o sentido e a importância. Disse-lhe isso na dedicatória do meu último escrito.” (Pág. 51)

Terminei de ler o livro chorando, porque não há dor maior do que perder quem se ama e o relato foi realmente emocionante. E fiquei pensando se Dorine chegou a ler essa carta que ele escreveu. Espero que ela tenha lido. O posfácio informa que Gorz e Dorine se suicidaram juntos em setembro de 2007, mas o último parágrafo me fez pensar que é possível outra interpretação, pois não temos um depoimento de Dorine: talvez ela tenha falecido, pois estava muito doente, e, diante da visão de perdê-la, ele tenha se suicidado para que os dois pudessem seguir juntos, porque ele não saberia mais viver no mundo sem ela. Feito Romeu e Julieta. Se eles decidiram juntos em vida ou se ele decidiu isso depois de sua morte, pouco importa. O que fica claro nesse livro, nessa carta, é a história de um amor que existiu durante toda uma vida.

André Gorz. Carta a D. : história de um amor. Cosac Naify Portátil: São Paulo, 2012.

site: http://www.pipanaosabevoar.blogspot.com.br/2013/11/carta-d-historia-de-um-amor.html
Paty 19/11/2013minha estante
;D NICE!




yomaeli 08/08/2021

Lindo, lindo, lindo.

Foi uma mistura de sensações e perspectivas. Aqui vemos Gorz se tornando vulnerável e deixando às claras tudo o que sentiu e sente por D, sua mulher, incluindo os momentos de culpa (em que ele faz um super mea culpa), medo, perrengues e fraquezas.

Teve um momento em que, já apaixonada pelo casal, senti que o autor estava falando demais de si mesmo, da sua escrita e de todas suas fundamentações filosóficas, mas isso também faz sentido, pois o amor deles era político.

Essas poucas folhas tem muita força, amor, redenção e dor. Eu adorei conhecer a fundo a história de amor real desses dois.
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Ricardo256 30/01/2022

História de um amor
?Você está para fazer oitenta e dois anos. Encolheu seis centímetros, não pesa mais do que quarenta e cinco quilos e continua bra, graciosa e desejável. Já faz cinquenta e oito anos que vivemos juntos, e eu amo você mais do que nunca. De novo, carrego no fundo do meu peito um vazio devorador que somente o calor do seu corpo contra o meu é capaz de preencher.?
É assim que André Gorz inicia o maravilhoso livro Carta a D. Se trata de uma história de amor muito longe de ser clichê. Há uma riqueza enorme no texto, uma construção que irá te deixar muito emocionado. Chorei ao terminar este livro que possui uma grande carga sentimental. O livro consiste de uma declaração de amor estendida a Dorine, aqui no título apenas por D. Ele vai contando cenas desses quase sessenta anos que estiveram juntos. Muito lindo! Amei ler este livro. Um dos favoritos para os melhores do ano.
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