Carol 12/11/2024Impressões da CarolLivro: Salammbô {1862}
Autor: Gustave Flaubert {França, 1821-1880}
Tradução: Ivone Benedetti
Editora: Carambaia
464p.
Mary Beard narra em "SPQR" que Catão, o Velho finalizava todos os seus discursos, no Senado romano, com a frase: "Carthago delenda est". Catão prezava pela retórica e pelo drama. Ao incitar Roma pela destruição de Cartago, deixava rolar, de sua toga, um punhado de figos cartaginenses deliciosamente maduros. Divônico, não?
Cartago sempre me fascinou. A capital de um império esplendoroso, fundada por Dido, uma das maiores civilizações da antiguidade, berço de Aníbal e seus elefantes de guerra. Por que Roma a destruiu, ao final da Terceira Guerra Púnica? Há muitas hipóteses, talvez nunca saibamos a resposta correta. Porém, sempre teremos a Cartago sonhada, imaginada por artistas e literatos, ao longo dos séculos.
Uma das mais exuberantes Cartagos possíveis é a Cartago de Flaubert, a Cartago de "Salammbô".
Flaubert escolhe como pano de fundo de sua ficção histórica, um evento menos conhecido da história cartaginesa: a Guerra Sem Trégua, ocorrida logo após o fim da Primeira Guerra Púnica, na qual tropas de mercenários empregadas por Cartago se amotinaram, com o apoio de populações africanas, contra o controle cartaginês.
É a deixa para reconstruir Cartago, suas paisagens, cheiros, vozes, cores, povo, crenças e fazer desfilar, por suas ruas, personagens históricos: Amílcar Barca, pai de Aníbal; Mâthos, líder líbio dos mercenários; Narr'Havas, rei da Numídia e, claro, a luxuriante filha de Aníbal, a quem Flaubert dá o nome de Salammbô.
Foi uma leitura inebriante. "Salammbô" é um delírio, um livro sinestésico. O orientalismo de um francês do século XIX recriando uma civilização há muito perdida. Não qualquer francês: Flaubert, o homem que fazia a pena ferver a cada frase escrita. A palavra justa. A beleza da literatura. A sensualidade inerente a tudo. Quem não se rende ao desvario de Tanit e da lua que paira sobre Cartago? Quem não se rende a Salammbô?
A tradução de Ivone Benedetti é formidável e o posfácio de Samuel Titan Jr engrandece demais a leitura. Falar mais o quê? Mais um livro impecável da Carambaia.
Leiam Flaubert!