Clóvis Marcelo 23/07/2014"Este livro não é para crianças ou mesmo para os jovens, e muito menos as meninas. Ela atende exclusivamente aos casais, pais e mães, pessoas com graves e maduro que se preocupam com as questões sociais e tentar parar o movimento de decadência que nos leva para o abismo. Seu propósito não é entreter, mas para educar e moralizar." Capítulo 2
Lançado em 1973, o primeiro romance de Rubem Fonseca mostra a relação de Paul Morel, um excêntrico artista de vanguarda, com o ex-escritor e policial Vilela. Morel está preso, a princípio não se sabe por qual delito, mas é a partir de sua cela que narra histórias mescladas de sexo e violência, e descobrimos, a medida que conta sua própria história dentro de seu “fictício livro”, que está sendo acusado por assassinar uma de suas antigas companheiras.
Morel reflete sobre a arte, questionando a função da própria literatura. Suas conversas com Vilela são o típico quadro da metalinguagem – um livro dentro de outro; a linguagem que fala da linguagem.
Primeiro vamos acompanhando esse homem preso que escreve um romance. Em seguida observamos a trajetória desse personagem que ele descreve e sentimos precisas semelhanças entre os dois. Enquanto um é escritor, o outro fotógrafo e pintor. Não poderiam ser a mesma pessoa, poderiam?
Pelo confinamento cheguei a pensar que o sexo seria uma forma de reflexão daquilo que ele gostaria de ter feito, já que esse ato está enraizado em sua natureza. Por fim, é interessante desvendar que as duas histórias são as mesmas só que contadas substituindo nomes e características por outros não identificáveis, chegando ao ápice que revela a inocência ou culpa do réu.
Os capítulos são espaçados e divididos em cenas, como uma peça teatral. Para a época a linguagem do autor pode ser considerada ríspida e vívida, sem floreios. Isso ele guarda em suas divagações sobre a arte, a vida e o dom de escrever.
São muitas mulheres na vida desse escritor. Personagens muito bem construídos e toda a caracterização de romance urbano que critica uma sociedade burguesa e hipócrita contemporânea aquele tempo. Até que você monte o quebra-cabeça que compõe O Caso Morel pode levar um certo tempo, mas quando o fizer, encontrará uma leitura maravilhosa com muitas passagens existenciais de rico interesse para qualquer leitor.
“A cidade é um mercado com amplas possibilidades para todos, igualmente”, Vilela soturno, “você prende os criminosos que pode e finge acreditar que na prisão eles serão reabilitados e a sociedade, defendida. Mas você sabe que na verdade os criminosos são degradados e corrompidos na prisão e a sociedade não precisa ser defendida, mas sim destruída.” Pág. 161
Nota 1: Até hoje não entendo porque muitas epígrafes no decorrer dos capítulos e passagens no texto são escritas em francês, sem que haja nenhuma nota de rodapé com tradução para nos guiar. A editora ou o próprio autor deveriam ter pensado nisso para facilitar a vida do leitor.
Nota 2: Atualmente, toda a série de livros do autor está sendo publicada pela Editora Nova Fronteira através do selo Agir. As capas tem uma identidade visual incrível que combinam muito com o estilo de Rubem Fonseca. O melhor de tudo é que ao final das edições vem comentários sobre os respectivos livros pelo olhar de críticos/especialistas literários. O caso Morel conta ainda com os textos "Atrás das grades" de Sérgio Augusto e "O caso Rubem Fonseca" por Antônio Hohlfeldt.
QUOTE / CITAÇÃO
“A trama e a sequência tradicionais não têm mais significação... o escritor tende a uma consciência mais aguda de si mesmo no ato de criar. O exterior torna-se menor e o escritor afasta-se da realidade objetiva, afasta-se da história, da trama, do caráter definido, até que a percepção subjetiva do narrador é o único fato garantido na ficção.” Pág. 82
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http://defrentecomoslivros.blogspot.com/2014/07/resenha-o-caso-morel-rubem-fonseca.html