Andresa 09/01/2022Um clássico da literatura nacionalMenino de Engenho é o romance de estreia do escritor José Lins do Rego. Foi publicado pela primeira vez em 1932 e recebeu diversos elogios da crítica, bem como recebeu, no ano seguinte, o prêmio da Fundação Graça Aranha. Em 1965, o livro ganhou uma adaptação para o cinema. Ele marca o primeiro de 5 títulos que compõem a série de livros conhecida como Ciclo da Cana-de-Açúcar.
Feitas as devidas apresentações, o romance, que tem como plano de fundo o Nordeste, nos conta a história de Carlinhos. Aos 4 anos, o menino perdeu a mãe, que foi assassinada pelo próprio marido. Órfão, ele acaba sendo levado para o engenho do coronel José Paulino, seu avô, e encontra na Tia Maria, irmã de sua mãe, uma nova figura materna.
O livro descreve, basicamente, a infância e o início da adolescência de Carlinhos, até os 12 anos, nessa nova vida no engenho. O livro é pequeno, com capítulos curtos, e Zé Lins tem uma escrita gostosa, como alguém a contar histórias. Li a edição de 2020 publicada pelo Grupo Editorial Global, a qual é linda! Tem uma bela ilustração de capa em verde vivo e as lombadas dos 5 livros que compõem a série formam um belo conjunto na estante. As páginas são brancas, de boa grossura, e fontes em ótimo tamanho, o que facilita a leitura. A narrativa é rápida, cheia de acontecimentos, e ocorrem na primeira pessoa, na visão do Carlinhos.
O livro nos apresenta, ao longo de seus capítulos, diversos personagens que entram e saem da vida de Carlinhos, suas preocupações, tristezas e choros, primeiros amores, corações partidos e felicidades, pequenas alegrias que vem e voltam tão rápido quanto chegaram. Mostram também como a vida das crianças no engenho perde rapidamente o encanto e a pureza, com uma iniciação sexual não saudável, que deixa grandes marcas.
Um fato interessante é que a infância do protagonista se assemelha bastante, em certa parte, com a vida do próprio autor, que nasceu no engenho de seu avô materno e, assim como Carlinhos, perdeu a mãe e ficou afastado do pai, sendo criado por sua tia. Ainda, vale destacar que o romance foi tão bem aceito no meio literário que foi publicado na França em 1953, sob o título L'enfant de la plantation.
Há, no entanto, partes bastante indigestas na leitura. A época na qual se passa a história é aquela na qual a escravidão já havia sido abolida. Porém, muitos ainda permaneciam trabalhando como criados nas casas-grandes, em troca de comida, um lugar para morar e mantimentos. Logo, ainda há aquela discrepância entre a vida na casa-grande e nas senzalas, que não deixaram de existir. E ainda há a sensação de superioridade dos brancos, principalmente ao referenciar os negros com pronomes possessivos, em trechos que me deram arrepios...
Outros trechos da obra, porém, aparecem para tentar minimizar esse impacto, como a convivência com as pessoas negras de forma constante, dividindo a mesma mesa, o mesmo alimento, frequentando as mesmas festas, superando os mesmos desafios (como as cheias na região). Não deixa de causar, porém, uma inquietação imensa, o que pode despertar alguns gatilhos. Afinal, quem seria feliz vivendo como escravo, sem poder ser dono do próprio caminho, sofrendo com as injustiças sociais?
De forma geral, é uma leitura que vale muito a pena, não só para conhecer esse romance que impactou o cenário da literatura nacional, mas também para conhecer - e reconhecer - o regionalismo brasileiro contido na obra, bem como confrontar com a atualidade as desigualdade sociais vividas na época, para que continuemos a combatê-las.
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