Wagner 17/05/2012
Eu creio que ainda haja grande preconceito com a literatura brasileira, digamos assim, antiga. Um Machado de Assis ou um José de Alencar forçado pela escola é o suficiente para trazer uma torrente de generalizações a respeito de anos de escrita brasileira. O que seria qualquer um deles perto da magia e grandiosidade mística das obras nacionais contemporâneas? Obras geniais como as de Machado ou qualquer outro gênio da literatura, embora eu as considere atemporais, não mais condizem com a época, no entanto, em seu período de lançamento estavam em perfeita sintonia com o contexto social, e isso é um fator imprescindível para a assimilação e apreciação do livro. Sendo assim, Graciliano Ramos nos prestigia com seu primeiro romance, Caetés: uma obra sem muitos adornos e recursos, direta e simples. O que para muitos, imagino, seja uma qualidade, uma vez que ouve-se muito queixas de que a literatura possui demasiadas figuras que impedem o claro entendimento do texto, sob a alegação de que não é possível adentrar na subjetividade alheia, porém: sim, nós temos acesso à subjetividade do personagem nessa narração em primeira pessoa. O cenário se situa em Alagoas, num município chamado Palmeira dos Índios, e lá o autor cria uma narrativa em primeira pessoa no personagem de João Valério - a quem antipatizei logo de início - um escriturador mercantil que trabalha na empresa dos irmãos Teixeira: Adrião e Vitorino. Valério tem pela esposa daquele uma paixão que já dura três anos, tendo ele frequentado a casa do patrão por cinco e inicia o romance beijando-a duas vezes no pescoço, ao que Luísa reage estupefata e manda-o para fora. Com o desenvolvimento da narrativa, outros muitos personagens vão aparecendo, o que pode confundir o leitor, pois ora são chamados pelo nome ora pelo sobrenome e dificultam a total dominação das personalidades por parte do leitor.
Essa obra, como muitas de caráter semelhante, demonstra uma preocupação social tremenda do indivíduo muito evidente na pessoa de Valério que tenta desempacar um romance sobre índios caetés para obter elevação social e apreciação principalmente de sua amada Luísa, como também o valor de status da união matrimonial e a influência da religião em cada atitude. O herói dessa obra não possui lá nada de religioso, mas também afirma no final, talvez com ironia, que não é ateu. Em total contraste com os tempos atuais, temos a forma de sedução dos cavalheiros da época e o sofrimento causado e suas consequências pelo amor não correspondido e também a tamanha influência do pensamento das pessoas nas atitudes do indivíduo: mais uma preocupação social.
O esboço psicológico que o autor traça do personagem-narrador é repulsivo: chega a desejar a morte de Adrião, em mente que facilitaria seu romance com Luísa. Valério também tem uma espécie de anti-intelectualismo, atribui a instrução aos mais elevados socialmente, como o Dr. Liberato, mas e ao Nazaré? Mero tabelião...
Por fim a obra tem um desfecho não muito surpreendente mas também um tanto inesperado, tendo em vista a fama de "durão" que pousa sobre Adrião durante a narrativa. Eu esperava algo mais como o final de "A cartomante" de Machado de Assis.
Um livro bom para quem não tem contato com literatura brasileira ou tem preconceitos, ou somente quer iniciar o hábito de leitura. Recomendo.