Há cronistas sérios e há cronistas leves, mas os mais interessantes são os que dominam o segredo de misturar seriedade e leveza, de abordar os assuntos mais sérios com graça, por vezes quase frívola, que no fundo é liberdade de espírito, encanto diante do mundo, convite ao leitor, ímã literário.
Lêdo Ivo é o exemplo perfeito desse cronista, seduzido pelo espetáculo da vida, inteligente, divertido, capaz de extrair uma crônica do fato mais banal ou do mais insólito, de uma história de namorados ou recém-casados ao caso do defunto que se levanta no meio do velório, do humor das palavras cruzadas numa repartição pública ao tocador de flautim, das transformações urbanas e sociais do Rio de Janeiro ao ladrão de paisagem, do sono do pesquisador na Biblioteca Nacional, após o almoço, aos cachorros do aeroporto de Vitória.
Um dos poetas mais importantes da literatura brasileira, romancista, ensaísta, contista, senhor de todos os segredos da língua, estilista virtuoso, Lêdo Ivo cultiva a crônica desde os anos 1950. Alagoano de nascimento, é um dos grandes cronistas da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, que escolheu para viver e trabalhar. A propósito, leiam-se nessas suas Melhores Crônicas Lêdo Ivo as reunidas na seção "O Rio é uma Festa".
Rachel de Queiroz observou que o Rio "jamais foi cantado por nenhum dos seus filhos com ternura, força poética e inteligências iguais" às declarações de amor de Lêdo Ivo à cidade. Mas, por vezes, o cronista também se revolta contra a cidade amada. Leia-se “O Carioca Marques Rebelo”, que se inicia pela frase provocativa: "Marques Rebelo cometeu a imprudência de nascer no Rio de Janeiro", na qual protesta contra "a ingratidão póstuma da cidade" pelos seus escritores. Que ninguém se engane com a veemência justa do cronista. Protestar também é uma forma de amar.
Crônicas / Literatura Brasileira