O cronista descreve 100 amigas reais ou ficcionais, seus desejos e medos, como aquela que tem pânico de usar a calcinha errada no encontro certo ou a outra que, linda e cortejada até por presidente da República, na verdade vive só.
"Não é muito ofício. Procuro mulheres, no sentido literário da coisa. Gordas, magras, ricas ou pobres. Não importa. Mulheres reais que estejam dispostas a contar histórias de suas vidas cotidianas. Nada épico, nada que tenha mudado o curso da Humanidade, mas que seja saboroso e, de causo em causo, deixe que todas as outras mulheres se identifiquem.
Ontem mesmo ouvi uma delas. Contou que o primeiro casamento acabou porque o marido implicava com a maneira como ela passava as camisas. O segundo foi-se embora também pelo mesmo motivo. As passadeiras contratadas estressavam o cidadão com a má qualidade do serviço. Quando o terceiro marido começou a reclamar das camisas, que continuavam amarrotadas depois de se submeterem ao ferro de passar, a mulher que se dispôs a me contar a sua saga pelos absurdos da vida conjugal telefonou para a velha mãe. Pediu, pelo amor de Deus, a fórmula da goma das mulheres da família. Salvou o casamento, que agora vai todo engomado, um pouco chatinho, mas o que é que se pode fazer?
Essa tem sido a minha agenda de trabalho. Anoto histórias da vida delas para um livro, um documentário, o formato que tiver, de retratos femininos. Nada de discursos ideológicos ou pedradas no machismo. Faço perguntas, estimulo a memória, jogo iscas de repórter. Principalmente ouço com atenção o que a mulher está dizendo, sendo essa toda a paga pelo serviço. Não é pouco. Algumas mulheres reclamam do homem-polvo, aquele cheio de mãos a procurá-las nos momentos mais inconvenientes. Eu sou o que se chama de todo ouvidos. A antena centrada nelas. O gravador orgânico das orelhas ligado. Posto-me diante da entrevistada e perscruto o ser feminino.