Antonio Tabucchi é um dos grandes nomes da literatura italiana. Avesso às grandes verdades e às certezas absolutas, Tabucchi prefere os tons em surdina, o detalhe aparentemente insignificante, a precariedade de um mundo em ruínas, reinventado irônica e surpreendentemente pela linguagem. Seu texto configura-se, no dizer de Cesare Segre, por "passagens braquilógicas, aproximações abruptas, mudanças espantosas de registro", testemunhando com rara acuidade os problemas que afligem o homem contemporâneo.
Em Noturno indiano, em meio às referências lusitanas caras ao autor, emerge uma Índia estranha e inquietante, por artes de uma narrativa de extraordinária sutileza, feita de poucos eventos, pequenas transformações de sentimentos, desvios inusitados de sentidos. O roteiro alusivo da procura de alguém que não quer ser encontrado, matéria do livro, delineia-se de um miserável hotel de prostitutas a um hospital onde um médico filósofo conduz o protagonista pelos círculos infernais da pobreza e da dor humana. Da viagem de trem com um misterioso acompanhante a uma solitária estação no interior da Índia, dos hotéis de luxo onde pavoneiam milionários alheios à realidade circundante à sede de uma sociedade teosófica cujo mestre recita de cor poemas de Fernando Pessoa.
A viagem do protagonista - máscara pessoana - em busca do amigo Xavier e do tempo perdido, torna-se metáfora privilegiada do périplo da identidade sempre estrangeira, sempre num algures ou num mais além inalcançável do sujeito: a Índia, diz um dos personagens, é um lugar perfeito para se perder, sobretudo para quem o deseja.
Noturno indiano revela-se, pouco a pouco, como um romance noir, em que identidades se cruzam, através do percurso do protagonista de Bombaim a Goa. As identidades desfazem-se de si próprias, desdobram-se em outras e com elas se confundem na anônima melancolia de um homem incerto em busca de si mesmo.
Noturno indiano, além de várias edições italianas e das traduções realizadas para vários idiomas, inspirou o filme homônimo dirigido por Alain Corneau e estrelado por Jean-Hugues Anglade.
Literatura Estrangeira / Romance