Neste livro, Jacques Rancière apresenta uma série de excursões que procuram averiguar o destino das imagens hoje, em uma sociedade ao mesmo tempo saturada de imagens e que começa a desconfiar delas. Ao contrário de uma importante linhagem de teóricos, ele postula uma teoria não midiológica da “visualidade” e defende uma alteridade das imagens que transita, por exemplo, entre o grande romance realista francês do século XIX (uma matriz do pensamento estético de Rancière) e o cinema de Robert Bresson.
O filósofo engaja-se em uma teoria da arte como marca, inscrição e testemunho, que tem a fotografia e o cinema como emblemas. Relacionando o visível e o dizível, a tradição da “ut pictura poesis” (que pensa a relação entre as palavras e as imagens) é revista nos termos de uma teoria da obra de arte como inscrição testemunhal/imagética. Ele nos mostra ainda em que medida devemos ver a arte do regime pós-representativo, que denomina de estético, como uma ruptura com a hierarquia na qual as imagens estavam subordinadas aos textos. Ou seja, como pensar a relação entre palavras e imagens depois de Lessing e de seu tratado “Laocoonte”, que deve ser visto como o auge (e também o esgotamento) da estética da representação.
Rancière mostra que não faz sentido se pensar o irrepresentável hoje na chave do antigo regime imitativo da arte. Já para os pensadores românticos a arte não era representação de um objeto. Resta o desafio de se pensar o inimaginável e o não experienciável, como, por exemplo, o trauma: “O irrepresentável repousa justamente aí, na impossibilidade de uma experiência se expressar em sua língua própria.”
(Márcio Seligmann)
Jacques Rancière é um dos filósofos mais respeitados da atualidade. Professor emérito da Universidade Paris VIII (St. Denis), dedicou-se a pesquisas sobre as classes operárias francesas e lutas políticas marginalizadas da história oficial. Atualmente tem explorado as relações entre estética e política, com ênfase nas artes visuais, em livros como “La Partage du sensible”, “Le Spectateur émancipé”, “Les Écarts du cinema” e “Aisthesis. Scènes du régime esthétique de l´art”.
“O discurso que quer saudar as ‘imagens’ como sombras perdidas, fugitivamente convocadas da profundeza dos Infernos, deste modo parece as sustentar apenas ao preço de se contradizer, de se transformar num imenso poema que faz comunicar sem limite as artes e os suportes, as obras de arte e as ilustrações do mundo, o mutismo das imagens e sua eloquência. Por trás da aparência da contradição, é preciso olhar mais de perto o jogo dessas trocas.”