Mailson Furtado despontou entre os poetas de sua geração com versos que convidam os leitores a um passeio pela pequena Varjota, no sertão cearense: à cidade, editado pelo próprio autor, ganhou não apenas o Jabuti de melhor livro de poesia, como arrematou também a premiação máxima daquele 2018: a de livro do ano. Trata-se de um longo poema ensolarado, em que a vida cruza as ruas (e vice-versa) e toda a paisagem se agita diante dos olhos curiosos de um poeta que, a cada palavra, com ela se confunde. Em O dia, saímos da cidade de Furtado para uma casa onde ― apesar do caminho sugerido pelo título ― é noite; “e/ toda a vida cabe/ nesta noite”. O “poema em ato único” tece as horas insones, prensadas entre um dia que não vai embora e outro que não quer chegar. Não há amanhã, não há mundo, não há tempo: tudo que existe é a noite ao longo da qual o poeta enfrenta suas tantas inquietações a respeito da vida ― do que ela se tornou nestes dias que não nos deixam dormir ― e o monólogo que dá a elas como resposta, com a velocidade e a clareza características de sua poesia. Esta é uma obra de um poeta maduro, muito consciente do que pretende tocar e revelar com seus versos. Nas palavras de Micheliny Verunschk, que assina o texto de orelha, temos “a construção de certa poética da insônia, esta que, na obra de Furtado, se desfia em um tecido político que fala ao tempo que nos coube viver”. Rasgando esse tempo, sob o céu de sol escaldante ou recolhido, um poeta como Mailson Furtado consegue fazer com que as palavras brilhem e iluminem a vida até mesmo sob as sombras mais pesadas.
Poemas, poesias