Considerado o mestre dos demais heterônimos e o próprio ortônimo de Fernando Pessoa, calmo, naturalmente conciliado consigo mesmo e com o mundo, Alberto Caeiro possui a mansidão e a sabedoria que os outros invejam. Aproxima-se da postura do Zen Budismo. Para Caeiro, o importante é ver e ouvir: "A sensação é tudo (...) e o pensamento é uma doença".
Alberto Caeiro é o mais objetivo dos heterônimos. Busca o objetivismo absoluto, eliminando todos os vestígios da subjetividade. É o poeta que se volta para a fruição direta da Natureza; busca "as sensações das coisas tais como são". Opõe-se radicalmente ao intelectualismo, à abstração, à especulação metafísica e ao misticismo. Neste sentido, é o antípoda de Fernando Pessoa "ele-mesmo", é a negação do mistério, do oculto.
Coerente com a posição materialista, antiintelectualista, adota uma linguagem simples, direta, com a naturalidade de um discurso oral. Os versos simples e diretos, próximos do livre andamento da prosa, privilegiam o nominalismo, a "sensação das coisas tais como são". É o menos "culto" dos heterônimos, o que menos conhece a Gramática e a Literatura. Mas, sob a aparência exterior de uma justaposição arbitrária e negligente de versos livres, há uma organização rítmica cuidada e coerente. Caeiro é o abstrador paradoxalmente inimigo de abstrações; daí a secura e pobreza lexical de seu estilo.
A obra em estudo, Poemas Completos de Alberto Caeiro, traz um prefácio de Ricardo Reis (outro heterônimo de Fernando Pessoa, já comentado nesse estudo) que salienta o seguinte:
"Ignorante da vida e quase ignorante das letras, quase sem convívio nem cultura, fez Caeiro a sua obra por um progresso imperceptível e profundo, como aquele que dirige, através das consciências inconscientes dos homens, o desenvolvimento lógico das civilizações. Foi um progresso de sensações, ou, antes, de maneiras de as ter, e uma evolução íntima de pensamentos derivados de tais sensações progressivas.
Por uma intuição sobre-humana, como aquelas que fundam religiões para sempre, porém a que não assenta o título de religiosa, por isso que como o sol e a chuva, repugna toda a religião e toda a metafísica, este homem descobriu o mundo sem pensar nele, e criou um conceito do universo que não contém meras interpretações. Pensei, quando primeiro me foi entregada a empresa de prefaciar estes livros, em fazer um largo estudo, crítico e excursivo, sobre a obra de Caeiro e a sua natureza e destino fatal.
Tentei com abundância escrevê-lo. Porém não pude fazer estudo algum que me satisfizesse. Não se pode comentar, porque se não pode pensar, o que é directo, como o céu e a terra; pode tão-somente ver-se e sentir-se. Toda obra fala por si, [...] quem não entende não pode entender, e não há pois que explicar-lhe."
Ainda, no prefácio, Reis afirma que a obra é dedicada, por desejo do próprio autor, à memória de Cesário Verde. Fernando Pessoa em sua carta a Adolfo Casais Monteiro afirma sobre Alberto Caeiro: "Caeiro nasceu em Lisboa, mas viveu quase toda a sua vida no campo. Não teve profissão nem educação quase alguma... Era louro sem cor, olhos azuis; morreram-lhe cedo o pai e a mãe, e deixou-se ficar em casa, vivendo de uns pequenos rendimentos. Vivia com uma tia velha, tia-avó. Morreu de tuberculose em 1915".
Literatura Estrangeira / Poemas, poesias