O cinema está presente na vida de Quentin Tarantino mesmo antes de seu nascimento. A começar por seu nome. Quando estava grávida, sua mãe, Connie, viu um episódio de Gunsmoke e ficou encantada com Quint, o personagem de Burt Reynolds – e daí surgiu o nome. O jovem Quentin, filho de pai desconhecido, cresceu nos anos setenta, nutrido à base de cultura pop. Seu dia a dia girava em torno de um triângulo constituído pela banca de jornais onde ele devorava histórias em quadrinhos, a sala de cinema do bairro que projetava filmes de classe B ultraviolentos e o bar da esquina, no qual o adolescente se entupia de hambúrgueres e coca-cola. Aos 23 anos, viciado em vídeo, trabalhou em uma videolocadora que lhe serviu de escola de cinema.
Assim cresceu o mais novo darling de Hollywood, cuja estréia – com Cães de aluguel – aterrorizou e fascinou platéias em todo o mundo, trazendo à tona um dos cineastas mais polêmicos das últimas décadas. Roteiros malditos, violência assumida e sem justificativas, diálogos brilhantes, humor fascínio pela transgressão – reunidos por uma direção baseada no prazer de fazer cinema – produziram um novo enfant terrible, capaz de confundir cinéfilos e especialistas com filmes desconcertantes.
Antes de tornar- se roteirista e diretor, Quentin já era ator e, certa vez, ao tentar participar de uma grande produção, telefonou para um famoso diretor de Hollywood e disparou: "este é um filme com muitas festas, deixe-me entrar numa delas." O que Tarantino não esperava é, alguns anos depois, ser a estrela da festa, obrigando a gigantesca máquina cinematográfica a conviver com uma fera que ela mesma criou.
Para muitos, ele é o líder de uma nova geração que transformará o cinema americano, hoje repetitivo e com pouca criatividade. Seus filmes sempre são inspirados em outros grandes filmes, fato pelo qual o acusam de plagiador, mas trazem uma linguagem nova, rimando crueldade com inventividade e subversão formal. Fã declarado de John Travolta e tendo Brian De Palma como seu grande mestre, o verborrágico Tarantino desmonta o estereótipo hollywoodiano, associando um conhecimento enciclopédico do cinema aos Embalos de sábado à noite...
Conhecido como "o poeta da hemoglobina", ele propõe uma coleção de acertos de grandes cineastas de todos os tempos, enquadrada por uma estética da violência. Em Pulp Fiction (Tempo de violência), Palma de Ouro de Melhor Filme no Festival de Cannes de 1994, e seis indicações para o Oscar, atualmente em cartaz no Brasil, Tarantino repete a fórmula, inspirando-se nas novelas policiais dos anos 30 e 40 denominadas pulp magazines. O roteiro do filme, escrito em Amsterdã, em 1992, está sendo lançado pela Editora Rocco e evidencia seu estilo próprio, dando aos espectadores a oportunidade de mergulhar nos detalhes desta produção.
"Pulp fiction é um western spaghetti revisto e corrigido à moda rock’n roll. Algumas cenas de violência de Cães de aluguel e Pulp fiction chocaram muita gente, mas em Pulp eu adicionei um elemento de comédia que não havia em Cães", diz Tarantino, que no filme interpreta o papel de Jimmy, o amigo leal de Jules, o matador convertido. Para ele, a melhor época em Hollywood é quando as pessoas não sabem mais qual a fórmula que funciona e passam a arriscar. "Mas para isso é preciso um roteiro sólido. Pessoalmente, só arrisco na tela aquilo que funciona no papel. Se a cena não funciona no roteiro, não deve ser filmada", ensina.
Considerado genial, Quentin Tarantino deseja que os espectadores de seus filmes não saibam se devem rir ou se esconder debaixo da poltrona. Sua concepção de sucesso e realização é ver, um dia, sua vida contada numa história em quadrinhos. Amante do mistério e mestre em cenas de impacto, ele quer que o público tente, o tempo todo, desvendar. "Isso é o que mais gosto no cinema: o fato de saber que, enquanto eu faço meu filme, o espectador, na sua poltrona, está prestes a fazer o seu", afirma Tarantino, que graduou-se recentemente pelo Sundance Institute Director s Workshop and Lab.