“Nunca se retorna de um luto. Reconheço-o como minha casa desde já, embora eu possa caminhar para a janela, respirar outros ares.”
Quantas lembranças atravessam um corpo enlutado? O que fazer com o desejo de nossos mortos? Em sua estreia, Tatiana Lazzarotto nos apresenta, em prosa poética, o desenrolar de uma notícia de morte. É também uma história sobre um pai, uma filha e uma árvore. Um deles está morto. Os outros dois terão de sobreviver.
Narrado em primeira pessoa, o romance apresenta a história de uma mulher que perde o pai de forma repentina. Ela retorna a Província - cidade fictícia - para atender aos desejos deixados por ele: recuperar a casa da família e garantir que a velha árvore do quintal, já condenada, não seja derrubada.
Ao mesclar uma experiência ficcional de luto com as próprias memórias (o pai da autora faleceu em 2018), a narradora relembra a trajetória do patriarca, que deixou a profissão de comerciante quando ela e os irmãos eram crianças para se transformar em Papai Noel profissional. A família, galhos entrelaçados de uma árvore, é rememorada como clã – e configura-se como uma espécie de cordão de pisca-piscas em que cada lâmpada acesa importa para iluminar toda uma fileira.
É a partir das memórias reais e ficcionais, suscitadas pelo próprio estar de abandono, que a autora, já adulta, constrói uma narrativa madura e afetuosa sobre o luto.
“E é no entrelaçamento entre passado e presente que as faltas e ausências são expostas e preenchidas, a fim de nos fazer carinho em uma tentativa constante de decodificar o que é, ao mesmo tempo, indizível e enraizado na profundidade dos corpos. Uma árvore que se levanta nos fundos da casa, imponente, registro e artefato de que, contra todas as lógicas, Papai Noel existe.” (PILAR BU, poeta y professora)
Ficção / Romance