Há uma expressão muito interessante para falar de coisas consideradas impossíveis: " Fazer isso é como tirar leite de pedra ". Os que se interessam pelo tema da resiliência certamente tiveram a oportunidade de acompanhar ou viver histórias permeadas pelo modo " tirar leite de pedra ": situações de intensa privação, nas quais tudo indicava que não havia a menor possibilidade de sobrevivência criativa, o que, surpreendentemente, acontecia. Para cada um de nós, a vida é uma conquista permanente, jamais fixada de início. Face à perda, à adversidade, ao sofrimento que encontramos um dia no curso de nossas vidas, cada encontro – através da arte, da cultura, do esporte, com amigos, educadores, profissionais de saúde ou mesmo familiares – pode tecer estratégias de reparação das quais se pode lançar mão para que as marcas dessas experiências não sentenciem um futuro presumidamente determinado por traumas irremediáveis. Este livro abre um campo de debates sobre os disparadores (humanos, artísticos, coletivos e individuais) reconhecidos como fontes de sustentação de um processo de resiliência e sobre as formas pelas quais eles são visibilizados e construídos na vida de pessoas ou comunidades que buscam retomar suas possibilidades de criação de novas oportunidades de viver. É um tema cujo campo imantado atrai os interessados por produzir, a partir da turbulência provocada pelo desejo de viver, marcas de resiliência à espera de bons encontros para tocar a vida. questão de superação; é a história de luta de uma pessoa ou de um grupo de pessoas que, no enfrentamento de condições adversas de existência, inventa estratégias de retorno à vida, com a sustentação da coexistência da dor e da alegria. O fracasso anunciado no começo dessa história é transfigurado por soluções surpreendentes: a cada momento, remendar uma imagem, dar coerência aos acontecimentos, reparar uma ferida, reconciliar-se com o passado. É um trabalho permanente, que requer a disponibilidade de oferta de recursos afetivos e de apoio social, da instauração de um ritmo de escuta capaz de interromper os automatismos defensivos e fazer uma ressignificação simbólica que corresponde a transformações neurobiológicas constatáveis. É abrir espaço a mudanças para posições subjetivas mais potentes diante da vida – é reinventar, enfim, uma história e um destino.
Psicologia