Pouco conhecida do público no Brasil, a poeta inglesa Elizabeth Barrett Browning (1806-1861) é aclamada em todo o mundo pela crítica especializada, e seus sonetos figuram entre os mais populares da língua inglesa. Dona de uma biografia tão surpreendente quanto sua obra, Elizabeth publicou os Sonetos da portuguesa em 1850, tendo-os escrito anos antes, durante o período em que se correspondeu com o também poeta e futuro marido Robert Browning. É esta coletânea que chega agora aos leitores brasileiros pela Rocco, com tradução primorosa e um enriquecedor posfácio assinado por Leonardo Fróes.
Os sonetos narram a invulgar e imprevisível história de amor de Elizabeth e Robert, oito anos mais jovem que a escritora. O romance tem início quando a escritora, aos 40 anos, levando uma vida reclusa, recebe uma carta de Robert. Não bastasse a idade, avançada para o matrimônio naquela época, Elizabeth e seus irmãos tinham ordens expressas de seu excêntrico pai, Mr. Barrett, um homem rico, herdeiro de plantações na Jamaica, para nunca se casar; caso contrário seriam deserdados e afastados do convívio familiar.
Apesar de viver em reclusão e dada como “inválida” devido a dores recorrentes, Elizabeth produzia prolificamente. À época da troca de cartas, já havia publicado seus poemas em dois volumes e sua literatura já era conhecida na Inglaterra e nos Estados Unidos. Era natural, portanto, que recebesse cartas dos seus leitores. A primeira missiva enviada por Robert Browning demonstrava o profundo conhecimento do poeta sobre a sua obra e uma grande admiração pela mulher (mesmo sem conhecê-la pessoalmente), o que despertou o interesse de Elizabeth.
Mas a primeira visita demoraria quase seis meses para ocorrer. Ao longo de 20 meses, foram 574 cartas, que culminaram no casamento clandestino e na fuga para Paris e depois para a Itália, onde viveram até a morte da escritora, sempre na companhia de Miss Wilson, criada que acompanhou o casal na fuga, e de Flush, o fiel cocker spaniel que inspirou Virginia Woolf a contar a história deste amor (Flush, de 1933).
Durante a troca de correspondência, Elizabeth foi, passo a passo, delineando os seus sonetos. Por isso seus versos abrigam, segundo o tradutor e também poeta Leonardo Fróes, “três movimentos de definição muito clara: o da recusa inicial da amada, o do contágio do amor que se propaga (...) e o do coroamento glorioso do encontro (...)”.
Ainda que exista o movimento inicial da recusa, já no primeiro soneto a poeta demonstra indícios do seu interesse pelo “amor”, que ela ainda não houvera conhecido: “(...) ‘É a morte que me agarra?’ eu perguntava. ‘É amor’, a voz de prata me dizia.” Nos demais sonetos que seguem, fica clara a descrença de Elizabeth de que tal amor pudesse florescer, e a autora tenta mostrar as diferenças entre eles a fim de ratificar os destinos desencontrados de um e de outro.
Até que Elizabeth começa a dar vestígios do contágio do amor. Os sonetos seguintes comprovam a decisão de acolher e viver a sua história com Robert Browning e mostram a importância do amado em sua vida, capaz de extirpar o medo antes existente e de “cingir de cor” o coração da poeta, para usar uma de suas belíssimas imagens.
Encerra, lindamente, falando dos seus modos de amar o seu amado, no soneto 43, um dos mais famosos do livro, também traduzido por Manuel Bandeira, e mostrando a sua delicadeza na entrega do sentimento: “Como te amo? Deixa eu contar os modos. / Te amo do fundo e da largura e altura / A que a alma chega quando os fins procura / Do Ser da Graça ideal, sumindo a todos. (...).”