A publicação de Viagem à Lua, de Cyrano de Bergerac, repõe em circulação, em tradução nova e integral, um texto polêmico para o conhecimento de sua obra, sua época e da história da literatura. Ao mesmo tempo, o volume vem acompanhado de diversas cartas do autor, inéditas no Brasil, que se relacionam em vários pontos com Viagem à Lua e ainda iluminam outras facetas de Cyrano.
O título original de Viagem à Lua, mais extenso, especifica melhor o conteúdo: O outro mundo ou Os estados e impérios da Lua. Retomando a tradição da literatura de viagens para a Lua, cujo primeiro representante seguro foi Luciano de Samósata, Cyrano parece também estar dialogando com outros relatos de sua época em torno da mesma tópica, sendo o mais conhecido o de Johann Kepler, Sonho ou astronomia da Lua, publicado em 1634.
A forma satírica adotada naturalmente situa o texto entre diversos gêneros, ficcionais ou não, como o da literatura de viagens, da ficção científica, dos relatos utópicos e do diálogo filosófico, como também entre diferentes registros, indo do sublime ao grotesco, do lírico ao bizarro rabelaisiano. E igualmente carrega para seu interior problemáticas exteriores à tradição literária, como as contendas teologais do período em oposição às novas concepções filosóficas e científicas sobre o universo, que punham em xeque as cosmovisões religiosas do mundo.
São tantos os perigos envolvidos nessa crítica satírica que a primeira edição de Viagem à Lua, de 1657, dois anos após a morte do autor, saiu expurgada das passagens mais polêmicas. E o texto na íntegra teve que esperar até 1921 para vir a público.
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