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Canadá Richard Ford


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Amadurecer precocemente. Essa é a contingência que irá se impor na vida do adolescente Dell Parsons, o personagem central deste Canadá, depois que ele tem de lidar com a tragédia que faz desmantelar sua família: o assalto a banco protagonizado por seus pais, e a consequente prisão destes. Escrito pelo norte-americano Richard Ford, o livro combina road-story com romance de formação, ao acompanhar a saga de um garoto dito normal, egresso de uma família supostamente normal — o pai, ex-piloto da Força Aérea, a mãe, professora —, e cuja dificuldade financeira os levam a cometerem um crime que mudará o destino de todos para sempre. As virtudes narrativas de Ford, autor já angariado com o Prêmio Pulitzer, despontam desde a primeira linha: em ritmo vertiginoso, somos rapidamente familiarizados com o drama dos Parsons: “Para começar, vou contar o assalto que meus pais cometeram. Em seguida, os assassinatos que aconteceram mais tarde. O assalto é a parte mais importante, já que serviu para mudar o rumo da minha vida e o da minha irmã. Nada faria sentido, se eu não o contasse desde o início.” Ford estrutura a história, ambientada em 1960, em três partes, as duas primeiras mais longas, e a terceira, bem sintética, funcionando como um epílogo. Na primeira, o personagem-narrador Dell Parsons apresenta o cenário familiar nos momentos que antecederam o grande crime que os pais viriam a cometer. Narrando os acontecimentos décadas após eles terem ocorrido, Dell analisa os próprios pais de forma crítica, como se a profunda diferença de personalidade entre eles — o pai, um homem alto, de personalidade expansiva e bem-humorada; a mãe, uma mulher miúda caracterizada pelo ceticismo e pela introversão, dona de um diário que ninguém tinha permissão de ler — fosse um indicativo de que tinham tudo para dar errado como casal. Descobriremos depois que a mãe acabaria convencida pelo pai a participar do assalto, embora ela própria tivesse convicção de que a empreitada tinha tudo para dar errado. A ruína do Sonho Americano pelos olhos do assustadiço Dell Parsons é evidenciada na única visita que ele e a irmã gêmea Berner fazem aos pais na penitenciária — seria a última vez que os veriam. Incapaz de assimilar a ideia de que a vida familiar tal como a conhecia acabava de ruir para sempre, Dell pergunta ao pai encarcerado com desconcertante inocência: “Quando é que eles vão soltar você?” Ninguém o ensinara como é que se vive sem os pais aos quinze anos de idade. Atônitos, ele e a irmã sofrem com as incertezas do obscuro destino que os aguardam. Além disso, há os dilemas próprios da idade, que tornam tudo ainda mais confuso. Não por acaso, depois que o namorado a abandona, Berner se envolve numa rápida relação incestuosa com o irmão. A seguir, ela própria também sai da vida de Dell, “rumo ao seu próprio destino, qualquer que fosse esse”. Na segunda parte do livro, vemos Dell na situação de não querer ficar sob a custódia do Estado. Por isso, ele acaba aceitando a ajuda de uma amiga da família, a senhorita Remlinger, cujo irmão, Arthur, mora no Canadá. O plano é cruzarem a fronteira para que Dell passe uma temporada refugiado no país vizinho, junto com Arthur, de modo a recomeçar a vida. É nessa etapa que acompanhamos o crescimento de Dell Parsons, a maneira com que a vida o forja como homem, na medida em que tem de conviver com pessoas que desconhece (muitas pelas quais não sente nenhum apreço), ou aceitando situações desconfortáveis por não ter alternativas melhores, dependendo de estranhos. Além disso, o espanto do garoto diante das peculiaridades daquela terra que lhe é nova e, por isso mesmo, opressiva — o Canadá —, é o expediente a que Richard Ford recorre para pintar o jovem dentro desta dupla noção de mudança: a geográfica e a da transição à vida adulta. A convivência com Arthur Remlinger, o homem que o acolhe, não será sem consequências, já que este também carrega um passado sombrio envolvendo uma morte, ainda que involuntária. Nesse sentido, a escrita de Ford é fatalista: não importa quão boa é a natureza das pessoas, ou o tamanho de sua inocência, fato é que as hostilidades da vida real sempre vão atingi-las, em maior ou menor grau, cabendo a cada uma a habilidade para saber minimizá-las.

Ficção / Literatura Estrangeira / Romance

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