letresenhas 07/11/2024
Wuthering Heights - Kate Bush
Meu romance que não é romance favorito, sem dúvidas! Esse livro é sempre uma SURPRESA, relendo pela terceira vez, compreendo muito mais a complexidade das relações e a destrutividade da vingança. Esse livro é um estudo fascinante sobre o amor, o ódio e a redenção.
Não consigo falar desse livro sem falar de Hareton Earnshaw? Simplesmente meu personagem favorito, ele foi tão injustiçado. Ele nunca soube que houve alguém que o amou de verdade antes da Catherine e que havia uma família que poderia tê-lo amado muito mais, ele é o personagem mais leal que eu já conheci. E, nesse contexto, o pagamento por pecados herdados é algo que se apresenta quase de forma bíblica já que o antigo testamento é bem claro sobre heranças do pecado e maldições hereditárias , como em Êxodo 20:5, onde está o fato de que os filhos escolherão repetir os pecados de seus pais. Realmente, é genial, falaria sobre isso por horas!
Não é à toa que Hareton é o único personagem além de Catherine que Heathcliff não odeia, em mais de uma passagem ele nos diz o quanto Hareton o lembra de sua amada ao invés de lembrar o seu pior inimigo e como isso faz com que ele queira desistir dos seus planos de vingança e, talvez, seja porque ele sente que está fazendo mal à própria Catherine. É muito complexa a relação dos dois, o que torna Hareton um personagem ainda mais importante e me faz criar um amor muito profundo por ele. Ele que é o único que realmente não se deixou consumir pela vingança e tudo que queria era ser amado, aceito e consumir um pouco de cultura e conhecimento. Único que realmente valorizava as coisas boas da vida mesmo que houvesse muita brutalidade na sua criação e personalidade.
Nisso, a violência de Heathcliff, me lembra muito a obra "Agnus" de Konstantin Korobov (2022), onde um lobo reluta em participar da violência, mas ainda assim, está lá causando mal a ovelha que é inocente e representa a pureza. Essa imagem, pra mim, reflete a dualidade de Heathcliff, que, embora seja capaz de crueldade, também é consumido por uma profunda tristeza e dor. Sua violência foi por muito tempo um escudo para esconder a vulnerabilidade e depois se tornou algo concreto e enraizado de fato até que chegamos a sua ?redenção? e profundidade existencial. Talvez por isso eu não consiga odiá-lo (nunca me farão te odiar, Heathcliff).
Nessa história, até onde existia amor parecia não haver afeto, Heathcliff e Catherine compartilham um amor intenso, acredito que obsessão se encaixe até melhor, mas também são cercados por uma atmosfera de maldade e ressentimento. Catherine é uma personagem complexa, que não pode ser simplesmente odiada ou amada, eu vejo tantas pessoas criticando ela, mas tudo que consigo enxergar é uma menina negligenciada a vida inteira que não tinha afeto de ninguém além de Heathcliff e buscou a segurança de um casamento. Sua personalidade é multifacetada, e a relação com Heathcliff foi marcada por uma intensidade obsessiva.
No entanto, é a impossibilidade de seu amor que torna Catherine odiosa em diversos momentos. Ela sabe que não pode estar com Heathcliff, que se transformou em alguém carcomido pela vingança e pela dor. Taylor Swift escreveu ?I can fix him (no, really, I can)? para ela!?
Por outro lado, a narradora, Nelly Dean, oferece uma visão limitada sobre a relação entre Heathcliff e Catherine. No início, ela parece não entender a profundidade do amor (ou obsessão doentia) entre eles, vendo apenas a maldade e a violência. No entanto, à medida que a história se desenrola, percebemos que Nelly é uma testemunha envolvida, com suas próprias opiniões e preconceitos o que traz algumas dúvidas, mas também instiga o leitor a pescar todos os detalhes possíveis para chegar a uma versão mais sólida.
Além disso, penso que a citação de "Island of Dogs" - "Eu não sou um cachorro violento, eu não sei por que eu mordo" - reflete perfeitamente a vida de Heathcliff. Ele é um homem consumido pela raiva e pela vingança como dito anteriormente, mas também foi apenas um garoto que nunca entendeu de onde vinha sua própria maldade. O racismo explícito e as questões sobre sua origem são as coisas mais fascinantes nesta obra que teve coragem de expor um cenário muito real e que ninguém ousava descrever na época em que foi feita. Na minha visão, a violência era um reflexo da dor e da solidão que sentia para além do simples ódio cultivado e motivado.
Enfim, "Morro dos Ventos Uivantes" é uma obra atemporal que sempre vai ser muito querida para mim, a relação entre Heathcliff e Catherine é algo que vai muito além da simples raiva ou melancolia. Até o cenário reflete o estado mental dos personagens. A narrativa é emocionante e perturbadora e nos faz questionar sobre a natureza do amor e a maldição de gerações anteriores. Nenhum dos personagens da 2ª geração possuíam qualquer culpa na história e todos eles tiveram um destino horrível, a maldição hereditária me faz pensar muito sobre como os nossos antepassados refletem nas dores presentes.