Math 16/06/2012
Amor de Perdição
Uma obra do Romantismo português que pela genialidade de seu criador e do momento, nos instiga, envolve e apaixona.
Além de ser um livro que claramente nos mostra uma linda história de amor também é critico as pessoas, a vida de mentiras, regras desonestas que eram impostas e presentes na época. Desde o inicio do livro Camilo Castelo Branco deixa evidente seu ponto de vista da sociedade portuguesa, da religião, da vida boêmia, da vida burguesa. Dizem histórias que Camilo Castelo Branco tinha uma vida amorosa muito agitada e que sempre esteve envolvido em casos amorosos com pessoas casadas da alta sociedade e um desses casos (o mais duradouro) com uma recém-casada chamada Ana Plácido foi a inspiração do autor para a criação dessa grande obra. Não se pode falar das obras camilianas sem antes falar da vida, sem antes envolver o grande autor que foi Camilo Castelo Branco.
“Amor de Perdição” conta a historia de amor de Simão e Teresa, suas famílias se odiavam por rixas pessoais fazendo de tudo para que eles se separassem. O enredo inicial é destinado para a formação da família dos “Botelho” contando a origem do amor de seus representantes (D. Rita e Domingos Botelho, mãe e pai) e com isso já se mostra o “feio” da sociedade pois D. Rita é libertina e todos os homens tem olhos para ela, e ela não se aflige, pelo contrário, até gosta. Domingos Botelho um homem descrito como feio não tem nenhum atrativo a não ser seus estudos, é corregedor formado tem um patrimônio econômico e uma estrutura social boa. Ao longo da história Domingos e D. Rita têm filhos. O que mais se destaca por sua personalidade é Simão, um menino durão e que anda com más companhias que tem como passatempo se meter em confusões, ninguém se atrevia a desafiá-lo pois sabiam que ele sempre andava armado e não tinha boas condições psicológicas quando era contrariado. D. Rita querendo uma moradia melhor convence seu marido a se mudar para Viseu, e é lá onde acontece o grande marco da historia.
Vizinhos da família Botelho temos a família Albuquerque, rival dos Botelho que tinha como a principal figura Teresa, uma menina doce, pura e meiga mas que lutava sempre pelos seus ideais. Simão então comete um crime na trama e vai para Coimbra, lá também não se da bem com os seus “colegas” estudantes e volta à Viseu onde era sua morada. Num belo dia Teresa e Simão se veem pela janela de seus respectivos quartos e se apaixonam como um amor a primeira vista e continuam a se ver nas ruas de Viseu. Com isso Simão agora não é mais o de antes, mudara completamente seu estilo de valentão e brigão, pois agora amava. Como Tadeu de Albuquerque (pai de Tereza) sempre a observava, viu Simão com Teresa e ameaçou sua filha a coloca-la num convento. Simão vai a Coimbra para se esforçar e estudar para oferecer um bom futuro a Tereza e continua a se comunicar com Teresa através de cartas, todos os episódios de seus vidas eles expressam nas cartas.
Teresa é prometida a se casar com seu primo, Baltasar, apaixonada por Simão o nega, despertando a ira de seu pai que odeia a família Botelho. Simão vai a Viseu e fica na casa do ferrador João da Cruz onde se revela um dos personagens mais ilustres e originais desta obra: Mariana, uma menina bonita, simples e jovem que vive com seu pai no campo e que sempre foi apaixonada por Simão, mas sofre calada, ama calada, e respeita os sentimentos do filho do corregedor, e em minha opinião a grande personagem, a melhor se tratando de amor e respeito, um personagem realmente original que não extrapola seus sentimentos pelo respeito, pela originalidade de seu caráter.
Então Teresa e Simão tentam várias vezes se ver, mas tudo em vão, sempre há um empecilho, alguma coisa ou alguém que atrapalhe, destacando Baltasar que em uma dessas perseguições contra Simão para deixar o caminho livre para seu casamento com Teresa, envia dois de seus criados para matar ou raptar Simão, mas são eles quem morrem.
Lembrando que Teresa estava sofrendo no convento onde seu pai a colocara, e por essa passagem pelo convento de Viseu, Tereza acaba percebendo um clima não muito bom entre as freiras daquele convento, e acaba dizendo em várias passagens que dificilmente conseguia realizar orações, de tão horrendo que eram os sentimentos daquelas personalidades. Camilo faz criticas ao clero, ”disfarçando” sempre, pois a sociedade ainda tinha “medo” (mais como respeito) do clero, mas a sociedade não estava submissa a esse absolutismo religioso, e nessas criticas ele toma essa opinião de que a igreja não era totalmente boa e que boa parte desse sentimento bondoso das freiras, de padres era ruim, era pesado e que estava longe de ser o que a humanidade sempre pensou um lugar para buscar a paz interior.
Agora na trama acontece o que para mim foi a transitoriedade da obra, de um caráter mais esperançoso e amoroso, para um caráter de morte, dor e sofrimento: a morte de Baltasar. Tadeu de Albuquerque decide colocar a filha em outro convento, mas não esperava pela figura de Simão, que já sabia de tudo e aparecera diante de todos. Depois de uma longa discussão, Baltasar vai agredir Simão, mas mal sabia que seu rival tinha uma arma, então quando se livrou das mãos de Baltasar, Simão dispara um tiro e mata o prometido de sua amada. O que nos surpreende neste momento, é a atitude de Simão, ele sem nenhum remorso, medo de ser preso, se entrega e assume o que fez, o típico caráter de um herói romântico.
A história depois de tal acontecimento, vira completamente um sentimento de morte. Nas cartas de Teresa e Simão a partir daí, passam a ser tristes, tentando buscar até o último vestígio de esperança.
Simão primeiramente é condenado a forca e em seguida, seu pai consegue a diminuição da pena, o degredo para a Índia. Neste meio tempo Maria fica louca (com a condenação da forca) mas depois volta ao normal quando sabe que sua pena foi mudada. Então, na cadeia do Porto, continua recebendo cartas de sua amada e sofrendo com ela a todo o momento.
No final, Teresa vê seu amado sendo transportado para a Índia e morre de fraqueza pois a esperança rompeu o seu último laço naquele momento. Simão sabendo disso, adoece e morre de uma febre mortal e Mariana cumpriu seu propósito, fez o que Simão pediu, jogando as cartas no mar e agarrada ao cadáver de Simão se lançou ao mar e morreu afogada.
Personagens bem trabalhados, Mariana me parece o personagem mais original, sofre sem nem ter recebido nenhuma esperança, nenhum “Eu te Amo” e ainda assim não atrapalhar, pelo contrário, até ajudar o romance. Camilo nos dá com essa personagem, um exemplo de amor, de pessoa e de atitude, Mariana é a heroína desta obra, sempre a espreita vista como uma pessoa que só atrapalha e que não devia nem existir só tem intenções nobres, simples sem nenhum tipo de egoísmo, este personagem impressiona não só pela beleza descrita, mas sim pela sua personalidade.
A linguagem é difícil, estranhamos um pouco quando o lemos, pois, além de ser escrito em português de Portugal havia ainda vestígios da linguagem da época, não era uma linguagem totalmente voltada para todo o tipo de público, a sociedade vivia uma euforia enorme, anos de libertação, deslocação da literatura, todos liam neste momento, ler não era mais para os cultos e ricos, mas sim para quem quisesse, como uma forma de entretenimento, então ainda estava tendo esse deslocamento de uma linguagem “culta” para uma linguagem mais popular. Existem termos difíceis mas nada que incomode ou deixe de mostrar a essência do romance
Uma sociedade suja e preconceituosa é marcada neste período, além da história a obra nos mostra isso. Casamentos interesseiros, obrigações forçadas por pessoas de sua própria família, o povo vivia sempre com medo dele mesmo, qualquer ato por menor que seja podia deixar sua família “na lama”, por isso as “precauções” tomadas. Mas porque precauções tão tolas? Camilo deixa sua revolta mas bem escondida. Alguns o retratam como autor que dá aí alguns ideais realistas pela sua critica, mas sem dúvidas foi um autor ultrarromântico não só pela sua obra, pelo seu acervo, mas pela sua vida agitada sempre envolvida pelo amor.
Mas sem dúvidas que o tema central do poema é o amor idealizado, um amor puro, verdadeiro e eterno, que consegue ser levado além dos laços da morte. Um sentimento que nos leva a uma paz, a um lugar distinto que ninguém conhece, isso é o amor, sem explicação, sem definição, o amor no seu lado mais íntimo, espiritualizado, isso é a obra “Amor de Perdição” que além de ter um final triste e surpreendente nos mostra tudo o que alguém é capaz a fazer por amor.
Camilo não restringe a obra só ao amor, ele consegue nos envolver em suas criticas e seu enredo empolgante. Ele consegue fazer com que nós vivamos esta obra, o enredo é muito bem encaixado, alternando momentos tristes a momentos alegres em todo o momento. Mortes, confusões, criticas, suspense, amor carnal e espiritual, realmente é surpreendente como Camilo Castelo Branco abrangeu tanto esta obra sendo merecidamente lembrado como queria, como o grande autor que foi.
Este é um clássico da língua portuguesa, mas não é monótono e nos mostra várias atitudes dos seres humanos em sua essência, o feio e o bonito, o amor e o ódio, o interesse e o verdadeiro. O livro tem a força de nos deslocar além das décadas, dos séculos e nos fazer viver toda a história vibrando a cada momento e acontecimento, derrubando o mito de que clássicos são histórias chatas e velhas, muito pelo contrário, pois este romance não se destacou e eternizou ao longo de dois séculos por nada não acha? Retrata muito bem o desenvolvimento da sociedade que temos hoje. Então leia, se divirta e talvez até se emocione com “Amor de Perdição”.