Naiana 01/04/2022
Transporte para a Primeira Guerra Mundial
Acho que a primeira impressão que tive ao ler Rilla de Ingleside é que ele é completamente diferente de todos os outros da série, os demais são muito mais leves, Anne teve uma vida boa, após ser adotada pelos Cuthbert, e sua estória, contada ao longo dos 7 volumes anteriores, em geral foi divertida e leve, om algumas perdas, mas no geral tranquila. Rilla vem para nos destruir completamente com a Primeira Guerra Mundial sendo o pano de fundo da sua estória, não é fácil ler pelo que a família de Anne passou nos quatro anos de guerra, e o choro é companhia constante, assim como a Rilla, o riso as vezes vem no decorrer da leitura, mas a angustia e o sofrimentos é constante.
Rilla de Ingeside foi publicado em 1921, poucos anos após o fim da Guerra que ele retrata como pano de fundo, enriquecido com muitos fatos históricos vividos pelo Canadá e pelo mundo, ele nos mostra como a guerra afetou às famílias canadenses, como era o cotidiano daqueles que ficaram em casa enquanto seus filhos, maridos, pais e irmãos foram à guerra, como às mulheres tiveram que se adaptar e muitas vezes assumir funções que antes não lhes era permitidas para que o país não parasse. Outro aspecto que ele nos trás é como o fantasma da guerra, iniciado em Vale do Arco-Íris com as "conspirações" da Ellen West sobre as aspirações da Alemanha, eram tão sem importância para todos no povoado de Glen St. Mary e como a concretização da guerra tornou tantas pessoas comuns e mais preocupadas com as fofocas dos vizinhos em "verdadeiros geógrafos e especialistas em táticas militares". A vida de todos fora transformada drasticamente, e o quatro anos de guerra vividos como em pesadelos, ansiedades e medos. A tensão construída por Lucy não é inventada e podemos senti-la porque ela sentiu o que escreveu, afinal ela viveu esse período, apesar de Rilla ser ficção, a guerra não foi e ela constituí boa parte da trama e por isso nos traz tantas dores ao lê-la, eu chorei muito, choro de soluço, choro livre, chorei por medo de que a história se repita, afinal ao final da Primeira Guerra se acreditava que não haveria uma Segunda, e houve, e mesmo tendo se passado tantos anos, uma Terceira não é algo impossível de acontecer, e as vezes nos assombra muito o quanto ela pode estar próxima.
Em Rilla de Ingleside a estória acompanha principalmente a vida de Rilla, caçula de Anne, mocinha que sempre fora vaidosa e frívola em muitos momentos. Rilla está prestes a completar 15 anos e espera ter uma adolescência esplêndida, cheia de romances e diversão, não pretende dar continuidade aos estudos e se auto intitula a burrinha da família. E tudo parece caminhar nesse sentido até que se inicia a guerra, que até então parecia ser tão distante e não afetar o Canadá, toda a sua vida muda e Rilla se vê obrigada a encarar a vida de outra forma. Com a partida de Jem e Jerry Meredith para a guerra, Rilla quer ajudar a família e se sentir tão corajosa quanto o irmão, e assim acaba adotando um bebê de guerra e amadurecendo de forma surpreendente e sem perceber.
Anne de Green Gables é o meu favorito livro sobre Anne, mas Rilla de Ingleside se tornou um dos meus livros favoritos, a forma como a Lucy mostra a guerra me marcou bastante, e acompanhar o amadurecimento de Rilla é algo indescritível, assim como o envelhecimento de Anne e seus filhos durante a guerra. As perdas são irreparáveis, mas não são surpresas, pois a Lucy já havia dado pistas do que pretendia fazer em Anne de Ingleside e Vale do Arco-Íris, mesmo assim não deixaram de ser dolorosas demais.