Matheus Felipe 07/09/2019
A bolsa de (c)ouro.
"A bolsa amarela", de Lygia Bojunga, é como um portal que nos leva de volta à infância. Conta a história da Raquel, que tem 3 vontades (ser gente grande, ser garoto e ser escritora), mas que precisa escondê-las, por ser criança e menina. Ao ganhar uma bolsa amarela de sua tia rica, decide, então, guardar as suas vontades (que já estão grandes e pesadas) juntamente com outros pertences - uns desenhos, um alfinete, alguns nomes que coleciona. Incrivelmente, mesmo com tantos pesos, ela consegue esconder tudo, exceto sua vontade de escrever, que tanto engordava devido à sua fértil imaginação. Aliás, graças a essa criatividade, surgem personagens tão memoráveis como o Galo Rei, o Terrível e a Guarda-Chuva (feminino mesmo).
A obra traz uma característica inerente ao ser humano: todos nós já experimentamos ser criança. Talvez por isso que em diversas passagens tenhamos a nostálgica sensação de ler a nós mesmos. Isso porque ao passo que Raquel deseja envelhecer, nós desejamos rejuvenescer, e voltar àquele tempo no qual nosso único fardo era o peso de nossas vontades. A boa notícia é que podemos. Ao longo da leitura, Raquel nos ensina que qualquer menina pode agir como garoto, e qualquer adulto pode agir como criança. Diante disso, é interessante indagar: a criança dentro de você ainda está viva?
Ademais, aos amantes de metáforas, este livro é perfeito: critica, metaforicamente, os padrões sociais, a censura e a manipulação de pensamentos devido à ditadura militar vigente na época. Temas tão complexos para gente grande, mas que são explorados de maneira sutil e, portanto, não foge ao seu público infantojuvenil. A leitura é leve, objetiva, e nos leva pela mão rapidamente até as últimas páginas, ora pela curiosidade do destino das vontades da Raquel, ora pelas saborosas histórias dos personagens. Com efeito, as 135 páginas tornam-se 10, e se desenha em nossas mentes o porquê que a bolsa e o livro são amarelos: porque são tesouros, como ouro!