spoiler visualizarLarissa.Carvalho 01/07/2021
Laranja Mecânica - Anthony Burgess
Narrado em primeira pessoa, "Laranja Mecânica" é um livro tão envolvente quanto o seu próprio Humilde Narrador e personagem principal, o adolescente e delinquente Alex. Recheado de violência, o livro é um retrato visceral de uma sociedade distópica em que uma juventude cruel aterroriza as ruas ao anoitecer.
O vocabulário de Alex é saturado de gírias nadsat, um dialeto criado pelo autor misturando o inglês e o russo. A genialidade de Burgess em criar essa linguagem própria para a juventude fica evidente em tempos em que os millenials tornaram-se "cringe" de um dia para o outro. As tensões geracionais, aliás, permeiam todo o romance; o retrato parece ser de uma contínua dominação das novas gerações em relação a seus antecessores a partir do uso de uma violência aparentemente gratuita, amparada em um sentimento de superioridade.
A violência do livro, porém, não é somente individual, nem unilateral. Gerações mais antigas parecem responder à brutalidade dos jovens com uma crueldade institucional que demonstra a total incapacidade desta sociedade em lidar com os "desajustados". As agressões diversas - físicas e psicológicas - vividas por Alex, são prova de que, para a justiça, sua reabilitação à sociedade não é nem de longe tão importante quanto a sua punição.
O uso da "técnica de Ludovico" para o suposto tratamento de Alex é o ápice de seu apagamento como indivíduo, já que consuma a retirada de seu livre-arbítrio, já ensaiada na prisão. A partir dela, retira-se dele não apenas aquilo que há de ruim - os seus atos violentos -, mas também tudo o que ele possui de bom, como sua paixão pela música. Isso tudo sem fazer com que ele desenvolva empatia ou respeito pelas pessoas que o circundam, a fonte primeira de sua indignação e brutalidade, o que torna moralmente questionável a validade de sua bondade forçada.
Apesar de ter sido criado a partir da extrapolação de um contexto bastante específico, Laranja Mecânica é um livro universal. Questões como o punitivismo da sociedade, a moralidade da justiça e, claro, os embates geracionais, continuam a existir e, provavelmente, assim continuarão sempre. Isso garante não só a contemporaneidade, mas a relevância de distopias deste tipo.