Julia 20/09/2021
dolorsamente realista.
esses dias eu estava pensando em como estava com saudade de ler um livro e dar 5 estrelas para ele e, surpresa, aconteceu com esse. eu não poderia estar mais satisfeita.
é um livro rápido, com uma escrita que flui tão bem que, quando você percebe, já terminou e quer ler mais livros da autora.
a ambientação, a cidade São Paulo, não deixa a desejar. a autora traz perfeitamente seus detalhes, como os bares quentes, mas divertidos; as ruas sempre com as luzes acesas; os metrôs sempre lotados; e o melhor: o fato de que ali tudo é possível. infelizmente, isso também é um ponto ruim do lugar.
na história conhecemos elisa, uma ruiva de gênio forte e incrível, com frases prontas na ponta da língua e brilhantes olhos que parecem ler tudo que as pessoas pensam. no entanto, apesar de todo o poder financeiro e arrogância que ela esbanja, a garota não passa de uma pessoa inocente e sensível - e ela sabe disso. elisa é apenas uma garota quebrada, que pagou caro demais por nunca ter tido a chance de saber o que o amor é e até que ponto ele está ou não presente. foi vista por silas como uma pessoa fácil de manipular, desde o início, com essas mesmas palavras.
ah, o silas... a escrita da autora é tão boa que no início, mesmo o livro deixando claro o que ele havia feito com elisa, eu tinha que por vezes parar, respirar e me lembrar de que se tratava de um relacionamento abusivo. o por quê? bem, a escrita da autora é mesmo boa. ela não só lidou perfeitamente bem ao escrever um relacionamento abusivo, como também criou e moldou seus estágios assim como a vítima os vê ou sente (e isso é surreal, uma vez que o livro é contado em terceira pessoa).
no início, era um toque sutil, um aperto leve no braço, um puxão para tirar a garota do lugar. você não sabe se é porque o silas está aflito ou só porque ele é um bosta mesmo, assim como acontece com as vítimas. eu fui uma vítima. no início, a gente sempre tenta se convencer de que é coisa da nossa cabeça. e então, quando eu já estava brava comigo por quase romantizar aquela relação - quando ele era fofo com ela e parecia que tudo ia dar certo se os dois ficassem juntos -, passamos para o estágio em que tudo fica mais evidente: os puxões leves passaram a surtos. silas começou a bater nas pessoas. elisa passou a ter medo dele. e as cenas humilhantes vieram...
não vou me demorar muito nisso, mas a autora me tocou de uma forma que me fez chorar, algo que não acontece com muitos livros. ela não só aborda com excelência o relacionamento abusivo, como também a negligência familiar e a mãe narcizista. eu tenho, e me senti tocada com determinados trechos ali inseridos. por um momento, me senti acolhida e, por mais que aqueles trechos com quais eu me identifiquei deixassem claro a péssima situação que é ter uma mãe assim, eu me senti feliz. alguém entende que não é drama, alguém entende que isso existe e está tudo bem.
"era como se ela quisesse proteger elisa de tudo, inclusive do que a fazia feliz. era como se estivesse disposta a destruí-la só para depois juntar os pedaços e dizer que havia, de alguma forma, a consertado."