Ana Paula 08/06/2021
Ouroboros
Quem me conhece sabe como eu amo uma saga de família, e o que este livro entrega é muito além disso. Acompanhamos os Terra, os Cambará e a interseção entre eles, os Terra-Cambará, durante várias gerações. Porém, não só isso. Acompanhamos a história de uma região, de um país, o nosso. De forma brilhante, Érico Veríssimo traz a macro-política para o dia a dia de um povo, de uma família, de um ser humano. O sangue derramado que banha a história brasileira, o sofrimento de uma nação, adquirem rosto, nome e sobrenome nesta obra. A individualidade da própria vida de uma pessoa é mesclada com a coletividade, da qual estamos indissociados. É um trabalho épico, como a história contada.
O narrador me surpreendeu muito positivamente. Senti que ele, como um cinegrafista dos bons, consegue guiar o espectador-leitor mudando a câmera de foco, de cena, de perspectiva. A vantagem desse cinegrafista literário é que ele consegue adentrar na mente e coração de quem filma. Assim, no meio dos acontecimentos nos deparamos com os próprios pensamentos dos personagens, artifício usado para construir personagens duramente reais. Goste ou não goste de este ou aquele protagonista, é inegável como todos parecem ser pessoas de verdade, que realmente existiram.
Este é apenas o primeiro dos 7 volumes que compõem a famosa saga “O tempo e o vento” e ele já entrega tanto! Entregou amor, recomeço, sofrimento, guerra, vingança e aquele gostinho amargo da inevitabilidade do destino e da dureza da vida.
Fiz esta leitura em conjunto com minhas primas e amei poder compartilhar com elas nossas impressões sobre acontecimentos e personagens. Leitura não precisa ser um ato apenas individual, o diálogo e o debate enriquecem a experiência, ainda mais de uma obra tão farta como esta.
Ouroboros é o símbolo da serpente que morde a própria cauda, dentre os muitos significados atribuídos, está o eterno retorno e o movimento cíclico da morte e reconstrução. Nesta obra o que mais me encantou foi ver esse eterno retorno, entre as gerações, e o movimento cíclico da história do Brasil.
“[...] Só o silêncio do casarão, o vento nas vidraças e o tempo passando…
Bem dizia a minha avó - resmunga d.Bibiana, cerrando os olhos. - Noite de vento, noite dos mortos.”