spoiler visualizarGio_vit2 24/02/2023
Simbolismos e Metáforas
O livro por si só é interessante, profundo, trata de temas que nos deixam desconfortáveis com nós mesmos. Se fosse eu nessa mesma situação, me tornaria também uma assassina selvagem? Capaz de qualquer coisa, me moldar a qualquer ambiente e me submeter a qualquer liderança, por mais irracional que pareça em um primeiro momento, apenas para sobreviver?
Li e tratei o livro, durante cada página, como uma reflexão. Não apenas uma reflexão sobre a humanidade e sua essência caótica, mas uma reflexão sobre a minha própria natureza. Afinal, nascemos ou nos tornamos cruéis, assassinos, selvagens?
A vilania é irremediável? Ralph teria sucumbido caso tivesse um pouco mais de tempo? Ele poderia ter sido um Jack caso a narrativa se desenvolvesse de modo diferente?
Porém, apesar de todas essas perguntas, o que mais me chamou atenção foi o significado por trás dos objetos que permeiam toda a narrativa: a fogueira funcionou como metáfora para a esperança, é preciso mantê-la acesa, é o único jeito de não se deixar levar totalmente pelo caos e pela guerra. A esperança de haver alg umuma luz no fim do túnel, uma salvação, por mais difícil que as circunstâncias se mostrem, por mais bobo que seja confiar em algo que não se tem certeza, totalmente distante da realidade. Apesar da irracionalidade da esperança, foi ela, a fogueira, que manteve Ralph à borda, porém não totalmente entregue ao abismo. Tanto que, ao se apagar pela primeira vez, foi quando tudo começou a dar errado para o líder dos meninos.
A concha, uma metáfora para a civilização. Esperar a vez do outro falar, levantar a mão gentilmente, não precisar berrar para que todos escutem, parar para ouvir o colega, um de cada vez; essas são regras muito simples que aprendemos desde crianças na escola, são essas pequenas regras que mantêm o mundo em ordem. Ao renegar a concha, Jack renega a civilização, renega a humanidade, pois são elas, as regras, que nos diferenciam dos animais irracionais, elas nos fazem humanos. Ao abrir mão disso, Jack se tornou um selvagem e ditador frio. Assim, o que acontece quando você deixa de seguir uma simples convenção social? Várias também perdem seu sentido, uma atrás da outra. Aqui, as regras foram se desfazendo, os levando ao fim de tudo.
Os óculos, uma metáfora para a inteligência, diretamente ligados ao personagem Porquinho, afinal, o que seria de Ralph sem Porquinho desde o início da história? É o garoto que sofre bullying um dos maiores responsáveis pelo sucesso dos garotos. É ele o detentor da racionalidade, quem ajuda a dissipar a cortina de fumaça que se ergue na mente do líder, quem o ajuda a se lembrar do que é mais importante. Se quebra em determinado momento, pois é quando os meninos começam a parar de dar ouvidos à razão e se rendem à violência.
O monstro. Real ou imaginário? Um perigo iminente ou apenas mais uma forma de controle? Pois, aprendemos através de 1984 que guerra é paz, e é o medo o que nos leva à guerra. Uma frase interessante de Porquinho: " Acho que Jack tem razão quando diz que a gente pode estar com medo porque as pessoas sempre dão um jeito de sentir medo."
O monstro é isso: o medo, o medo de nunca ser resgatado daquele inferno, o medo do horror e do desconhecido, o medo dos próprios companheiros, o medo que leva ao apagamento da enorme fogueira, da única esperança. O medo os distanciou dos próprios objetivos, os desuniu e os tornou assassinos alienados. Deu a alguém despreparado o controle sobre uma grande civilização, foi o medo que tornou forte alguém que, na verdade, era fraco. Com o medo vem o caos, e é do caos que nasce a guerra.
Livro surpreendente, valeu a pena.