Noemia 08/08/2022
Lasciate ogni speranza, voi ch'entrate!
Comecei A Divina Comédia por entender a obra como referência para várias outras que gosto, sentindo há muito a necessidade de lê-la para compreendê-las melhor. De modo geral, todo grande clássico tem sua importância ao menos por esse motivo.
Nessa primeira parte, fui surpreendida. Achei a leitura muito menos difícil do que imaginava, apesar de também não poder considerá-la fácil, haja vista a vasta referência à pessoas e fatos ocorridos no séc. XIV. Li em um momento de pouco tempo livre, no ritmo de apenas um canto por dia, e foi muito tranquilo. Outra grata surpresa foi me apaixonar pela relação entre Dante e o poeta Virgílio, seu mestre e guia pelos círculos do inferno. Este, incumbido da missão de conduzir o protagonista, não apenas o aponta o caminho, como também o protege, aconselha e instrui, mesmo ele próprio ignorando detalhes de alguns círculos ou se enganando em algum momento.
Ainda que a seguinte interpretação seja provavelmente distante da intenção do autor (o que nunca poderemos ter certeza, e talvez nem seja tão importante saber), essa relação me lembrou muito a dos leitores com seus autores preferidos. Dante reverencia Virgílio, antes de mais nada, por sua obra, por isso o segue e nele confia plenamente. O autor da Eneida, por sua vez, apenas cumpre o papel que lhe foi dado de conduzir outro ser por um caminho de aprendizado, sem que este necessariamente o vivencie (lembrando, Dante é o único personagem vivo, portanto, está conhecendo o mundo dos mortos antes da hora), munido apenas de sua própria experiência e sapiência, que não são absolutas, tal como fazem os escritores com seus leitores.
Chama também a atenção as frequentes referências de Dante às limitações da linguagem, nos lembrando sempre que por mais belos e perfeitos (adjetivos meus) que sejam aqueles versos, a realidade horrível do inferno não pode ser completamente descrita na intensidade vivenciada.
Não dei cinco estrelas, mas admito que foi menos pela obra em si e mais por uma incapacidade minha em absorver todas as referências. Vale uma releitura depois de estudar mais, com certeza!
OBS: acredito que a edição da Editora 34 seja a única bilíngue disponível atualmente no Brasil. Para quem entende algo de italiano, recomendo muito!