Luciano Ventura 23/03/2020
ESTUDO DA OBRA
Capítulo I: A BURGUESIA INDUSTRIAL E A REVOLUÇÃO DE 1930
"Teorias Dualistas"
Ponto de vista da Historiografia até 1970
• Defendia que em 1930 acontecera um embate entre a tradicional Aristocracia Cafeeira herdeira de um sistema agrário de caráter semifeudal e uma nova Elite Burguesa Industrial, representante do capitalismo moderno que rompia pós Primeira Guerra Mundial.
Ponto de vista de Boris Fausto (1969)
Nega um caráter de oposição fundamental entre estes dois setores da elite social: latifundiário agrícola e o burguês industrial. (p. 12-8)
Afirma ainda que o setor industrial era desprovido de força de coesão para desbancar a elite agrária de forma revolucionária. Explica que esta mesma indústria era extremamente dependente do setor primário exportador e enumera três motivos principais: a insignificância dos ramos básicos industriais; a baixa capitalização das indústrias; e o grau incipiente de concentração das mesmas. (p. 19)
Boris afirma também que se retirarmos os pequenos burgueses, o real número de indivíduos que se encaixavam na qualificação de burguesia industrial era pequeno, apesar destes possuírem influência política. (p. 23)
Reafirma a força da atividade primária atribuindo a esta uma dependência da população brasileira da ordem de 65%, mesmo dez anos depois do episódio dito revolucionário. (p. 22)
"O Partido Democrático de São Paulo e a Indústria"
Ponto de vista da Historiografia até 1970
• O Partido Democrático teria surgido como representação política de setores novos, supostamente dinâmicos, onde estariam incluídos os industriais, ao lado de grupos financeiros e das classes médias.
Ponto de vista de Boris Fausto (1969)
O autor caracteriza o PD como sendo coerente e antiindustrialista. Para justificar tal afirmativa, utiliza-se do artigo redigido pelo democrático Mário Pinto Serva que criticava o discurso pró-industrialização proferido por Roberto Simonsen. (p. 33)
Enfatiza, também, a estreita e permanente aliança existente entre o Partido Republicano Paulista - tradicional defensor dos interesses cafeeiros - e a burguesia industrial. Para corroborar tal análise, Boris relembra o encontro entre os políticos do PRP, Manoel Villaboim e Arnolfo de Azevedo, e os empresários do setor têxtil, Francisco Matarazzo, Rodolfo Crespi, e Jorge Street, onde fora debatida a necessidade de sobre taxar a entrada dos tecidos ingleses no Brasil e de evitar a importação do maquinário que permitiria o aumento da concorrência. (p. 34)
Cita a posição contrária do Partido Democrático a tais medidas, que acabaram sendo aprovadas, reclamando, antes, por investimentos no setor agrícola, como reforçadora da impossibilidade da dita união entre a burguesia industrial e os democráticos. (p. 34-5)
Para ratificar que a empatia entre o setor industrial e o PRP existia há certo tempo, Fausto relembra que, nos anos 20, fora este setor quem mais levantou fundos políticos para os republicanos paulistas, até mais do que a própria Sociedade Brasileira Rural. Com este mesmo intuito, cita ainda a figura de Lacerda Franco, dono de várias indústrias paulistas e porta voz de sua classe dentro do PRP. (p. 35)
Como forma de reforçar o antagonismo entre PD e industriais, desmanchando assim a errônea impressão, o autor lembra do desdém proveniente do democrático Fonseca Telles, Secretário de Viação e Obras de 1932, ao caracterizar, pejorativamente, os donos de indústrias como hábeis comerciantes ou, então, como capitalistas desejosos de experimentar um novo emprego aos seus capitais. (p. 36)
Mais um fato que afastava os democrático-liberais e os industriais era o xenofobismo inerente aos primeiros. Para dar consistência a esta idéia, o Boris Fausto nos lembra de alguns fatos como as ofensas de Zoroastro Gouveia aos estrangeiros que integravam o PRP (1928); o texto do jornalista do Diário Nacional que, ao relatar o incidente, afirma que São Paulo estava se desnacionalizando; o discurso de Aureliano Leite que, recém eleito para o governo de 1930, pauta, ironicamente, que São Paulo não valia mais do que Minas Gerais, pelo elemento estrangeiro que habitava seu interior. (p. 36-7)
Fausto afirma ainda, contrariamente ao que se tinha como verdade, que o P.D. não possuía uma tendência à modernização via indústria; tanto que, a classe média paulista e o setor agrário descontente, ambos integrantes do P.D., eram simpatizantes a uma sociedade brasileira agrária, na qual os industriais eram, por alguns motivos, apontados pejorativamente. (p. 38)
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"As cisões gaúcha e mineira"
Ponto de Vista da Historiografia Tradicional até 1970
•Ao associarem a burguesia industrial à Revolução de 1930, os historiadores estariam atribuindo aos protagonistas do fato, Aliança Liberal (principalmente gaúchos e mineiros), uma convergência ao interesse industrial.
Ponto de Vista de Boris Fausto (1969)
O autor vem dizer que não existia como gaúchos e mineiros estarem interessados em promover interesses industriais, para edificar tal idéia, Fausto afirma que a força maior burguesia industrial residia em São Paulo, e analisa as forças políticas existentes em Minas e no Rio Grande, chegando a conclusão que o poder que estas detinham emanavam do setor agrícola, sendo contraditório, então, atribuir-lhes qualquer ímpeto industrialista.
Quanto aos gaúchos
Descontentes com o governo Washington Luiz, os partidos (Partido Libertador e Partido Republicano Riograndense) que compunham a política gaúcha, à época, uniram-se para a ele se oporem, formando a Frente Única Gaúcha. Ao olhar para dentro desta Frente, o autor identifica experientes políticos advindos do setor agrário e uma nova geração que compunha uma equipe não de ruptura mas de substituição e manutenção dos interesses vigentes. (p. 39)
Ao analisar alguns líderes da política gaúcha, Fausto demonstra que estes protagonistas de 1930 possuem um discurso antiindustrialista, quando não eram hostis aos apelos de industriais mostravam-se indiferentes, apesar do Estado ocupar a terceira posição se levarmos em conta a industrialização nacional no período. (p.39-40)
Enumerando algumas falas destes políticos, o autor pretende provar o antiindustrialismo gaúcho:
Lindolfo Collor, em seus pronunciamentos, utilizava-se de argumentos análogos aos utilizados pelos jornais porta-vozes da ideologia antiindustrialista, demonstrando, assim, uma não simpatia pela burguesia industrial. (p. 40)
Plínio Casado, do Partido Libertador, foi signatário de um projeto (set. 1928) pelo qual, entre outras mudanças, o produto nacional só seria considerado igual ao importado se alcançasse algumas características. O projeto era contrário ao interesse desenvolvimentista da indústria e, desta forma, podemos apontar como antiindustriais os seus defensores. (p. 41)
Batista Luzardo, membro da executiva da Aliança Liberal, coloca-se contrário ao projeto de aumento de tarifação ao produto têxtil importado e, em discurso no Congresso Nacional (27 - 12 - 1928) acusa os industrias de formarem um "grupo de pressão perigoso e corruptor, que manipulava operários para alcançar seus objetivos particulares". (p. 41)
Oswaldo Aranha, Ministro da Fazenda de Getúlio Vargas, divulga na imprensa (1931) seu posicionamento contrário à intervenção do governo na vida comercial favoravelmente às indústrias. (p. 41)
João Neves Fontoura, líder da bancada da Aliança Liberal, discursando na Câmara Federal (nov. 1929), dentro da crise do setor agrário-exportador, não clama por uma solução pautada na industrialização, mas, sim, ataca a política cafeeira que se expressava nas "operações valorizadoras".
Podemos então, como sugere o autor, concluir que os jovens políticos do Rio Grande do sul que protagonizaram o golpe de 1930 pertenciam à oligarquia agrária e, se criticavam o governo de Washington Luiz, no tocante à política econômica, não o faziam por serem a favor da industrialização, mas, sim, por serem contrários à concessão de benefícios aos produtores de café; política esta expressa nas "Operações Valorizadoras", e que, segundo seus críticos, prejudicavam as outras culturas agrícolas como o algodão e o açúcar. (p. 38-42)
Quanto aos mineiros
O autor diz que, assim como os gaúchos, os políticos representantes de Minas Gerais não eram favoráveis aos interesses industriais. Para corroborar sua conclusão, Boris analisa a sociedade mineira da época, dizendo que esta se organizava em torno da grande propriedade rural e nas relações que dela afloram, identifica uma elite política caracterizando-a por oligárquica, agrária, poderosa e quase impenetrável, apesar de considerar o núcleo industrial existente em Juiz de Fora. (p. 42-3)
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"A Ideologia da Aliança Liberal"
sobre plataformas de campanha
Persistindo no intuito de desindexar os interesses industriais da Revolução de 1930 o autor, investigando os discursos de campanha dos concorrentes à presidência, percebe que, não obstante Júlio Prestes aludir positivamente ao mundo rural e dos aliancistas haver efetuado algumas promessas à classe operária, não havia em suas plataformas políticas medidas efetivamente benéficas à industrialização, como: regulamentação cambial favorável; incentivos fiscais nem investimentos estatais nas indústrias de base; nem eram partidários do protecionismo à atividade fabril nacional, caracterizando-o como encarecedor do custo de vida (p. 44-5)
sobre motivos para união da burguesia industrial à Aliança Liberal
Disputas entre os setores agrário e industrial existiam, sendo falso afirmar uma inteira convergência de interesses, porém, se as "Operações Valorizadoras" acabavam por beneficiarem à indústria, elas também restringiam-na à medida que dificultavam as importações de produtos imprescindíveis á manutenção do setor secundário. (p. 45)
Mais um argumento que vai de encontro à convergência de interesses dos dois setores é o fato de que a ascensão inicial maior da indústria nacional é percebida no momento auge da produção cafeeira; o motivo seria o investimento na industria por parte daquela fração de classe oligárquica que, então providos de recursos, diversificavam seus investimentos. Tendo tal fato em vista, torna-se ilógico atribuir à burguesia industrial razões ou condições para ir contra a estrutura política vigente no país à época. (p. 46)
Mesmo porque, a indústria que surge não tem preocupações modernizadoras, não objetivava a ampliação do mercado ou a produção em massa; não há porque a burguesia industrial, desprovida de um projeto nacional de desenvolvimento, ligar-se a um agrupamento político de oposição. (p. 46-7)
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"O Estado como Representante da Burguesia Industrial"
Hipóteses
• Os quadros políticos que assumiram o poder após 1930 formularam um programa de desenvolvimento em benefício da fração de classe sob o impacto da crise mundial? (p. 48)
• O desenvolvimento da indústria alcançado no mesmo período teria ocorrido devido a uma ação intencional do Estado ou sido fruto de uma conjuntura favorável para tanto? (p. 48)
• O episódio de 1930 pode ser caracterizado como uma "Revolução do Alto", onde o Estado substituiria à burguesia mas agiria em seu interesse? (p. 48)
Ponto de vista da Historiografia até 1970
• A Revolução de 1930 fora um movimento que teria conduzido a burguesia industrial à dominação política.
Ponto de Vista de Boris Fausto (1969)
• Mesmo existindo conexões entre o episódio revolucionário e o processo de industrialização, a Revolução de 1930 não foi um movimento que levou a burguesia industrial ao poder. (p.50)
• Citando a fala de Celso Furtado - onde o desenvolvimento industrial ocorrido naquela época teria sido fruto da mescla da ação do Estado e de um momento favorável à produção daquilo que se tornara difícil de importar - (p. 48), Fausto afirma que, algumas medidas esparsas não devem ser confundidas com um plano desenvolvimentista de modificação estrutural da economia. Ele enumera algumas das tais medidas (p. 49-50):
Elementos do setor burguês industrial obtiveram postos de relativa importância no governo Vargas: Guilherme da Silveira (presidente do Banco do Brasil) e Jorge Street (diretor da Divisão Industrial do Ministério do Trabalho), por exemplos.
A indústria extrativa e a agro-indústria receberam incentivos econômicos que objetivavam restringir as importações, alcançando, assim, um equilíbrio financeiro.
Em fevereiro de 1931, obrigou-se a adição de álcool à gasolina importada.
Em junho de 1931, toda a produção nacional de carvão seria comprada pela E.F.Central do Brasil e pelo Lloyd Brasileiro.
Até 1937, entrara em prática a lei que obrigava todo importador a comprar de fornecedores nacionais 20% do produto que desejava importar.
Obrigou-se a mistura de xisto betuminoso ao carvão como forma de diminuir a importação do mesmo.
Sucatas de ferro tiveram as suas exportações proibidas.
Expansão das fábricas de cimento através de incentivos ligados à capacidade de produção.
Redução das importações de maquinarias com o intuito de frear a concorrência às indústrias já instaladas no país.
• Em contrapartida, Fausto enxerga na política do governo indícios de que não se tratava de um plano previamente concebido e sim, como já fora deixado claro, de medidas esporádicas. Para comprovar tal pensamento, ele cita alguns fatores:
Representantes dos industriais criticaram Osvaldo Aranha pela diminuição das tarifas à importação de produtos aqui já fabricados em troca da ampliação da venda do café no mercado norte-americano. (p. 48)
Lembra também que, ao suspender o pagamento da dívida externa (1934) o governo melhorou sua situação financeira, mas, mesmo em situação favorável, não pôs em prática um plano de prioridades para importação que pudesse estimular o desenvolvimento econômico do setor industrial, praticando, ao invés disto, o livre intercâmbio. (p. 49)
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Capítulo II: A REVOLUÇÃO DE 1930 E AS CLASSES MÉDIAS
Ponto de Vista da Historiografia Tradicional até 1970
• Virgínio Santa Rosa entendeu o Tenentismo como sendo o choque entre a "pequena burguesia" e a "burguesia nacional". Baseando-se no fator "agregado estatístico", Rosa classifica como pequeno burguês aos: funcionários; comerciários; proletariado urbano e rural, excluindo o campesinato por considerá-lo massa de manobra oligárquica. Desta forma, em 1930, estas classes médias urbanas uniram-se a uma fração oligárquica dissidente para derrubarem do poder a velha oligarquia. (p. 51)
• Guerreiro Ramos associa a Revolução de 30 à ascensão dos primeiros governos militares da República Velha; à campanha civilista de 1910; aos surtos militares de 1922 e 1924; e à Coluna Prestes. Teriam então, tais acontecimentos, o elemento burguês e sua tentativa de alcançar o poder como o elo de ligação que culminaria no episódio revolucionário em questão. (p. 52)
• Hélio Jaguaribe também entende a Revolução de 1930 como um movimento limitado à classe média que, de posse do poder, teria perdido o momento favorável para efetuar transformações nas estruturas sócio-econômicas, desviando, assim, o Estado da tarefa de promover a industrialização. (p. 52)
• O argentino José Nun, analisando o caso brasileiro, também deixa claro a associação das classes médias com a Revolução de 30, atribuindo a estas a classificação de "classes-sujeito" da História. Contudo, Num também afirma que esta classe não possuía meios de se manter no poder e, desta forma, teria associado-se ao elemento militar, sendo, este, o "extrato de proteção" do novo governo. (p. 53)
Ponto de Vista de Boris Fausto (1969)
• Primeiramente Boris esclarece que ao utilizar-se da expressão "classes médias", estará fazendo menção às "classes médias urbanas", porque, para ele, não existe um comportamento político significativo por parte da correspondente classe habitante do campo. (p. 53)
• Diz também o autor não poder identificar as "classes médias" por outro fator que não sejam as "formas específicas de comportamento político" - considerando, então, errados os pressupostos de Rosa (padrão de vida semelhante) e Ramos (níveis de especialização ou conhecimento) para a identificação de classes. Dentro deste pensamento, Fausto não vê possibilidades de diferenciação entre "classes médias" e "pequena burguesia"; ele apenas exclui os militares. (p. 54-5)
• Classe média então seria a população civil urbana, autônoma ou assalariada em serviços não manuais: pequenos empresários; comerciantes; funcionários públicos; empregados no comércio; e profissionais liberais. A maior concentração desta classe social achava-se, à época, nos estados do Rio de Janeiro e São Paulo. (p. 54-5)
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"Classes Médias e o Tenentismo"
Ponto de Vista da Historiografia Tradicional até 1970
• Mesmo os autores que não vêem ligação entre a Revolução de 1930 e a subida destas ao poder, como Octavio Ianni e Francisco Weffort, pontuam a associação entre Tenentismo e "classes médias". (p. 57)
• A historiografia tradicional atribui ao movimento tenentista a característica de núcleo organizatório das "classes médias", afirmando, desta forma, um estreito vínculo entre a revolta e estes civis. (p. 57)
• O movimento tenentista da década de vinte era portador de uma ideologia da classe média. (p. 63)
Ponto de Vista de Boris Fausto (1969)
• O Tenentismo teria na origem uma tentativa insurrecional independente dos setores civis; não seria organizador do povo, antes disso, teria a intenção de substitui-lo,embora, percebendo-se inaptos ao exercício do poder político, buscam nas figuras civis conservadores o quadro político de substituição, fechando aliança com as oligarquias dissidentes. (p. 57)
• O Tenentismo tinha a simpatia popular, Fausto recorda que, ao desembarcarem dos trens em São Paulo, os soldados legalistas eram incitados pela população civil a aderirem à revolta. (p. 62)
desvinculando classes médias do Tenentismo antes do acesso ao poder
• O autor afirma não se poder pautar na empatia dos populares ao movimento a afirmação de que existia uma vinculação estreita entre este e as "classes médias". (p. 62-3)
A aparência de apoio civil reside no fato que as divergências entre os dissidentes (P. Democrático em S. P., e P. Libertador no R. S.) e os militares ainda não havia sido externada. (p. 63)
• Boris lembra o fato de que a polícia partidária do PRP, em São Paulo, enumerou vários participantes do movimento e, ao acusá-los de pretenderem implantar o bolchevismo no Brasil, colocou a classe política prevenida contra eles. (p. 61)
Para marcar, efetivamente, a distância que existia entre os "tenentes" e os civis, o autor enumera algumas ocorrências:
Citando a Revolução do Forte de Copacabana, Fausto enfatiza a desconfiança que possuíam os militares em relação aos civis.
Lembra a fala de Plínio Casado, na qual o libertador classificara a Revolução de 1924 como quartelada; aponta, também, que neste mesmo episódio as tentativas de organizar os civis dos vários estados forma limitadas. (p. 58)
Aponta que Câmara e Senado definiram a Revolução como "motim de soldados". (p. 59)
Recorda que o jornal O Estado de São Paulo afirmou desconhecer os motivos dos revoltosos. (p. 59)
Pontua o discurso do senador paulista Alfredo Ellis, onde, comparando o episódio com as Revoluções Francesa e Soviética, este ridicularizara os revoltosos ao dizer que eles, ao contrário dos dois primeiros grupos de insurgidos, não possuíam motivos para se rebelarem. (p. 59)
Fausto menciona os "Batalhões Patrióticos" nos quais setores da classe média se alistavam para combater ao levante no estado de São Paulo. (p. 60)
Diminui o suposto vínculo com os chefes políticos dissidentes ao afirmar que estes não logravam laços permanentes com o movimento, seus comprometimentos eram momentâneos: Assis Brasil aproveitara-se da legenda tenentista mas sua vinculação a ela era superficial; os democráticos não mantiveram contatos mais expressivo com a Coluna Prestes no exílio, apesar de, através do Diário Nacional, elogiarem a bravura da mesma. (p. 61)
desvinculando classes médias do Tenentismo após o acesso ao poder
• Com o intuito de, mais uma vez, desvincular a burguesia nacional do movimento, citando as formulações do Clube 3 de Outubro (ver p. 77), o autor afirma que "concessões operárias" e "estatização de núcleos fundamentais da infra-estrutura econômica" são idéias estranhas à burguesia nacional. (p. 78)
• Reforçando a crítica sobre a associação simplista entre Tenentismo e classes médias, Fausto põe em dúvida a origem social dos "tenentes" apontando para a heterogeneidade que a permeava; ainda assim, entende uma maior parte dos oficiais tendo raízes pequeno-burguesas, antes por um empobrecimento das famílias tradicionais do que por uma ascensão social. (p.79-80)
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"Ideologia Tenentista"
indefinição ideológica
• Ressocialização, origens sociais, e a posição intermediária que ocupavam os "tenentes" na hierarquia do exército, são indicadas por Fausto como elementos que ajudam a explicar o fenômeno tenentista. (p. 81)
• O autor afirma que o Tenentismo foi permeado por uma indefinição ideológica advinda do declínio da influência positivista e da predominância da já em crise retórica liberal, voltando-se, de forma elitista, ao ataque jurídico-político das oligarquias. (p. 63)
• Boris afirma que o alvo das críticas dos "tenentes" era o liberalismo que teria promovido a descentralização republicana do poder (1891) ao querer-se utilizar no Brasil uma corrente de idéias que poderia ser válida para outro país, mas não seria uma ideologia universal. (p. 64)
• A imprecisa ideologia tenentista é, segundo o autor, parte da crítica antiliberal praticada à época, à qual se assemelham as intenções de revisão constitucional demonstradas por Oliveira Vianna e Alberto Torres. (p. 67-8)
crÍtica liberal, centralização do poder e equilíbrio entre os três poderes
• Analisando os discursos dos "tenentes" Juarez Távora e Nunes de Carvalho, o autor afirma como sendo reivindicação do movimento uma reforma política onde uma Constituição Federal sobrepor-se-ia às Estaduais uniformizando as instituições e centralizando o poder. Afirma, ainda, que esta centralização de poder não visava favorecer o Executivo, acusado pelos revoltosos de como meio pelo qual as oligarquias intervinham no Legislativo, almejavam, sim, um equilíbrio entre os poderes, demonstrando preferências pelo Judiciário. (p. 64)
• Pregavam, segundo Boris, a união entre os magistrados burocratas e os militares por serem, ambos, funcionários estatais e melhores aparelhados do que os políticos profissionais para reorientar o país. (p. 65)
militarismo moderador
• Citando a fala de Távora, Fausto afirma ainda que os "tenentes" entendiam o militarismo como elemento moderador da vingança das massas populares oprimidas; elemento que, segundo Távora, faltara em 1789 e em 1917. (p. 65-6)
elitismo
• O pensamento tenentista afasta-se do liberal dissidente, encontrando-se mais próximo das classes dominantes (críticos antiliberais e movimentos de direita, por exemplos), quando estas tentam resolver a contradição existente entre os princípios da democracia burguesa (expressos na Constituição de 1891) e a prática republicana, sobre a qual desejavam restringir ainda mais a participação popular na escolha dos governantes. (p. 68)
Para justificar a afirmação acima, o Fausto relembra a proposta de Constituição apresentada aos "tenentes", como opção, pelos reformadores antiliberais Oliveira Vianna e Alberto Torres. Para o último, eleições indiretas e a instituição de um poder Coordenador seriam expedientes úteis para conter a "manifestação dos incapazes", referindo-se ao voto dos populares. Já Vianna, acentuou o elitismo ao afirmar que não importavam os tipos de sufrágio ou de sistema eleitoral desde que se limitasse o eleitorado a uma condição mínima de capacidade. (p. 69)
• A associação do Tenentismo ao pensamento descrito acima, Boris demonstra lembrando a pretensão dos revoltosos de restringir o sufrágio universal, delegando o processo eleitoral às mãos de juízes ou de um Tribunal especial, justificando tal intenção no despreparo do povo para eleger seus representantes. (p. 66)
• Outra indicação de elitismo dentro do movimento tenentista, apontada pelo autor, é o fato da cúpula do exército rebelado não se preocupar em informar aos seus comandados os porquês de suas ordens. (p. 67)
nacionalismo vago
• Fausto caracteriza o aclamado nacionalismo existente dentro do movimento como sendo vago, apesar de identificá-lo em momentos e lugares diversos, a saber: quando Frutuoso Mendes acusou Epitácio Pessoa de entreguista (1922); quando Juarez Távora acusou Artur Bernardes de permitir uma vexatória vistoria financeira por parte de uma comissão inglesa; quando os "tenentes" do Amazonas apropriam-se de um matadouro inglês, em Manaus. (p. 67)
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"Comparando a ideologia tenentista com a da classe média"
• Fausto concorda que, defesa do voto secreto, das liberdades individuais, e o nacionalismo difuso são elementos que constituem uma ponte entre os "tenentes" e a pequena-burguesia, mas são estranhos aos setores majoritários da classe média. (p. 69)
• Conclui também ser difícil atribuir às classe médias brasileira da época, como traços essenciais ideológicos, o elitismo e a preferência pela centralização do poder. (p. 69)
• Apoiando-se em Francisco Weffort, Boris afirma que as classes médias tradicionais adotaram os princípios da democracia liberal, pautando-se no regionalismo e na defesa da autonomia estadual. (p. 69)
• Mesmo tendo em vista tal análise, Fausto aponta a possibilidade de existirem faixas da pequena burguesia identificadas à idéia de ação militar contra as oligarquias, podendo, talvez, através da radicalização e divisão destas, terem dado origem às bases dos movimentos de esquerda (Aliança Nacional Libertadora) e de direita (Ação Integralista). (p. 69-70)
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Os "Tenentes" no Governo
Hipóteses
• O movimento tenentista teria surgido como elemento de representação das classes médias que, devido, entre outros motivos, a sua heterogeneidade, seriam incapazes de se organizar e de se auto-representar? (p. 71)
• Após sua ascensão ao poder, o Tenentismo, como representante das classes médias, teria entrado em crise devido à impotência política destas? (p. 73)
Ponto de Vista de Boris Fausto (1969)
• Boris faz uma analogia entre o que representou o governo de Luís Bonaparte para o pequeno camponês na França, e o que poderia ter representado o Tenentismo no governo para as classes médias brasileiras. (p. 70)
• Utilizando-se do conceito de "classe apoio" desenvolvido por Marx para identificar àqueles que, ao não conseguirem se auto-representar, são representados por outros e passam a apoiá-los, Fausto questiona se seria possível enquadrar a classe média nesta condição em relação aos "tenentes". (p. 70)
• O autor conclui que o Tenentismo não foi um movimento organizador das classes médias, nem o seu representante, apesar de admitir relações entre alguns núcleos da corrente sob análise de certos aspectos de sua prática política. (p. 75)
• Afirma ainda que, a aproximação mais segura entre Tenentismo e classe média, que se possa apontar, reside do fato de um setor do movimento, participante do governo, propor realizar reformas com essência pequeno-burguesa e, devido a pequena correspondência a pequena burguesia ao plano reformista, não podemos atribuir à corrente o caráter representativo desta classe. (p. 81-2)
• Não obstante uma intervenção das classes médias e uma ampliação das oportunidades, provida pelo maior intervencionismo de Vargas, beneficiando-as, não se pode dizer, segundo Fausto, que a revolução tenha sido comandada por estas, nem que as mesmas estavam no setor dominante do curso do episódio. (p. 84)
• Boris relata sua descrença na possibilidade de uma categoria social desenvolver um movimento autônomo e alcançar a dominação política dentro dos quadros da América Latina; diz também que, em se tratando de classe média, esta possibilidade está definitivamente liquidada. (p. 84-5)
algumas realizações
• Boris chega à conclusão que as classes médias não enxergaram os "tenentes" como elementos possíveis de sua representatividade devido às contradições e à perda de identidade destes. (p. 73)
• Analisando a participação dos "tenentes" no poder, o autor enumera alguns êxitos por estes conseguidos:
A defesa da representação por classes;
O prolongamento da ditadura; de acordo com sua oposição ao liberalismo;
Punição dos políticos mais comprometidos com a República Velha;
Demonstração de um certo "espírito revolucionário", implícito num programa de reformas. (p. 71)
diluição do movimento, contradições e perda de identidade
• O autor não entende que o desgaste da corrente tenentista esteja ligado a uma possível impotência política das classes médias; ele explica que, ao tentar impor-se de forma autônoma, o Tenentismo entra em confronto com as oligarquias regionais e com alguns setores das Forças Armadas. Não possuindo o apoio de bases populares e nem mesmo coesão interna, o movimento se esfacela, permanecendo apenas na individualidade de alguns "tenentes" que gravitam, de forma subordinada, em torno do Poder Central. (p. 72-3)
• Em seguida, com o objetivo de demonstrar a diluição do movimento, já no governo Vargas, Fausto enumera alguns incidentes, relacionados às interventorias estaduais, que expressam desavenças e falta de coerência dentro dos quadros tenentistas:
Em São Paulo (1931), João Alberto e Miguel Costa rivalizam. Ambos fazem alianças incoerentes. Por fim, Alberto retira-se do poder apoiando Plínio Barreto (PD) que, em 1922, atacava o movimento tenentista em seus artigos. (p. 71-2)
No Rio Grande do Norte (1932), Hercolino Cascardo, que era defensor da "socialização integral" e por isto criticado, pede demissão da interventoria; seu sucessor, Bertino Dutra, faria o mesmo (1933). (p. 72)
Na Bahia, Juracy Magalhães não se decide entre compor com a oligarquia regional ou praticar limitadas reformas. (p. 72)
No Ceará (1933), Carneiro de Mendonça, por não concordar com a "volta aos velhos métodos", pede demissão da interventoria.
Mais um exemplo no sentido de perceber o enfraquecimento do movimento no decorrer dos anos 30, é o processo de decadência do Clube 3 de Outubro que culmina em seu desaparecimento. (p. 72)
• A Revolução de 1932 marca o divórcio oficial entre "tenentes" e classes médias paulistas, estas foram atraídas para o lado do P. Democrático que se utilizou de manipulação ideológica para tê-las como aliadas contra os tenentistas. Os democráticos acentuaram a tendência esquerdista dos "tenentes" dizendo ser esta um perigo eminente à retomada da elaboração de uma Constituição para o país. (p. 73-4)
• Os populares que apoiaram o Tenentismo vão abandonando o movimento e migrando para um dos dois lados da polaridade política do período: a esquerda (ANL) ou a direita (Integralismo). (p. 75)
oposição à burguesia do café
• Boris identifica o Tenentismo da década de vinte como opositor à burguesia do café, reclamava por tímidas reformas jurídico-administrativas; insistia na importância de uma representação igual por parte de todos os estados, afrontando, assim, a plutocracia paulista edificada à época. (p.75)
• O autor cita, como exemplos das queixas contra a oligarquia cafeeira os discursos de Juarez Távora - que atentava para a utilização de 70% do capital do Banco do Brasil, que advinha de todos os estados, na manutenção da produção cafeeira - e do Cel. Felipe Moreira Lima (1931) - questionando o aparelhamento, por parte das oligarquias paulista, militar da força pública e contra quem este se dava. (p. 76)
• Os "tenentes" foram utilizados por Vargas para impedirem que as forças políticas ligadas à oligarquia cafeeira, em São Paulo, alcançassem o poder no estado. (p. 77)
projeto de programa do Clube 3 de Outubro (1932)
• Boris afirma que as formulações que compunham o plano ideológico tenentista, elaboradas por integrantes do Clube 3 de Outubro, não foram adotadas por todos do movimento, sendo aceitas apenas como subsídios de orientação doutrinária, estando afastadas da prática dos mesmos. (p. 77)
• O autor enumera alguns pontos destas formulações:
O nacionalismo se expressava pela preocupação com a estrutura da economia: produção; consumo; desenvolvimento; legislação; revisão de contratos referentes à concessão de serviços públicos; desapropriação e nacionalização de minas e demais valores naturais.
A questão trabalhista também era pautada: direito à greve; salários mínimo e família; seguro social; participação nos lucros das empresas; formação de um quadro estável de funcionários públicos.
Dentro do programa, condenava-se: a concentração do lucro capitalista;a usura; o abuso na utilização da propriedade como instrumento de escravização e extorsão de lucros exorbitantes. (p.77)
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"Autonomia Política e Classes Médias"
• Limite do universo ideológico da década de vinte; gênese social; e relacionamento com as demais classes, são apontados pelo autor como os elementos que explicam o comportamento político das classes médias no período. (p. 83)
• A despeito da oposição da burguesia industrial em São Paulo e no Rio de Janeiro, Fausto afirma ser incontestável a participação de setores pequeno-burgueses, apoiando entusiasticamente, na campanha da Aliança Liberal, em 1930, contrariamente ao proletariado. (p. 82)
• A inexistência de eleições livres e de partidos políticos nacionais, tornam, segundo o autor, qualquer análise do grau de participação das classes médias genérica, homogeneizando estas e eliminando diferenças que poderiam ser significativas, tanto no que se refere à formação como no tocante à experiência política.
• Apoiando-se em Francisco Weffort, Fausto afirma que grande parte do comportamento da pequena-burguesia brasileira, à época, pode ser atribuído à sua falta de autonomia e dependência do setor agrário-exportador. Esta escassez de autonomia deriva das limitações que as próprias características da classe imputam às perspectivas e alcance de sua ação política. (p. 83)
• Tal colocação ao lado das classes dominantes tem também como responsável a implicação ideológica, a outra opção, o proletariado, trazia uma ligação originária com o anarquismo; este inconciliável com o nacionalismo de que a classe média era portadora. (p. 83)
• Tentativa de superar a contradição entre a ideologia liberal e a prática política; voto secreto; independência da magistratura; e representação das minorias, são, neste momento, os desejos da classe média e estes se assemelham aos dos "tenentes", indo de encontro também ao interesse das classes médias urbanas, para quem uma reforma política poderia significar maior acesso às atividades estatais até então nas mãos dos oligarcas. (p. 83)
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Capítulo III: A "DERRUBADA" DAS OLIGARQUIAS
• Mais uma vez o autor diz não serem válidas explicações simplistas como revolução das classes médias ou ascensão da burguesia nacional. Afirma que não houve mudanças nas relações de produção, baseadas na grande propriedade, nem a troca da oligarquia por outra classe ou fração de classe, no poder, com exclusividade. (p. 86)
• Fausto desqualifica as teorias dualistas ao deixar clara a não existência de relação entre as diferenças regionais - o possível atraso das regiões agrárias - e uma condição de semifeudalismo, colocando, desta forma, as questões inerentes a 1930 sob outra perspectiva. (p. 87-8)
• Segundo o autor, regiões onde predomina o atraso não se caracterizam pela oposição, mas, sim, pela complementaridade às regiões industrialmente desenvolvidas, fornecendo-lhes força de trabalho barata e matérias-primas, além de mercado consumidor para os produtos por elas fabricados. (p. 86-7)
• Estes desníveis regionais não são exclusividades dos países de economia dependente mas, nestes, acentuam-se; Fausto chama a atenção para a predominância, no Brasil anterior aos anos 30, dos centros voltados para a produção destinada ao mercado externo. (p. 87)
a hegemonia política da oligarquia cafeeira
• Boris faz uma diferenciação entre as elites açucareira e cafeeira onde explica que a primeira produzia, mas era subordinada por portugueses e holandeses no tocante à comercialização; já os cafeicultores detinham toda o processo em suas mãos, da produção à comercialização. Esta condição aliada às condições do mercado mundial e a forma pela qual o país se inseria no mercado capitalista possibilitavam à oligarquia paulista uma maior margem de manobra frente aos centros financeiros externos; o autor salienta que esta capacidade de barganha, demonstrada nas "operações valorizadoras", existia, mas era relativa, devido à situação de dependência fundamental. (p. 88-9)
• O controle do seu comércio exterior divida-se entre diversas áreas de influência: E.U.A, Inglaterra e Alemanha eram os maiores importadores, ao passo que o financiamento ficava a cargo dos britânicos. (p. 88)
• Fausto explica que, a partir de 1924, ao custo do endividamento aos centros financeiros externos, da superprodução, e do acúmulo de estoques invendáveis, a política conseguiu segurar os preços por alguns anos. (p. 89)
• O autor explica que, embora a aliança café-com-leite tenha se instaurado, para benefício das oligarquias, com o governo Prudente de Morais, em 1894, os governos militares anteriores - Deodoro e Floriano - não entraram em conflito com os interesses do café. (p. 89)
• Apesar da grande autonomia estadual, permitida pela constituição de 1891, não houve um esfacelamento do Poder Central, chegando mesmo, os paulistas, a se oporem à proposta sul-rio-grandense de reconhecimento a uma soberania estadual. (p. 90)
• Se Prudente de Morais foi o primeiro momento de predomínio institucional do eixo São Paulo - Minas Gerais, a política dos governadores de Campos Sales, que acentuava a dominância das unidades de maior peso junto à União, foi o segundo; a hegemonia das elites deste eixo era garantida, até mesmo quando o presidente não lhe era inerente, devido ao caráter fundamental da economia cafeeira; à modelação das instituições do país em proveito desta; e ao apoio das classes dominantes das outras regiões: Rio Grande do Sul, Bahia e Pernambuco (beneficiários mais próximos) e de outras. (p. 90)
• Fausto cita que, mesmo o Estado sendo o representante direto dos interesses do café, possui certa autonomia e comporta-se como mediador das contendas entre as oligarquias em âmbito regional, afirmando não haver existido contradições no interior de classes dominantes nem fracionamento destas em escala nacional. (p. 91)
• Fausto afirma que tais dissidências regionais se uniam quando da possibilidade de um enfrentamento com características nacionais, para exemplificar cita os casos estaduais da Frente Única Gaúcha (Partido Libertador unido ao Partido Republicano Sul-Rio-Grandense) e da Frente Única Paulista (Partido Democrático e Partido Republicano Paulista) (p. 91)
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"A Crise dos Anos Vinte"
Ponto de Vista da Historiografia Tradicional até 1970
• Francisco Weffort afirma que o caráter da crise que se abre à década de vinte se daria no nível do Estado antes de ocorrer no da economia; com esta afirmação o autor não nega a existência de uma crise econômica mas atribuí-lhe raízes longínquas, destacando a tranqüilidade existente no governo Washington Luís, exceção feita ao seu último ano. Francisco incuta, ainda, à classe média todo o movimento de rebeldia à época na tentativa de explicar a virulência antioligárquica. (p. 93)
Ponto de Boris Fausto 1969
crise: componentes políticos e econômicos
• Mesmo reconhecendo os acertos de Weffort - não vincular fundamentalmente crises econômica e política; perceber uma crítica antioligárquica baseada nas características jurídico-políticas -, Boris contesta tal tranqüilidade política e mesmo a "euforia econômica" apontada pelo autor, indicando que a situação do comércio mundial, a partir da Primeira Guerra, colocava a economia brasileira, agro-exportadora baseada na monocultura, em situação vulnerável face à autarquia e ao protecionismo que já se apresentavam; sem contar que o antigo monopólio do café já não mais existia, devido à concorrência que este agora sofria; existindo ainda o agravante de que as políticas valorizadoras possuiriam, em si, uma contradição que não lhes permitira lograr êxito por tempo muito longo. (p. 93)
• Para justificar a idéia de não ter havido uma redução das dificuldades econômicas, Fausto cita o aumento excessivo do custo de vida; fruto da emissão de papel para efetuar-se a compra do café sobressalente. (p. 94)
• Inconformismo das classes médias e revolta tenentista são indícios de desequilíbrio político da Primeira República, nos primeiros anos da década de vinte, muito embora as oligarquias que, durante os pleitos, contrapunham-se ao eixo S.P.-Minas, ao final destes manifestassem apoio aos vencedores. (p. 92)
• O apoio das classes médias, a articulação tenentista, e a disposição dos jovens componentes do quadro aliancista para pegar em armas diante de uma derrota nas urnas eram os elementos capazes de modificar os caminhos da tranqüila sucessão. (p. 97)
• Fausto afirma que a vinculação de alguns "tenentes" com famílias tradicionais da época, permite não caracterizar o ingresso destes no meio militar como objetivo de ascensão social, antes, eram portadores de um sentimento de liderança por integrarem as Forças Armadas; o Tenentismo não protestava apenas contra os quadros dirigentes civis, apontavam a própria cúpula militar por estarem a favor destes de forma subordinada, desviando o Exército de sua verdadeira função responsável pelo país. (p. 92)
hegemonia política da burguesia cafeeira entra em declínio
• Fausto afirma que os "tenentes" procuraram capitalizar a seu favor esta conjuntura desfavorável, e identifica com limitador da ideologia oposicionista o caráter moralista da classe média. (p.95)
• Depois de muito tempo de acomodação subordinada, os representantes das oligarquias inferiores à paulista - Antônio Carlos, Borges Medeiros, Vargas -, dentro de um programa apresentado pela Aliança Liberal, só poderiam apontar para uma reforma política, não poderiam cogitar reformular uma economia fundamentalmente dependente da agricultura cafeeira. Para comprovar este pensamento, Fausto cita os discursos de Getúlio Vargas e de Antônio Carlos (1929) nos quais a defesa pela manutenção da política cafeeira se faz presente. (p. 96)
• Boris enfatiza a importância dos acontecimentos políticos dentro da crise mundial citando a insistência de Washington Luís em querer fazer seu sucessor Júlio Prestes para garantir a continuidade de sua política financeira, abrindo caminho para entendimentos entre Minas Gerais e Rio Grande do Sul, nos quais o primeiro aceitaria o nome de um gaúcho para, juntos, almejarem o poder. (p. 97)
• Fausto afirma que a República Velha não teria caído em função da crise mundial de 1929, mas esta acentuou as contradições entre a economia cafeeira e as instituições que asseguravam o seu predomínio. (p. 97)
• O autor afirma que os efeitos políticos da crise mundial são percebidos no comportamento da burguesia cafeeira que já não reconhece em seus representantes os quadros que unificam a Nação, na medida dos seus interesses, quando, por exemplo, Washington Luís abandona a defesa do café e, para manter a política financeira de estabilidade cambial, tenta a venda do produto a baixos preços, suscitando o descontentamento dos lavradores. (p. 98)
• Mesmo com o uso da "máquina" obtendo o resultado de vitória para o governo, ele já não possuía mais uma base de apoio para os momentos decisivos, como os de Outubro de 1930. (p. 99)
• Para demonstrar como a crise alenta os ressentimentos regionais, Boris reproduz um debate na Câmara Federal onde se instala longa discussão envolvendo os defensores de São Paulo (Eloy Chaves; Manoel Villaboim; Cardoso de Almeida; Américo Barreto) e seus opositores (Adolfo Bergamini; Raul de Faria; Carvalhal Filho; Joviniano de Castro). (p. 100-1)
• Citando os movimentos revolucionários de características predominantemente militares, Fausto diz que não se pode reduzi-los a uma só identidade sob de não se elucidar episódios de sentidos diversos, apesar de estes terem tido, como parte de suas motivações, a crise mundial que atingia as exportações dos países dependentes, ocasionando um rearranjo interno. (p. 101)
• Fausto afirma que a imprensa paulista de oposição teria se utilizado da queda de alguns governos na América Latina, apontando o uso das Forças Armadas pelo Povo, ao dar a entender que esta era a melhor opção para o caso brasileiro. (p. 101)
• Os quadros oligárquicos tradicionais de mais idade aceitam a vitória de Júlio Prestes, as articulações revolucionários seriam tramadas pelos jovens, tanto civis quanto militares.(p. 102)
• Os articuladores da revolução pertenceriam, então, às classes dominantes dos estados de Minas Gerais, Rio Grande do Sul, e Paraíba, com a adesão de uma parcela ponderável do aparelho militar do Estado; e sua base de apoio era composta por elementos as forças sociais das regiões dissidentes e pelas classes médias urbanas; e, se o proletariado não participou ativamente como classe, demonstrou simpatia pelo movimento. (p. 102)
• A participação do Exército não foi uma ação homogênea, determinada hierarquicamente. O setor militar mais dinâmico era, justamente, composto por aqueles que haviam sido afastados do aparelho militar de Estado. A cúpula só entrou no movimento em um momento segundo, tentando agir como um poder moderador. (p. 103)
• A crise da hegemonia da burguesia do café abre a possibilidade para que outras oligarquias não ligadas ao produto se aglutinem, contando com o apoio das classes médias e, de forma difusa, dos populares. (p. 103)
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"O Estado de Compromisso"
• Francisco Weffort afirma que, nos anos seguintes a 1930, nenhum dos grupos participantes do poder pode oferecer ao Estado as bases de sua legitimidade: as classes médias não têm autonomia suficiente; os cafeeiros perderam força e representatividade; os demais setores agrícolas ainda desenvolvem-se timidamente. (p. 104)
• Fausto afirma que a concretização de um Estado de Compromisso é possível por não existir no interior das classes dominantes oposições radicais, cabendo, o acordo, às diversas frações da burguesia. (p. 104)
• Com a Revolução, a burguesia do café é apeada do Poder Central, seguindo-se uma longa renúncia da classe dominante de São Paulo à instância política; já no tocante à economia, mesmo em crise o café continuava a ser o núcleo fundamental da economia, recebendo, assim, atenção por parte de Vargas, mesmo havendo, por parte deste, um incentivo à diversificação da produção agrícola. (p. 105-6)
• O Exército era a instituição que garantia o Estado de Compromisso, não como protetor das classes médias, mas como unificador das várias frações da classe dominante. Para a manutenção deste Estado era necessário a erradicação do movimento tenentista para a homogeneização do Exército, utilizando-se dos "tenentes" de maneira individual, e, necessitava-se também, combater as organizações radicais, cujas influências ideológicas crescia nas Forças Armadas. (p. 106-7)
• O êxito desta homogeneização pode ser medido, segundo Boris, pelo golpe de 1937, que só fora possível devido à articulação de um núcleo militar coeso. (p. 107)
• O governo Vargas desorganizou politicamente a classe operária mas estabeleceu um novo tipo de relação com esta, fugindo daquela simples marginalização empreendida a ela pelas velhas classes dominantes. Vargas criou o Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio e inseriu medidas tendentes a proteger a força de trabalho, a promover sua limitada organização econômica, e incentivar o aproveitamento do operariado nacional; mas, ao mesmo tempo em que o governo passava a reconhecer a existência da classe, tomava medidas no sentido de controlá-la, utilizando-se, para isto, de instrumentos de representação profissional, como sindicatos oficiais apolíticos e restritos numericamente. (p. 108)
• Vargas usa da ideologia também para minar os movimentos trabalhistas suscitados por um número crescente de operários estrangeiros politicamente mais conscientes àquele momento. Leis que limitavam o ingresso de viajantes de terceira classe ao país e que obrigavam o empresariado a possuírem dois terços de seus trabalhadores nascidos no Brasil exemplificam isto, segundo Boris. (p. 109)
• O Estado de Compromisso caracteriza-se por uma maior centralização possibilitada pelas alterações institucionais que, mesmo não pondo fim às oligarquias, elimina o sistema oligárquico; um intervencionismo ampliado, e o estabelecimento de certa racionalização no uso de algumas fontes fundamentais de riqueza pelo capitalismo. (p. 109-10)
• Fausto caracteriza, ideologicamente, o Estado de Compromisso pela substituição lenta das idéias liberais pelas fascistas, mesmo percebendo-se o "compromisso" instalado, através da Constituição de 1934, em bases liberais; o autor comprova tal afirmação citando as falas de Getúlio Vargas no Rio Grande do Sul, antes mesmo de 1930, e na Paraíba, em 1933, onde ele clamava por um fascismo brasileiro pautado no fortalecimento do Estado, com o intuito de fortalecer a pátria. (p. 110)
• Ao terminar sua explanação, Boris Fausto reafirma que não pretendeu, com a obra, eliminar certo grau de veracidade existente na relação Revolução de 1930 e processo de industrialização, mas não se trata de interpretar o fato em termos do ascenso da burguesia industrial ao poder, nem de que esta teria intervindo diretamente na revolução. Tais conexões acontecem indiretamente e ao longo do tempo, devido às características que o Estado assume, quando do rompimento entre São Paulo e comando político, em 1930. (p. 111)
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"CONCLUSÃO"
• Fausto diz que a Revolução não ocorreu como um produto mecânico da dependência nacional; fora um desenlace ocorrido devido à maneira em que o Brasil se inseria no mercado capitalista internacional e que pedia uma reestruturação interna, uma vez que a estrutura econômica montada em torno da produção de um único produto agrícola para a exportação já não se sustentava. (p. 112-4)
• O autor enfatiza que o episódio revolucionário não ocorrera em função de um embate entre o setor agrícola e o recém formado industrial, ele explica que, antes disto, havia uma complementaridade entre os dois. (p. 112-4)
• Fausto afirma que a Revolução pois fim à hegemonia da burguesia do café, a passividade da massa rural, os limites de intervenção do proletariado, e a heterogeneidade das classes médias, fizeram com que setores descontentes do Exército despontassem como protagonistas maiores desta oposição à política imposta pelos cafeicultores e, após a revolução, estas mesmas limitações permitiram o surgimento de um vazio de poder, por não existir outra classe em posição de ocupar o lugar da, até então, dominante, criando-se, assim, as possibilidades para a edificação do Estado de Compromisso. (p. 112-4)
• Boris encerra sua obra afirmando que, a partir de outubro de 1930, o país começava a trilhar o caminho para atingir sua maioridade política, ressaltando porém o paradoxo, inerente a esta descontinuidade revolucionária, expresso pela inserção das ideologias em voga no mundo de então e na tentativa de utilização destas para a solução de problemas, até então, tencionados resolver-se com adoção de medidas nacionais. (p. 112-4)