Fernando Lafaiete 07/07/2019Quatro Estações: Muito além do rótulo do autor******************************NÃO contém spoiler******************************
O que nos vem à cabeça quando pensamos em Stephen King? Terror certo? Pois é! Um rótulo que persegue o famoso autor desde que ele estreou com “Carrie: A Estranha ” em 1974. Mas se é isso que você procura em “Quatro Estações”, talvez esse não seja o seu momento de lê-lo. O compilado de novelas aqui presentes não se trata de carros assassinos, palhações que moram em bueiros, um vírus letal que extermina 99% da população, um cachorro que enlouquece... os temas de “Quatro Estações” vão além do assunto que consagrou King colocando-o no mesmo patamar de outros grandes autores do gênero. A proposta é exatamente (ou não) a de que o livro em questão seja quase que um ponto fora da curva do portfólio do escritor. As quatro novelas irão falar de temas como injustiça, relacionamento tóxico, amizade e elementos sobrenaturais que puxam mais para o drama social enigmático.
Três das quatro novelas ganharam famosas e elogiadas adaptações cinematográficas, que colaboraram para que as histórias se tornassem ainda mais populares, chamando a atenção do público e da crítica especializada. Afinal de contas, quer dizer então que King não escreve apenas terror?
“Embora a pergunta mais frequente sempre tenha sido: “De onde você tira suas ideias? ” (é a número um com asterisco, digamos assim), em segundo lugar vem sem dúvida esta: “Você só escreve terror? ” Quando digo que não, é difícil dizer se a pessoa fica aliviada ou decepcionada. ” Stephen King
NOVELA I
Em “Primavera Eterna: Rita Haymorth e a Redenção de Shwashank”, acompanhamos a narrativa de um rapaz preso injustamente. Acusado de ter assassinado a esposa e seu amante, o protagonista se vê perdendo sua liberdade ao mesmo tempo que tenta a todo custo não perder a esperança. Tentando se adaptar a sua nova rotina, o personagem central se vê diante de uma realidade predatória onde estupros e corrupção caminham lado a lado. Como provar sua inocência? Em quem confiar? Há luz no fim do túnel? Com uma narrativa com personagens muito bem trabalhados, King nos apresenta dilemas e possíveis soluções que nos deixam desesperados e revoltados. Gostei bastante desta novela, mas minhas expectativas me atrapalharam um pouco. Acabei não as tendo supridas totalmente. Tanto o final quanto o desenvolvimento são muito bons, mas ainda assim esperava um pouco mais. Tal novela deu origem a adaptação “Um Sonho de Liberdade” protagonizado por Tim Robbins e Morgan Freeman, indicada em 1995 em nove categorias do Oscar, incluindo a de melhor filme. Infelizmente acabou não ganhando nenhuma. Esta novela foi escrita e publicada em 1994 logo após “Zona Morta”, romance de 1979. Nota: 3.5
NOVELA II
Em “Verão da Corrupção: Aluno Inteligente”, nos deparamos com uma situação inusitada. Um jovem apaixonado pelo nazismo se vê diante de uma oportunidade única; a de se relacionar com alguém que não somente esteve na guerra como foi um dos torturadores de Hitler. Acompanhamos uma relação parasitista e tóxica sendo formada, onde a loucura vai tomando conta da narrativa. O autor brinca com nossas emoções, muitas vezes nos fazendo torcer pelos criminosos e protagonistas. Vemos um desenvolvimento lento, prolixo, onde muitas vezes me deixou confuso por não ter noção de onde a história iria parar. Com diversas camadas e curvas, a narrativa vai tomando proporções psicológicas assustadoras e convincentes. Apesar de ter gostado muito, também não tive minhas expectativas supridas. Achei alguns momentos muito cansativos e para mim não ficou claro o motivo de tamanha obsessão por um dos períodos mais obscuros da humanidade. Apesar disso, tal novela cumpre seu papel e nos entrega um desfecho excelente, que nos deixa pensativos. Qual o limite da loucura e quais suas motivações? - Tivemos em 1995 uma adaptação teatral, protagonizada por William J. Norris e dirigida por Christopher Johnson. Em 1998 ganhou uma adaptação para o cinema dirigida por Bryan Singer com Brad Renfro e Ian Mckellen nos papéis principais. Tal novela foi escrita em duas semanas após Stephen King terminar “O Iluminado” em 1977. Nota: 3.5
NOVELA III
Em “Outono da Inocência: O Corpo”, minha novela favorita da coletânea, acompanhamos um grupo de crianças embarcando em uma jornada. Tudo que eles querem é encontrar o corpo de um garoto que supostamente foi atropelado pelo trem da cidade. Acreditam que tal descoberta lhes trará fama. Abordando temas como relacionamentos familiares, infância e psicologia infantil, o autor nos entrega uma novela incrível que causa identificação com seu clima nostálgico. Bons personagens, boas situações e diálogos impecáveis me marcaram e me deixaram com saudade. Com um clima que remete à “IT: A Coisa”, tal história vai muito além das camadas superficiais apresentadas no início. Onde tudo se torna uma aventura, “O Corpo” é o tipo de novela pra ler e reler várias vezes. Em 1986 ganhou uma adaptação cinematográfica a qual se tornou um clássico da “Sessão da Tarde. ” Se ainda não viu, veja! “Conta Comigo” é um baita filme. Divertido e uma adaptação para se respeitar. Nota: 4.5
NOVELA IV
Em “Inverno no Clube: O Método Respiratório”, vemos um advogado entrando para um misterioso clube formado por idosos. O objetivo é se reunir e contar histórias; onde a narrativa mais macabra é guardada para ser contada dias antes do natal. Esse é a minha segunda novela favorita e traz uma crítica social pesada, nos mostrando o quanto o julgamento alheio pode afetar de maneira trágica a vida de alguém. O desenvolvimento possui um ar sobrenatural que nos instiga e nos deixa com a pulga atrás da orelha em diversos momentos. O desfecho apresenta um acontecimento assombroso, macabro e que me deixou chocado. Não estava esperando tal situação e fui surpreendido. É pra mim a novela que mais se aproxima do gênero terror, mas nada é tão chocante e assustador. Caso já seja acostumado com Stephen King, irá assimilar e digerir com tranquilidade. Caso contrário, pode achar macabro até demais. Uma novela espetacular, cheia de ironias, críticas e momentos para se refletir. É a única da coletânea que não ganhou nenhuma adaptação. Ainda espero que isso aconteça. Nota: 4
Com rótulos ou sem rótulos, Stephen King é tipo de autor para se ler, degustar e apreciar. “Quatro Estações” vai muito além do rótulo que lhe empregam como escritor de gênero. Rótulos, rótulos e rótulos... uma mera nomenclatura que não exprime com exatidão a magnitude imaginativa que Stephen King nos proporciona.