Katita2013 18/08/2013
A brancura que tememos!!!
Bem, o que dizer de um livro tão conhecido por todos!. Afinal já foi dito tanto de Moby Dick, e todos conhecem tão bem a estória!. Decidi, portanto, escrever sobre as impressões que tive ao longo da leitura deste livro. Primeiro de tudo é que antes de ler tinha a idéia de que Moby Dick fosse uma baleia boazinha e gentil,influenciada que estava pelos desenhos animados de Walt Disney. Portanto fiquei surpresa e quase chocada ao constatar que o narrador nos descreve uma baleia astuta, vingativa e feroz no confronto com os pescadores que dela se aproximavam para caçá-la. Ao menos era dessa maneira que a enxergavam o narrador (Ismael) e também o capitão do navio baleeiro Pequod, Ahab. Um outro aspecto que me fascinou foi a relação de ódio do capitão do navio por Moby Dick. Era um sentimento de ódio tão devastador, tão magnético e tão atroz que beirava quase ao "Sublime" tomado na concepção de Kant. Pois era como ter diante de si esses vendáveis, esses temporais tão imensos e grandiosos que nos causam medo e fascinação, e que diante dos quais somos impotentes e frágeis. Era esse o sentimento de Ahab para com Moby Dick.
O chocante ao meu ver, era que para mim era um sentimento tanto quanto inexplicável,pois outros marinheiros foram também atacados por Moby Dick e perderam também, tanto quanto Ahab, certas partes do corpo. Mas, ao contrário de Ahab, eles não nutriam nenhum outro sentimento que não fosse um temor reverencial pela baleia. Ahab nutria por Moby Dick um ódio tão mortal, tão intenso que se confundia com amor. Ele o odiava e o amava. Era sua obsessão. Era a sua loucura. E era tão intensa essa paixão que acabou por conquistar quase todos os marinheiros a bordo do Pequod na loucura de se entregarem a esse sentimento arrasador que era o ódio de Ahab por Moby Dick.
A coisa que me fascinou neste aspecto foi verificar como esse inexplicável sentimento "sublime" de ódio/amor que consumia esse homem a ponto de tocar a insanidade pudesse arrastar com si toda a tripulação do navio nos vórtices da sua paixão desequilibrante e mortal rumo ao furacão apocalíptico sem retorno, para o qual Ahab tinha plena consciência, mas que não se importava. Flutuavam questões na minha mente durante toda a leitura.
Eu me perguntava Por Quê?. Por quê Ahab nutria tão intenso ódio por Moby Dick?, pois afinal, a baleia apenas se defendia dos ataques do pescadores. Será que era porque era diferente?, pois Moby Dick, além de proporções de "monstro", tinha "fronte peculiar, enrugada, branca como a neve, e uma corcova também branca, altiva, piramidal." Ah, a cor branca!.. Cor que quando "dissociada de organizações mais benévolas e ligada a qualquer objeto por si mesmo apavorante, essa qualidade elusiva é que faz com que a idéia de brancura amplie esse terror até os limites mais extremos"....."O que há no homem albino que tanto repele e choca nossos olhos, que às vezes o faz ser odiado pelos seus próprios parentes?"..e finalmente.. "Ponderando sobre isso tudo chegamos à conclusão de que o universo paralisado permanece diante de nós como um leproso, como os teimosos viajantes da Lapônia que se recusam a usar óculos de cor e acabam por ficar cegos diante da monumental mortalha branca que envolve todas as esperanças diante de si. E a baleia albina é o símbolo de todas essas coisas. Ainda vos espantais com a fogosa caça?". É afinal, o ser "diverso", somente pelo fato de ser diferente, juntamente é claro, com o fato de tê-lo deixado sem uma perna,era o motor de todo esse sentimento ambíguo que o capitão nutria por Moby Dick? Era o que nutria o seu ódio, seu furor de dominação e ódio?.
Outra pergunta que me vinha incessantemente era o Por Quê de Ahab, em toda a sua loucura e ódio que eram só seus, consegue o consenso de praticamente todo a tripulação, exceção feita pelo Capitão Starbuck, que era o único imune ao seu magnetismo nefando, e o único a perceber a densa e estranha atmosfera que o navio portava com si. Eu me perguntava por quê aqueles homens abraçaram uma causa que não era deles!. Por quê concordaram em caçar Moby Dick por uma vingança que não os pertenciam! Afinal tinham embarcado para caçar baleias com fins econômicos!, e como diz Ahab a mesma tripulação... "Ela é minha tarefa, ela me completa. Nela vejo a força ultrajante aliada a uma inescrutável malícia. E é principalmente essa coisa insondável que eu odeio, e seja a baleia branca o agente ou esteja ela agindo por si mesma, é sobre ela que vou descarregar esse ódio."
O próprio narrador tenta entender esse consentimento esdrúxulo e sem sentido da tripulação do Pequod,e no final do trecho no.41 chamado Moby Dick, ele nos diz: "Para explicar essas coisas seria preciso mergulhar no assunto mais profundamente do que o conseguiria Ismael. O mineiro oculto que existe em todos nós poderia dizer para onde conduz sua galeria pelo som abafado e sempre cambiante de sua picareta? Quem não sente o irresistível fascínio? Qual o pequeno barco à vela que ao ser rebocado por um navio modelo 74 pode permanecer parado?". Será?.
Ler Moby Dick não é uma tarefa fácil, pois sua leitura não é fluida. Foi o livro ( veja a ironia ) que praticamente afundou a carreira de Herman Melville. Neste livro Melville misturou várias técnicas narrativas, coisa inovativa para sua época, e que não foi tão bem aceita. Em Moby Dick se alternam narração e descrição técnica, ficção e realidade, e ao meu ver é o que o torna único e enriquece a obra, apesar de torná-lo dificultoso para certos leitores acostumados ainda hoje a romances açucarados e de pouco conteúdo original. A chave, na minha opinião, para poder aprecia-lo do modo justo,é tratar as partes onde Melville praticamente interrompe a estória para dar explicações técnicas e cientificas sobre algo ao qual faz parte dentro do contexto da estória,como fazendo parte essa mesma "pausa" da estória. O que estou querendo dizer aqui é para deixar-nos levar pela estória em seu completo. Ou seja, fazer uma "imersão" completa neste mundo das caças á Baleias do Séc.XIX, ao qual permite esplendidamente a obra de Melville, exatamente por essa inovação narrativa. Devemos usufruir das informações técnicas que Melville nos fornece como se fossemos nós mesmos lá, dentro da estória, a indagarmos. Como se fossemos nós a nos interessarmos por qualquer detalhe que se nos apresente enquanto participamos da aventura do Pequod enquanto navega incauto do perigo para o qual se destina.
Para terminar: Por Quê ler Moby Dick?... Talvez para se maravilhar diante desse imenso abismo que é a loucura, o ódio e a obsessão. Para nos por questões como o Por Quê que o "outro", o "diferente" nos provoca tanta confusão e medo, e em alguns casos ( se não na maioria ),nos provoque tanto ódio e rancor, quase sempre muitas vezes gratuitos. E talvez, finalmente devemos ler Moby Dick ,para nos deliciar com o estilo de escrita de Melville, que além de preciso, é tantas vezes belo que se aproxima do poético.