spoiler visualizarMarcos 07/06/2022
Ai! Que preguiça!
Macunaíma é uma das grandes obras do Modernismo brasileiro. É uma obra surrealista, repleta de aspectos ilógicos, fantasiosos e riqueza folclórica. Adota como protagonista uma personagem complexa, na qual se misturam os mais variados traços de nossa formação cultural.
A estória é sobre a busca de Macunaíma, índio da tribo Tapanhumas, da Amazônia, por a muiraquitã, um amuleto dado a ele por Ci, a Mãe do Mato, sua eterna companheira. Ao longo da jornada o herói se depara em episódios de luta, doença e perseguição envolvido por lendas e figuras mitológicas. A busca o leva até São Paulo, juntamente com seus irmãos, onde mora o gigante comedor de gente, Piaimã, que adquiriu sua pedra da sorte perdida. Entre os vai-e-vens da desventura do herói, o seu rival, Piaimã é derrotado. Macunaíma recupera o amuleto da amada, acaba por ficar só no mundo, resolve ir morar no céu e torna-se constelação.
Macunaíma é uma rapsódia, uma composição folclórica que traz a mítica jornada de herói, este, não é exemplo de bom caráter. O índio é imprevisível, transmuta entre momentos de intensa esperteza e estupidez, entre tranquilidade e brutalidade, entre heroísmo e vilania. Ele é um ser sobre-humano com poderes mágicos, vive realizando prodígios. Pelo o título da obra fica evidente que ele é um indivíduo sem caráter, não especificamente no sentido negativo da palavra, mas como alguém que não tem um caráter bem definido, um processo em formação. Macunaíma é preguiçoso, geralmente imoral e sempre sexual, vive "brincando" (atos sexuais) com as moças. Entretanto, ele também é um sujeito de valores, sendo, por exemplo, persistente quando quer algo; ele valoriza as suas crenças e sua terra-natal, consegue ser irreverente e até engraçado na forma de enfrentar as adversidades da vida, e principalmente aprende com os erros. Macunaíma é um homem de exageros, de mistura de culturas; um explorador astuto, pintado num mundo onírico que busca representar a origem do brasileiro.
Em linhas gerais, entende-se que o romance faz crítica a aspectos negativos (preguiça, inconstância, libertinagem, covardia e infidelidade) do povo brasileiro que não tinha um caráter definido. Porém, também exalta a ancestralidade de um povo de origens indígenas, e rico em recursos materiais (natureza e tecnologia) e intelectuais (inventividade e folclóre).
A obra conta sobre a miscigenação e a assimilação cultural de outras etnias ao nosso povo brasileiro, sendo demonstrado na narrativa como um povo em processo de formação identitária.
A obra tem em sua estrutura uma combinação de elementos linguísticos, advindos da oralidade, do popular e em linguagem coloquial. No capítulo, "Cartas pras icamiabas" inclui-se também a linguagem culta, com seu requinte de rebuscamento. Essa mistura pode causar estranhamento no leitor, todavia, apresenta originalidade na escrita do autor, que tendia a ruptura das estruturas dos romances tradicionais em outros momentos literários (característica do Modernismo).
Enfim, o romance tem uma riqueza vocabular e folclórica, consagra a cultura indígena, evidência as misturas de etnias, além de criticar a formação identitária do país. A obra é fundamental e atemporal, inventiva e cativante, ágil e pontual. Logo, Macunaíma é uma preciosidade que pinta brevemente uma tela notável sobre a natureza do Brasil.