Mumartins 07/10/2022
É doce morrer no mar
Mar morto, escrito por Jorge Amado em 1936, retrata as vidas de Guma, um dos muitos marítimos que não aspiram senão a vida e a morte no mar, e de Lívia, sua esposa. Desde cedo os que nascem no porto já possuem a mentalidade de que viverão pelos seus saveiros e no mar morrerão afogados, sendo transportados por Janaína – que é como os que vivem no porto chamam Iemanjá – para as terras de Aiocá. Lá a orixá será a mãe e a mulher dos que no oceano encontram o fim de suas vidas.
Os meninos que lá nascem são criados desde cedo visando o trabalho no mar e, quando vão para a escola, permanecem lá somente pelo tempo que leva para se aprender a ler e a escrever e mesmo assim porque isso é necessário para a realização de seu emprego. Dona Dulce, a professora do porto, em determinado momento do livro se queixa que muitos ali possuem capacidade de fazer uma faculdade e crescer na vida, mas a urgência da fome os força a abandonar os estudos assim que aprendem a ler e a escrever e logo se voltam para o trabalho. Isso a angustia muito e, no entanto, ela ainda espera um milagre – uma revolução?
Ao longo do romance, é evidente o conflito de classes presente no estilo de vida que levam, pois os marítimos estão constantemente enfrentando dificuldades econômicas, principalmente quando a tabela que regula o preço de seus serviços define um preço baixo para os transportes que realizam. Assim sendo, esses homens levam uma vida muito humilde e de luta, trabalhando apenas para comer miseravelmente.
Quando Lívia se casa com Guma, cantam em sua festa uma música que a deixa angustiada: é doce morrer no mar. Lívia não é filha de marítimo e, por isso, não está acostumada com a ideia de que seu marido morrerá no mar, deixando-a sem sustento e obrigando-a a prostituir-se. Para Lívia, cada noite em que Guma está realizando o transporte de uma carga a angústia da espera é muito grande, levando-a a sonhar que algum dia seu marido irá abandonar essa vida e irá trabalhar na quitanda dos tios de Lívia, na cidade alta.
Os personagens descritos por Jorge Amado nesse livro são muito idealizados, porque são heróis, salvam as pessoas do afogamento no mar e os navios que se encalhassem levariam para a morte centenas de vidas. Mas ao mesmo tempo são mártires, sofrem com a pobreza e o risco da morte. Essa é uma característica presente em todas as obras do escritor que já li até aqui: personagens que, apesar do sofrimento, não perdem o gosto pela vida que levam.
O livro é de uma leitura rápida, apesar de em muitos momentos ser repetitivo, mas o que torna a obra encantadora é a capacidade sem igual que Jorge Amado possui de fazer o leitor sentir cada palavra, cada angústia, cada sentimento dos personagens. A leitura de Jorge Amado é sempre prazerosa, crítica e reflexiva.