spoiler visualizarSammyaLC 18/04/2024
Um romance singular que traz uma ótica muito interessante sobre as raizes do adultério em uma sociedade que relegam as mulheres ao isolamento doméstico e a falta de perspectivas de realização pessoal fora de um ideal romântico. No entanto, não compreendo como muitos consideram esse livro feminista, visto o quanto ele se empenha em traçar um visão pejorativa de sua protagonista.
Madame Bovary é uma mulher patética, frívola e egoísta, possuidora de certa ingenuidade desconcertante em relação ao mundo, que ao deparar-se com o tédio da sua vida de casada, agarra-se a um ideal de felicidade ilusória propaganda pelos romances que lia.
Emma, embora complexa, é um mulher com uma vida privilegiada - amada pelo marido, com boa posição social e confortos financeiros consideráveis - que aparentemente não é feliz, simplesmente porque escolhe ser infeliz. Narcisista, ela desvaloriza sua família e a bondade com que é tratada, apresentando-se injustificadamente cruel e rescindida com o marido e a filha.
Além disso, Bovary não só escolhe amantes deploráveis, que não correspondem verdadeiramente aos seus sentimentos e desejam se aproveitar dela, como mesmo as suas paixões soam falsas, pois Emma parece mais apaixonada pelo que ela imagina deles do que pelos homens que eles realmente são, havendo uma distonia entre o amor que ela sente e a forma que eles a tratam.
Assim, Flaubert faz questão não só de puni-la pela sua conduta e excessiva vaidade, mas parece lhe dar uma quantidade excessiva de agência, quase inverossímil para realidade de sua época, apenas para destacar que ela é a única responsável por sua própria tragédia e minar a simpatia que poderíamos dirigir a ela. Unidimensional, ela permanece a mesma do começo ao fim do romance.
Apesar disso, a leitura é imersiva, e traz muitos personagens secundários interessantes. Contudo, para mim, o ponto alto da obra é a inestimável e intricada interdependência apresentada entre o consumismo de Emma e seus sentimentos.