faay 15/09/2024
?Dar-me-iam água para lavar as mãos??
Angústia, de Graciliano Ramos, é um livro lavrado à risca sob esse maldito sentimento ? por vezes, e por alguns, agradável ?, mas uma das poucas obras que se abocanha e leva para casa, o caminho todo.
Terrinha de Maceió, casebres, areia e moradores que compartilham da Nordeste a sensação de compreender, viver e estar lá. Então, de supetão, as carapanãs infernais (mosquitos, quem preferir) zunem a cabeça de Luís da Silva, nosso protagonista, e o põe para discorrer todo o seu ódio mortal a respeito da sua vida urbana. Os burocratas, empresários, chefes, Juliãos Tavares, as pessoas, as malditas pessoas, e, principalmente, a sua Marina.
Muitos encontrarão elementos, supostamente desnecessários, no cerne do livro, mas já vos adianto! Cada assunto foi essencial para construir a amargura da nossa personagem, mas, sobretudo, mostrar um pouco do escopo de realismo e a maldição de ter que trabalhar como um cão, estabelecer-se em uma precária moradia e, simplesmente, viver como sururu a fim de poucos réis. O dinamismo que nos afronta é explicado pelo mundo em que se insere, e claro, como acompanhar o raciocínio lógico se tudo está depravado? Agora, se o capitalismo não é um dos seus temas tratados em miudeza, cabe agora, eu, concluir tudo isto.
Luís da Silva abraça a loucura. Loucura de um passado cruel nordestino, de uma herança escravista, ainda pela década de trinta. Toda sua angústia foi transmitida em maestria e ouso dizer que não haveria forma melhor desse livro ter sido escrito. Lembranças. Tive lembranças como Luís. Espasmos como Luís. Olhos fundos. A água para lavar as mãos. E a angústia de Luís. O leque de sensações, aqui, nunca será bem especificado, porque a cada página, o leitor ávido, no mínimo, terá cerca de duas doses de desespero, e cinco de identificação. Agora, deixo de reflexão: tudo isso que Luís da Silva aspira, é justificável? Louvável? O nosso ódio aplicado por ele, de fato, merece ser pouco extirpado? Se o é ou não, somente o conteúdo subjetivo poderá responder.
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?Se saísse cunho, iria deitar-me, não tornaria a ver Marina. Tantos tormentos por causa de uma fêmea!?