pampamcviana 26/11/2023
História sobre o tempo
Parece uma história sobre o avô do menino, mas na verdade é sobre o tempo e sua impermanência. É sobre tentar segurá-lo um pouco na ponta do lápis que percorre as paredes da casa. Sobre guardá-lo a partir do cheiro de café coado preparado às 2h da tarde enquanto se espera a quitandeira passar. Sobre, de repente, tudo mudar nas nossas vidas, através de um acidente (ou de um diagnóstico não esperado). Poderia ser o avô de qualquer um. Uma Pitangui qualquer. Mais uma família brasileira. O que me encantou nesse pequeno livro foi a poesia em formato de lembrança. Se eu fosse mais nova, talvez não tivesse dado valor ao livro. Mas ao perceber parte de minha vida em suas palavras, quase consegui sentir cada emoção e viver cada dia naquela casa na Rua da Paciência.
É uma viagem entre lembranças não vividas e poesia disfarçada de conto. Uma leitura rápida, que dá um quentinho no coração.
"O tempo tem uma boca imensa. Com sua boca do tamanho da eternidade ele vai devorando tudo, sem piedade. O tempo não tem pena. Mastiga rios, árvores, crepúsculos. Tritura os dias, as noites, o sol, a lua, as estrelas. Ele é o dono de tudo. Pacientemente ele engole todas as coisas, degustando nuvens, chuvas, terras, lavouras. Ele consome as histórias e saboreia os amores. Nada fica para depois do tempo. As madrugadas, os sonhos, as decisões, duram pouco na boca do tempo. Sua garganta traga as estações, os milênios, o ocidente, o oriente, tudo sem retorno. E nós, meu neto, marchamos em direção à boca do tempo."