innerchild 03/06/2020
Terminei o livro com aquele sentimento de solidão que é tão bem descrito pelo autor com a metáfora dos satélites que flutuam sem rumo e sozinhos no espaço.
Minha querida Sputnik é narrado por um homem cujo nome não sabemos e, em tese, ele apresenta a história de sua melhor amiga e seu principal interesse romântico. Digo “em tese” porque a história não é apenas sobre Sumire, mas de três personagens, incluindo ele mesmo, que, com o passar da história, se unem e se emaranham. Talvez o seu objetivo seja, a priori, se convencer de que a história não é sobre ele, mas esse não é o grande x da questão. O nosso narrador tem quase 300 páginas pra perceber que sim, a história também sobre ele.
Confesso que, em toda a minha vida, li quatro obras japonesas e, tirando um livro da conta, encontrei um belo padrão: uma beleza metafórica e contemplativa que só uma obra japonesa pode oferecer. Minha querida Sputnik é um livro repleto de imagens interessantes, ora imagens palpáveis de um apartamento ou de um telefone público, ora imagens metafísicas que muito se assemelham a sonhos. Não parece existir uma distinção entre o natural e o sobrenatural. Tudo parece real e vivo.
Narrativas que vagam pelo que eu chamo de “outro lado” me instigam bastante e com MQS não foi diferente. É como se cada personagem, a partir dos seus próprios conflitos em suas próprias dimensões, perpassassem por um lugar escuro e quieto: o porão da alma e seus devaneios. Ainda penso, por exemplo, na passagem que mais chamou a minha atenção: o momento em que uma das personagens, ao encarar os dois mundos, tem a sua própria imagem fragmentada: existe uma Miu no nosso mundo e outra Miu no mundo paralelo. Parece um pouco surtado, não? Essa é a graça!
Não espere explicações. Não espere encontrar o porquê. Não se trata de um romance tradicional, com plot twists ou finais reveladores. Também não é (necessariamente) sobre um triângulo amoroso, mas sobre o indivíduo e seus respectivos espelhos – é sobre o outro lado de você mesmo. Um devaneio de uma jornada entre mundos que coexistem. O jeito é prestar atenção e manter o coração, a mente e os olhos bem abertos.
Confusão, mistério e abertura.