Letícia 03/07/2021
Publicada em 1898, A Outra Volta do Parafuso é uma das novelas mais populares de Henry James. Esta, aparentemente típica, "história de fantasmas" nos é apresentada como uma confidência: aqui temos acesso a um manuscrito guardado por quarenta anos cuja autora já está morta.
A narradora-personagem não é nomeada e sobre ela sabemos muito pouco, apenas que era a filha mais moça de um pároco pobre do interior da Inglaterra e que, ao vinte anos, foi contratada para ser a preceptora dos órfãs Flora e Miles pelo seu tio e tutor. O ofício, bem remunerado, incluía, porém, a excêntrica condição de que a governanta nunca importunasse o empregador.
Após chegar ao local de trabalho, uma residência em Bly, nos arredores de Londres, a jovem começa a ver aparições. Tendo como confidente a caseira, Sra. Grose, ela descobre se tratar de dois antigos funcionários, ambos falecidos, que supostamente mantinham um relacionamento. Logo observamos se formar em sua mente a certeza de que as assombrações desejam corromper seus pupilos.
Narrado em primeira pessoa e, portanto, restrito a um único ponto de vista, o livro é repleto de ambiguidade e estranheza. Apesar da falta de provas de que alguém além dela mesma veja algo, a governanta crê piamente no dever de proteger as belas e inocentes crianças. Em sua aspiração de se sacrificar como mártir, ela revela também o anseio de cair nas boas graças do patrão, por quem nutre um interesse romântico.
Ao longo de uma leitura envolvente que desemboca em um desfecho de tirar o fôlego, mas igualmente dúbio, A Outra Volta do Parafuso levanta algumas questões interessantes. Parte delas diz respeito às diferenças de condição social entre a governanta e as crianças, enquanto outra se refere à repressão sexual de uma jovem conservadora no fim da era vitoriana.
Mas talvez o intuito principal do autor, sob influência do irmão psicólogo, tenha sido mostrar que um relato sobre fantasmas não pode ser separado das crenças e da personalidade de quem o narra. E essa é a maior graça do livro! Não há respostas certas, o leitor pode somente especular sobre os mistérios de Bly.
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