joaoggur 12/07/2024
Todos os Josés, todos os Saramagos.
Há um José, um José qualquer, um José que está aí na vida, não um José a lá Domingo no Parque, digo um José Drummondiano, sem nenhuma característica memorável ou digna de nota, - este José, escriturário da imponente e labiríntica Conservatória Geral do Registro Civil, além da estranha mania de colecionar recortes de jornais de celebridades nacionais, adquire uma estranha obsessão; após resgatar os verbetes de algumas celebridades, despretensiosamente pega um registro avulso, de uma desconhecida mulher perdida entre tantos famosos; esta mulher, da qual o nome não é revelado, é fruto da intensa obsessão de José.
E, falando de José?s, não posso ignorar o José principal; Saramago era um contador de histórias nato. Sua habilidade perpassava o simples ofício de romancista; conseguiu canalizar sua própria voz em seus narradores, que em terceira pessoa, divagam prolixamente. Muito além dos diálogos, Serem, Demarcados, Desta, Forma, Saramago tem narrações únicas, torrenciais, exacerbando informações na cara do leitor, - informações que talvez não tenham apelo narrativo, mas são fundamentais para imbuir o leitor na história narrada.
Talvez o que chamamos coloquialmente de ?história? não seja o ponto alto do livro, - com exceção da ?normal anormalidade? de seus inomináveis personagens, Kafkianos natos, não há nenhum apelo para que julguemos a tal da história como ?genial?, - e aí é que está a magia da literatura: há certos livros, e, neste caso, autores, que são impossíveis de serem adaptados as telas ou ao teatro, ou a qualquer outra mídia.
A magia deste livro, e/ou de bons livros, e/ou de bons autores, está na unicidade do meio em que as histórias são contatas; Saramago só dá para se ler. Kubrick só poderia ser cineasta, Shakespeare só poderia ser dramaturgo, Picasso só poderia ser pintor, - e Saramago só poderia ser escritor. Cada um acha a sua própria arte.