Assim que soube do lançamento de "Ladrão de Olhos" fiquei curiosa para ler, afinal eu gosto bastante de livros do tipo. No estilo conto de fadas moderno. O mais intrigante, no entanto foi o fato de o protagonista ser cego. A curiosidade foi tanta que o livro mal tinha sido lançado e eu já tinha comprado o meu. Após 424 páginas posso dizer que não fui precipitada ao querer tão avidamente ler esse livro. Jonathan Auxier criou uma história encantadora e um personagem extraordinário. Uma história fantástica e uma edição linda da editora LeYa.
Certa vez um bebê foi encontrado dentro de uma cesta boiando perto de uma embarcação com um corvo empoleirado. Os marinheiros recolheram o bebê e perceberam que mais um pouco e o corvo tinha comido a criança, seus olhos já estavam perfurados. A criança recebeu o nome de Peter Nimble e sem lar acabou amamentado por uma gata que de certa forma cuidou de Peter até que um trágico acontecimento separou os dois. Nessa idade ele começou a se destacar no meio da multidão por sua habilidade para sobreviver. Com seus dedinhos ágeis Peter logo começou a roubar itens necessários como roupa, comida e uma venda para os buracos dos olhos. Aos três anos ele já era uma ameaça conhecida para os vendedores, mas muito antes de os guardas serem alertados Peter já estava longe. O problema disso tudo é que as chances de ser adotadas eram cada vez menores. Bons cidadãos não adotavam meninos acostumados a roubar para viver. Foi então que Peter conheceu Sr. Seamus, um empreendedor segundo ele dizia. Ao notar o talento do menino de surrupiar as coisas sem ser notado Seamus logo tratou de convidar Peter para viver em sua mansão, com seu super cachorro, onde eles seriam sócios.
Peter aceitou, vendo a chance de ter uma casa, cama e comida sempre. Contudo não tinha mansão nenhuma, muito menos um super cachorro. Seamus tratou de ensinar todos os truques da ladroagem para Peter e torturava o menino sempre que podia com ameaças. O deixava sem comida. Se Peter quisesse comer deveria abrir os cadeados apenas com as mãos. Muitos anos se passaram e Peter foi vivendo essa vida miserável. Roubos na calada na noite, maus tratos de Sr. Seamus e aguentando o pior cachorro de todos. Ele se tornou um ladrão muito habilidoso e sendo cego aguçou seus outros sentidos. Era como enxergar através do olfato. Foi por isso que se aproximou do cacheiro viajante e se sua carruagem repleta de tesouros guardados por muitos cadeados. Mal sabia Peter Nimble que ao roubar aquela caixa com seis supostos "ovos" ele estaria entrando na maior aventura de sua vida. Aquela aventura que mostraria a ele o valor da amizade, da inteligência e devolveria a Peter o lado bom da vida. A partir daquele roubo tudo mudaria e ele descobriria muito mais sobre ele do que jamais imaginou.
A narração de Auxier é uma coisa de tão boa de ler e a possui uma característica que costumo notar em livros escritos por autores que são também roteiristas. A história flui tão bem que o passar das páginas é imperceptível e Peter é um garoto tão sofrido, tão inteligente que fica impossível não se prender a história dele. Com descrições exatas e sem exageros o autor deixa nítido aos olhos do leitor esse mundo fantástico que criou. A mágica aqui não é comum, é um mundo que mistura a ciência e razão com pequenos detalhes como bichos falantes e outras coisas mais que não posso citar sem estragar a surpresa. A viagem de Peter com Sr. Tode é deliciosa de acompanhar e o desenrolar da trama é tão bom que já estou imaginando se aquele final é o começo de um novo livro. O mundo criado é tão vasto que seria desperdício não ter mais nada nesse cenário.
Adoro quando o narrador "conversa" com o leitor. Através das observações do autor vamos acompanhando o progresso da história. Usando um exemplo que a maioria vai entender é como se tivéssemos dentro da penseira com Dumbledore, no caso com o autor, acompanhando de perto a história. É essa a sensação que tive. Como se ali, alguns passos adiante estivessem Peter, Sir Tode, Peg, o corvo Simon e todos os outros. Falando em corvos adorei os personagens. Simon, capitão Amon, todos eles. Só achei que Peter e Sir Tode poderiam ter sido mais espertos. Acabaram dobrando os problemas ao confiar na horda de ladrões ao invés de confiar nos corvos.
Enfim, um livro encantador em vários os sentidos. Claro que depois que ele conheceu Peg e a história foi contada não ficou difícil decifrar a charada, mas isso não estragou em nada. Pelo contrário, foi muito bom acompanhar Peter nessa descoberta que mudaria tudo. É um conto de fadas moderno, poderia dizer uma fábula, mas elas têm que ter alguma lição e apesar do livro se mostrar muito belo em sua essência não tem uma lição de moral exata. O livro também tem uma pequena, veia no steampunk, gênero que mistura máquinas e engrenagens no passado. "Ladrão de Olhos" não é um livro para exigentes, é um livro para quem consegue ver a beleza em pequenas coisas. A história de um garoto órfão, cego, ladrão, mas leal e inteligente. Adoraria ver o livro transformado em filme. Daria um belíssimo filme. A edição da LeYa é linda. As folhas escurecidas em um tom de cinza deram o clima certo ao livro. Eu adoro as cores da capa e foi ótimo vê-las juntas em um livro. Recomendo o livro a todos, de crianças a adultos. Tenho certeza que Peter Nimble vai conquistar-te nas primeiras páginas. Que saudade de ser criança...
Outras resenhas em: http://cultivandoaleitura.blogspot.com/2012/04/resenha-ladrao-de-olhos.html