spoiler visualizarThaís Sciota 10/06/2016
Uma vida sem sentido, a vida de Hank.
Sempre ouvi falar em Bukowski, sempre vi seus livros anunciados nos sites em que costumo comprar, mas, na verdade, o que me atraiu em "Mulheres" foi a capa desta edição. Achei a capa de uma simplicidade, de um minimalismo e de uma naturalidade encantadora. Por isso, parabenizo a editora.
Comprei pela capa, mas não gosto de edição de bolso, nem de folhas brancas, nem de não ter orelhas no livro, então, a decepção bateu quando o recebi. Mas por ser de bolso, já era de se esperar, mesmo assim, sempre me decepciono. rs
Quanto à história, estou meio perdida, não sei dizer se gostei, se não gostei, os prós e contras ficam pareados quando penso no livro. Acho que gostei mais do que não gostei. Lá vai!
Bukowski avisa, logo no início, para não fazermos relação com pessoas vivas ou mortas, deixando claro que o texto é pura ficção. Mas não senti isso, vi muito do autor no enredo, muita similaridade, um pouco de sua autobiografia em certas passagens.
Hank, a personagem principal, deixa seu emprego nos Correios para se tornar escritor. Leva uma vida sem muito conforto, mas tem o que mais lhe interessa: liberdade de horários (acorda depois do meio dia), consegue pagar seu aluguel e sua quantidade devastadora de bebidas alcóolicas, e por fim, tem fama suficiente para atrair mulheres 20 ou 30 anos mais novas que ele.
Impressionou-me a facilidade com que as mulheres aceitam suas investidas machistas e com que se jogam aos seus pés, como se ele fosse um garanhão (deve ser a questão oculta do charme, só pode. Pois o autor menciona Hank como feio, barrigudo, velho, alcóolatra, mulherengo...). Para Hank, que se casou, se divorciou e ficou em jejum de sexo por quatro anos, isso é um verdadeiro milagre que nem mesmo ele entende tal fascínio. Então, é como a música: "choveu na minha horta, vai sobrar na plantação", tem que aproveitar em quanto a oferta é grande, porque segundo o protagonista, sexo é uma fase sazonal.
Hank é uma máquina de bebidas e de sexo. As mulheres, à primeira vista, são apenas carne, puro sexo, pura sacanagem, pernas, seios e bunda, ele só quer saber de usá-las antes que os defeitos delas comecem a aparecer e a magia acabe. Mas, contraditoriamente, ele mostra um lado humano, tem certa paciência ao gastar seu tempo com elas, ouvindo-as se for preciso, não forçando o sexo se não quiserem, importando-se com suas vidas, sendo gentil e honesto até seu limite (adorava ficar sozinho e odiava gente, mas ainda assim, não vi Hank ser grosseiro, rude sem motivo). Gostei da tranquilidade de Hank.
O que me deixa confusa é, o fato de o livro deixar as mulheres com papeis vulgares em todas as situações, todas! Deve ser meu lado feminista achando um exagero de exposição da mulher "somente" como símbolo sexual, talvez.
O fato é que Hank leva uma vida rodeado de mulheres, mas ao mesmo tempo solitária, uma vida sem sentido. Seu passatempo para esperar a morte é beber, transar e fazer apostas em cavalos, nada mais o distrai da espera. É uma melancolia perceber que Hank não tem um objetivo, não tem algo que o motive, ele escreve para se sustentar e nunca quis ter fama mundial ou nacional, apenas o suficiente, nada mais.
Como não tenho com quem conversar sobre o livro, fico, nesta resenha, expondo meus pensamentos e conclusões, lá vão:
~ Bukowski escreve de forma direta, sem rodeios, com diálogos simples e curtos, a leitura é fácil; terminei o livro em três dias. O coroão fala abertamente sobre sexo, não há limites, ele narra seus pensamentos sem pudor; por que esconder e fingir que não pensamos nisso? Gostei da escrita do autor, lerei outro título. Em relação à edição contém alguns erros de pontuação, mas nada grotesco a ponto de me abalar.
~ creio que Hank tenha medo da velhice e tenha se complexado por ter tido uma vida comum de uma criança sem muitas expectativas, de um adolescente sem vida sexual ativa, de um cara automatizado trabalhando nos Correios, de ter uma casamento frustrante no qual seu amor morreu devido à bebida. Tais fatores fizeram com que ele jogasse tudo pro alto, não esperasse mais nada, aproveitasse o momento sem se comprometer com ninguém, só esperando o tempo passar, só curtindo cada momento que seu corpo, de mais de 50 anos, estava lhe proporcionando e que, infelizmente, não dura pra sempre.
~ creio que as mulheres o procuravam porque idealizavam um escritor interessante, talentoso, com algum tipo de dom que o diferenciava dos outros caras normais, ainda mais o fato de ser mais velho, que poderia lhes passar a imagem de segurança, de maturidade, de experiência, tanto sexual como pessoal. A forma como Hank consegue ser direto é muito espontânea, ele diz coisas absurdas, mas com tamanha naturalidade que a raiva não aparece. Ele não tenta se justificar quando algo dá errado, ele assume e não discute, simples assim. As mulheres podem gritar, bater, quebrar tudo, mas ele não sai da sua zona em momento algum, zona que o define como alguém sem compromisso mas que se importa lá no fundo.
~ no fim do livro, dá a entender que o protagonista percebe a vida promíscua e vazia que está levando e tenta se ajeitar com Sara, que parece ser uma pessoa legal, que se importa com ele. Hank vai tentar, mas ninguém nunca vai saber se conseguiu, só sabemos que ele alimenta um gato com uma lata de atum de 190 gramas.